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Ney  Mourão

Riviere Briton, 1840-1920, UK, Una e o leão
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Culpa

 

 

 

 

 

 

 

 

The Gates of Dawn, Herbert Draper, UK, 1863-1920

 Cyro de Mattos


 

A Vida e o Sonho nos Muros

           

Ultrapassada a fase criativa sob o domínio da inspiração e transpiração, um dia o autor imagina que o primeiro livro está pronto para ser editado. Vai  ser útil ao outro na leitura do mundo. Ainda não sabe como é  complicado publicar um livro por editor no circuito nacional, principalmente quando se trata de poesia. Com o mineiro Ney Mourão não foi diferente.   

Há vinte anos, o poeta de “Notas Dispersas pelos Muros” (1) vinha batalhando para a publicação de seu primeiro livro.  Chegou a ter uma idéia desesperadora nesse desejo de vê-lo finalmente editado. Começou a grafitar poemas nos muros da cidade. Assinava-se  “poeta  à procura de editor.” Ante  o espanto de alguns e  indiferença de muitos, grafitou cerca de 200 poemas. Andou quilômetros, em três anos, a pé de e de ônibus. Cobriu quase todos os bairros da cidade. Várias vezes fora preso e humilhado. Serviu como tema de redação nas escolas. Foi dado como morto. Souberam que o poeta estava vivo. Foi entrevistado e virou notícia na mídia. Mas nada de encontrar até então o editor de seu livro de estréia.

Em seu destino de ser poeta, com a marca da vida e do sonho nos muros,   nunca desistia. Fazia, no itinerário das madrugadas de um homem só, que  Belo Horizonte amanhecesse riscada de versos comoventes. Como estes do conhecido poemeto “Lampejo”: “Apague / a rua/ que a lua / tá linda!”. Ou ainda estes de ”Light”, de conotação surrealista: “Às vezes / de tão feliz/ ela acorda/ e sai por aí/ a t r o p e l a n d o b o r b o l e t a s.” Ou também nestes de “mercadolivrepontocom”: “Troco/ um apito de fábrica/ por um canto de pássaro”. Entre tantos poeminhas, que lembram o haicai, pela síntese construtiva, intencionalidade de grande beleza imagética, não posso deixar de citar estes versos primorosos de “Litúrgico”: “Grafite de Deus/ é arco-íris/ no horizonte1”

Em sua composição técnica e estética, como numa peça sinfônica, o conjunto dessas gritantes  “Notas Dispersas pelos Muros” reúne poemas curtos na maioria das vezes.  Acordes no elétrico emocional do espírito para iluminar o ar. Repercutir nas ruas e  invadir as casas. Coexistem, em sua partitura musical, como elementos constituintes do discurso terno  quase sem o liame entre o poeta e o leitor, leia-se ouvinte, eliminando-se o que se considera ser tão somente um formalismo desnecessário, na esperança de aumentar em suas conexões sensoriais o poder emocional que emerge em cada verso.

Mas esse mineiro criador de uma poesia  nas paredes e tapumes também se sai bem quando escreve o poema com desdobramento da razão emotiva. Nesse particular, anotem  como fatura exemplar do eu lírico os textos denominados “Inventário”, “Poema Musical para Roer as Unhas” e “Indo”.  Neles o poeta não pretende explicar a vida,  o que para muitos é inexplicável. Sob aspectos pungentes, transmite  a beleza inevitável da poesia na vida, em momentos de chuva, lágrima e solidão vindas da nossa condição humana,  nestes agudos ritos de passagem no sempre.

Trata-se de uma poesia de captação fácil, como talvez deva ser nos tempos atuais de velocidade. Seu discurso articula-se com rapidez  para ser ouvido pelo outro mais o mundo, seduz com a enunciação sensitiva de seu conteúdo. O leitor  vai encontrar nessas estridentes “Notas Dispersas pelos Muros” o andamento da beleza com  motivações múltiplas  no exercício da vida. 

Nos tempos de hoje, em cujo ritmo  uma sociedade pós-industrial impele-se  pela automação, massificação e consumo, vale a pena tomar conhecimento da estréia desse poeta mineiro. Sua voz singular e plural lateja emoções. Em nervura e cumplicidade de  palavras polivalentes,  mostra o quanto o homem tem de grandeza em sua consciência.


                            

1) “Notas Dispersas pelas Paredes”, Ney Mourão, Editora Autêntica, Belo Horizonte, 2008.

 

2) Cyro de Mattos é baiano de Itabuna. Poeta, contista, cronista, ensaísta e autor de livros infantis Já publicou  mais de trinta livros. Possui prêmios importantes e, entre eles, o Afonso Arinos, da Academia Brasileira de Letras, o APCA,  o Emílio Moura, da Academia Mineira de Letras,  e o Segundo Prêmio Internacional Maestrale Marengo d’Oro, em Gênova, Itália, duas vezes. A Palimage Editores, de Viseu, Portugal, publicou dois livros seus de poesia: “Ecológico” e “Vinte Poemas do Rio”. Pela   Runde Taarn Edizioni, de Gerenzano (Varese), publicou “Poesie della Bahia/Poemas da Bahia”.  

The Gates of Dawn, Herbert Draper, UK, 1863-1920

 

 

 

 

     
   

 

 

 

 

 

 

 

15.11.2008