Gerana Damulakis
Sobre o Fiat Breu
Para além da
linguagem, só há a existência, já disse Giulio Carlo Argan. A
existência de Luís Antonio Cajazeira Ramos está plasmada agora na
linguagem, ainda que a sua seja uma estréia tardia, bem ao contrário
da aurora casimira, mais de acordo com outros poetas... O que de
resto é bom, pois ele chega como um mineral levado pelo vento para o
lugar certo: a morada da poesia.
A homogenia do
corpo "inorgânico" deste livro mostra que o poeta é, e quer-se
absolutamente tal, alguém que esboça, demarca e delimita seu
propósito com intenções bem precisas. Há harmonia, como se este não
fosse o momento de contrapontar com multiplicidades: o livro
conserva a univocidade do começo ao fim. O poeta atua como
cinzelador de sua pedra, sem interferências alheias, opiniões ou
influências.
Os poemas
trazem assimilações solidificadas pela existência, pelo particular,
e, então, o discurso é a verdade concreta; as pedras são iguais a
espaço, substância e tempo. Fiat Breu evoca, por vizinhança, o
espaço não definido, a escuridão, daí a necessidade de erigir, o que
conduz à idéia de edificação, que simboliza a concepção deste
espaço; e diz, por sociedade, que o tempo não está ausente: há o
conhecimento do tempo.
Faz-se a
escuridão para saciar o desejo: é a suposta interdição, fazendo
valer sua atuação.
Assim, o poeta
indaga pedras, esquadrinha gretas fendas frestas, fica, de início,
frente a frente com o oco, o vácuo, o espaço vazio da exibição da
matéria. A presença erosiva do "sem" se harmoniza, pouco a pouco,
com os alvos causas pretextos e impressões plurais. Conquanto
homogêneo, quase puro, ele quer-se como aquele que sonda, e quer,
claro! dilatar o arco de abrangência de sua poética. Com Luís
aparecerão outras e outras inquietações, afinal ele é um poeta "in
process", talvez um dos melhores momentos de um poeta.
Nesse seu
processo, ele já está pleno de certos domínios, como o uso confiante
do soneto, igual a Fídias esculpindo Nice junto a Atena, extraindo
belezas do mineral inerte. Outro domínio de Luís: sua musicalidade.
Ele é estrondoso e bombástico, lembrando uma sinfonia de Mahler,
especialmente a Sinfonia nº 1, em ré maior (Titã). À-toa, é escusado
evocar outras artes, porque a poesia tem casa própria, e a sua é do
tipo poesia franca, não fabulada, mas criada por traços vitais,
individuais, por sentimentos que, quem sabe? nem se efetuem senão na
obra, quando no seu momento de cisma e captura, e avultam na
declaração transcrita.
Fiat Breu nega
essa luz, pois que clama pela escuridão. E nega o tempo, pois que na
poesia estou destacado do tempo. Heidegger, acertadamente, diz que o
filósofo e o poeta são aqueles que afirmam coisas extraordinárias.
Recorro a tal afirmação, já que Luís inaugura o livro querendo fazer
escuridão, quando, na verdade, é um poeta chegando irradiado de luz.
Leia a obra de Luís Antonio Cajazeira Ramos
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