Leio os poemas de Lau Siqueira desde os seus primeiros livros
(Comício das veias, O guardador de sorrisos, Sem meias palavras
e Texto sentido, entre outros). Acompanho sua trajetória, sempre
atento ao meticuloso cuidado com que se socorre das palavras. Seja
para configurar, na geometria dos versos, conflitos emocionais e
pensamentos críticos, seja na elaboração de imagens inventivas e
ritmos demarcados pela ruptura melódica. Seu verso, grosso modo,
é curto, lacônico, certeiro, regido, aqui e ali, pelo olhar irônico,
às vezes perplexo, às vezes indignado. Detive-me, já, em dois ou três
ensaios, na análise de sua dicção lírica, por um lado, privilegiando
sua inclinação minimalista no âmbito das escolhas técnicas e formais,
e, por outro, interpretando sua polivalência temática que contempla,
sobretudo, os percursos da palavra, os sortilégios existenciais, as
solicitações eróticas, as causas sociais e políticas, o tempo, a
infância e tantas mais experiências da vida. Não me parece diferente
o estro explorado em Cabeça de medusa, sua coletânea mais recente.
Mesmo se o verso se alonga nesse ou naquele poema, o tom e a perspectiva
se acomodam aos ditames da síntese, a que se associa, sempre, o olhar eivado
de inquietações e ambivalências. Cabeça de medusa, segundo nos esclarece, em
nota introdutória, é uma metáfora usada pela medicina para designar uma
obstrução de uma das artérias cardíacas. O título, então, remete para uma
dada circunstância que envolveu o poeta. Circunstância real, autobiográfica,
que, no entanto, se converte, devido ao manuseio especial das palavras,
em experiência estética. Uma experiência que passa a ser de todos nós. Lau
Siqueira me parece um cabralino, tocado, porém, por um halo que vem de
Bandeira e passa por Quintana. Cerebralismo. Lirismo. Ludismo. O poema
"Distopia", exibido na contracapa, pode ilustrar: "não me iludo // há um
escuro/permanente // e uma sombra/iluminando/tudo".