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Um esboço de Da Vinci

 

 

Cynara Menezes


 "Crisálidas"
 

Primeiros versos do escritor não saíam na íntegra desde 1864
Reedição traz poesia de Machado para leitor julgar


CYNARA MENEZES
ESPECIAL PARA
Folha de São Paulo
 

 

O professor de literatura da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) Cláudio Murilo Leal avalia a obra poética de Machado de Assis, cuja reedição do primeiro volume supervisiona, com uma equação literária.

"Fernando Pessoa foi o maior poeta português e Machado o maior prosador brasileiro. Toda a prosa de Pessoa, que seria o equivalente à poesia de Machado, está sendo reeditada. Logo, o mínimo que um país civilizado pode fazer por seu maior escritor é reeditar seus poemas", diz.

Leal prepara sua tese de doutoramento, que será lida -excepcionalmente na Academia Brasileira de Letras (ABL)- em setembro, sobre a quase desconhecida poesia de Machado de Assis, muito mais apreciado como romancista e contista do que pelos seus versos.

"Crisálidas", o primeiro livro de poesias de Machado, publicado quando ele tinha 25 anos, volta pela primeira vez integral desde seu lançamento, em 1864. Em 1901, quando publicou suas "Poesias Completas", o escritor misturou ao conteúdo deste seus poemas posteriores, dos livros "Falenas" (1870), "Americanas" (1875) e "Ocidentais" (1880).

Machado de Assis também fez várias modificações na obra, talvez preocupado com a posteridade. Cortou 17 poemas de "Crisálidas" e o posfácio que escreveu, além de fazer mudanças em vários versos, das quais mais tarde se arrependeria em parte. Chegou a cortar a frase "Esta a glória que fica, eleva, honra e consola", dos "Versos a Corina", que se tornaria divisa da "sua" ABL.
Corina foi a primeira musa de Machado, antes de Carolina, sua mulher, com quem dividiria 35 anos de vida. Os versos que fez para ela ("A Carolina"), assim como seus outros poemas mais conhecidos, como "Soneto de Natal" ou "Círculo Vicioso", já são de "Ocidentais", sem reedição prevista -embora possam ser encontrados na edição dos "Melhores Poemas" (Global).

O próprio professor Cláudio Murilo Leal não acredita na equivalência entre o que escreveu o jovem Machado em forma de versos com a ficção que viria mais tarde, sobretudo após os 40 anos.

É nessa época que parte para Nova Friburgo em três meses de férias para se recuperar de uma rotina estafante de trabalho. Quando volta, dá uma guinada em sua carreira, com a publicação em capítulos de "Memórias Póstumas de Brás Cubas" (1880), e já não escreve mais poesias.

"Não acho que ele fosse tão bom poeta quanto contista ou romancista", diz Leal. "Mas Machado é reconhecido internacionalmente como um dos grandes autores do século 19, e este levantamento da obra poética é importante.
Diziam que ele era um poeta sem emoção, e a reedição diminui um pouco esse preconceito", defende.

Os poemas de Machado, inseridos no contexto do romantismo (1836-1880), na verdade, não resistem mesmo é à comparação. É difícil crer que o autor da sutil sedutora Capitu pudesse ser tão pouco cativante em verso.

Mesmo sem nunca ter se engajado no romantismo, Machado parece atraído pelo ideário dos poetas de morte precoce que louvavam a espiritualidade e a juventude. Em "Lúcia", por exemplo, canta os 15 anos da mesma forma que o contemporâneo Casimiro de Abreu se debruçou sobre os 8: "Deixava entrar da primavera os bálsamos;/ A várzea estava erma e o vento mudo;/ Na embriaguez da cisma a sós estávamos/ E tínhamos quinze anos!".
Lygia Fagundes Telles, escrevendo sobre Machado de Assis, aposta que outro poeta, Carlos Drummond de Andrade, daria, em sua opinião, um excelente interlocutor para o autor de "Dom Casmurro".

Mas, se Drummond e Machado conversassem, apreciaria o primeiro a poesia do segundo? Que julgue o leitor -relançamentos também servem para isso.


Livro: Crisálidas Autor: Machado de Assis Editora: Nova Fronteira/UFRJ Quanto: a definir (115 págs.)

 

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