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Henrique Pompermaier

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Fortuna:

 

Alguma notícia do(a) poeta:

 

 

 

 

Jornal do Conto

 

 

 

 

   

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Da Vinci, La Scapigliata, detail

 

 

 

 

 

 

Henrique Pompermaier

 

 

Funeral

 

eu morri

quando você me colocou

naquela sacola plástica

talvez acreditando ingenuamente

que eu ficaria lá pra sempre -

afinal, eu já estava preso

dentro de alguma coisa

que demoraria a decompor.

lembro de você parecer

gostar daquela situação:

ria e ria

enquanto eu

morria

suponho que você não pensou

que eu fosse morrer mas, de fato, morri.

o pior: nem te vi

lembrar dos nossos corpos nus

ao ver as sacolas intactas

e saber que fui eu
só eu

quem decompus.

 

 

 

 

 

O canário burro

 

 

aquele canário

que cantava preso

sempre me pareceu

um pássaro idiota

se fosse eu

ficaria calado

nem alpiste

mas nem obrigado

me fariam cantar

daquele jeito

só que pensando agora

não sei muito bem

se o canário era o esperto

e o idiota era... quem?

 

 

 

 

 

 

Pedro Vermelho

 

 

quando você joga o amendoim

eu pulo não por instinto

finjo aquela reação física

uma careta, duas piruetas

para estabelecer uma relação de troca

entre nossas espécies - diga-se de passagem -
aprendi isso com um chimpanzé velhaco

tatuado, que morava na jaula ao lado, fumava e tudo.

quando bebia, urrava a noite toda,

batia nas grades, talvez não conformado

pela situação que se encontrava.

eu estava confortável no manejo

que era submetido por alguns amendoins

e só queria dizer, na minha condição de macaco e se caso eu escrevesse,

que acho que nós somos iguais,
iguaizinhos,
nos amedoins
e nas piruetas

 

 

 

 

#15

 

se eu soubesse desenhar

- e não escrever -

desenharia sua boca triste

e meus dois indicadores

calmamente tocando

a pele das suas bochechas

tentando forjar em você

um sorriso forçado, esbulhado,

pois só seu desenho do rosto

quando posto sorrindo

parece um empurrãozinho

no mundo

 

 

 

 

 

Tião Carreiro

 

 

ouvi uma moda de viola

de tião carreiro e pardinho

falava sobre a despedida

sobre seguir viagem chorando

e sobre a dúvida em saber se

quem ficava

também chorava - o que é justo -

ele dizia que faria um corte no peito

que se tivesse um lugar no mundo

que ninguém tivesse pisado

era lá, justamente lá, que ele iria ficar.

fiquei pensando sobre a dor dele:

no mínimo,

meia garrafa

 

 
 

 

Domingo

em algum lugar, acordo cedo

eu e os agricultores

que cuidam dos bichos

e das plantações

eles falam algo parecido com

tecnologia da produção

desenvolvimento sustentável

louvável, mas eu

eu vejo lábios em movimento

e decido fumar um cigarro

com a turma de além-porta:

eram 3 velhos, 6 botinas

que não falavam por nada

simplesmente fumavam.

entendi o momento,

acendi o meu,

fiquei quieto.