A pradaria é por onde escorrem os ventos
dos desabrigos - sinos do ar a excitar a mente dos loucos e dos poetas.
Loucura e amor, sonhos e fantasias; magia, mistério e sortilégio,
estão por dentro da poesia de José Telles.
Sermões de Pradaria é um título
estranho e singular, dos mais belos de nossa literatura. Na verdade, um
achado poético raro e que se ajusta como luva ao todo simbólico
do livro. É um texto substantivo: a palavra nova, essencial, em
seu sentido totalizante e plural. A adequação é perfeita
em sua organicidade - forma e estrutura conjugadas.
Livro de um médico-poeta, ou melhor
ainda, de um poeta-médico, o que não é a mesma coisa.
Até pouco tempo, José Telles
era conhecido apenas por poemas esparsos nos jornais e através das
páginas da revista Literapia, que reúne intelectuais da Sobrames
(Sociedade Brasileira de Médicos Escritores), confraria literária
a que pertence. A obra foi editada recentemente pelas Edições
Sobrames, Fortaleza 2001.
É escusável dizer da beleza da
edição (projeto gráfico de Heron Cruz, com ilustração
de Alano de Freitas).
A título de apresentação,
o livro traz nas orelhas depoimento dos escritores Carlos d'Alge e Ruy
Câmara; e na contracapa o crítico e poeta Dimas Macedo
dá o alcance da obra no tempo. (O destaque vai para o retrato de
Zé Telles, de casacão, lembrando Kafka e Samuel Bechett -
Esperando Godot).
O vigor de suas metáforas, por vezes
audaciosas, oferecem ao leitor um mundo ainda virgem em sua visão
premonitória.
Zé Telles assume, em Sermões
de Pradaria, um compromisso sério com a arte do fazer poético.
E portanto é de se esperar que outros volumes de versos, à
altura dos Sermões, apareçam no panorama da poesia brasileira,
para dar continuidade à sua brilhante carreira, que ora se inicia
promissora.
O sensualismo não está ausente
da sua poesia - é integração e tema - vertente rica
e constante que afasta dúvidas e lembranças da morte e se
mistura ao misticismo: "Estes seios bastos / ora róseos, ora alabastos
/ esperam cautelosos,/ momentos suicidas". Ou ainda: "No teu corpo / sobrevôo
entranhas / e crucifico nos teus braços / os meus pecados em cruz".
Por vezes metafísico, entre objetos
e lembranças, descreve a casa: "Na sala/ um relógio de algibeira/
esconde o tempo no bolso".
São muitos os arroubos líricos
do poeta e suas confissões amorosas. José Telles nos oferece
uma poesia de alto nível e traz uma carta de alforria no alforje
que lhe assegura o êxito. O livro é bom quando não
podemos deixar a leitura para mais tarde. E não foi outra coisa
o que aconteceu comigo. Só encontrei o sossego ao virar a última
página.
José Telles é uma revelação
da poesia de nosso tempo. Antes de mais nada, seu compromisso é
com o homem e seu destino. E aqui encontramos o poeta social, solidário
na dor e no sofrimento humano.Poeta heróico, exaltado no idílio
amoroso e em todos os segmentos da vida. A delicadeza de seu verso não
consegue esconder a angústia existencial que o oprime. Na luz de
seus poemas a beleza flore e aflora aos nossos sentimentos. É este
um poeta acentuadamente cristão, isso se constata a começar
pelo título da obra. A plasticidade de seu estro é um detalhe
impressionante: som, luz, cor, harmonia e musicalidade parecem andar de
mãos dadas.
Cultiva, Zé, com esperança a
semente que Deus te deu. A semente que iguala os homens e marca sua breve
passagem sobre a terra.
José Alcides Pinto
Ficcionista e crítico literário
|