Mais de 3.000 poetas e críticos de lusofonia!

 

 

Manuel Sérgio


Fiat Breu

 

Fiat Breu é uma colectânea de poemas de um poeta invulgar. Luís Antonio Cajazeira Ramos é um poeta clássico, fazendo minhas as palavras de Paul Valéry: "clássico é o escritor que traz um crítico consigo mesmo, crítico a quem associa intimamente os seus trabalhos". Portanto, sendo clássico, é um moderno. Há nele uma inteligência crítica associada à virtude poética. Por isso, escreve: Será que eu sou só fogos de artifício?

Na leitura da obra se me deparou uma exuberância verbal admirável e de grande criatividade. Sua linguagem é difícil, não empírica. Aqueles que se servem das palavras ao nível do senso comum não são artistas. Esta não é a linguagem dos poetas. A linguagem dos poetas é a sua — sumptuária, sem ser gongórica; inovadora, sem ser desconexa ou confusa.

O Cajazeira, na poesia, inventa o imprevisto: é poeta, por isso. Ele troca a luminosa solidão da torre de marfim pela comunhão dos subterrâneos da consciência colectiva — sem deixar de ser original! Por isso, pode ser um poeta universal! A qualidade de seus poemas é surpreendente. Depois de lê-los, dizemos conosco: "Nasceu um grande poeta!".

Outro aspecto seu é que transporta a Bahia, sem ser regionalista. O regionalismo em literatura conduz, quase sempre, à diminuição e empobrecimento da obra em apreço, pela tendência à descrição etnográfica e pela ameaça de particularismo bairrista. Ora, o que o Cajazeira nos oferece é muito mais que isso. É uma vivência do Homem, da Sociedade e da História, em termos poéticos e sob a forma peculiar da sensibilidade baiana. É uma visão individual, carregada de experiência íntima e, por isso, visão lírica. Mas é também, na consciência da multiplicidade de relações, na vastidão do quadro que abarca, visão épica, nó apertado onde se entrelaçam a Bahia, a História, o Mundo.

Há em si um sentimento de vazio, mas, nele, o nada não surge, como em Pessoa, como "o lado ausente de todas as coisas", porque do nada o Cajazeira faz tudo. O seu nada é o princípio da transcendência.

O Soneto Áspero, por exemplo, é de uma beleza que seduz. Com uma simplicidade ocasional, emergem imagens e idéias que deleitam o leitor atento. O poema Anátema, em especial, é um dos grandes sonetos de nossa língua.

Enfim, o Cajazeira é um grande poeta, com forma e fundo. É difícil ser crítico diante de sua poesia. É bem mais fácil admirar e regressar, assim, à graça do princípio.
 



Luís Antonio Cajazeira Ramos
Leia a obra de Luís Antonio Cajazeira Ramos

 

 

Leonardo da Vinci,  Study of hands

Início desta página

Dimas Macedo