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Alfredo Bosi

 

Ingres, 1780-1867, La Grande Odalisque

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Alguma notícia do autor:

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Poesia:

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Ensaio, resenha, crítica & comentário:

 

William Blake (British, 1757-1827), Christ in the Sepulchre, Guarded by Angels

 

William Blake (British, 1757-1827), The Ancient of Days

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Franz Xaver Winterhalter. Portrait of Mme. Rimsky-Korsakova, detail

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Jean Léon Gérôme (French, 1824-1904), The Grief of the Pasha

 

 

 

 

 

 

 

Jean Léon Gérôme (French, 1824-1904), Slave market

Alfredo Bosi

  

Orelha de

LENDO TODOS OS VENTOS

de Antônio Carlos Secchin

 

 

A poesia de Antonio Carlos Secchin enfrenta e reelabora alguns tópicos fundamentais da cultura literária contemporânea; mas, ao fazê-lo, penetra-os com uma dicção que é paradoxalmente saturada de vertentes estilísticas e desenvoltamente pessoal.

Lendo Todos os ventos, assistimos ao encontro de uma aturada leitura da poesia brasileira de ontem e de hoje (Secchin é um dos nossos mais afiados leitores de poesia) com um ethos despojado e às vezes abertamente biográfico. Uma situação cultural e existencial pós-moderna, sem dúvida. Desse encontro nasceu a glosa paródica pela qual o eco de antigos significantes lastreia a inversão dos significados. Acontece que também a paródia satírica é gênero vetusto: daí o curioso revival moderníssimo de uma antiga forma de escarnecer palavras e coisas que a usura do tempo já desgastara.

Ao leitor avisado por certo não escaparão cadências de Gregório, de Álvares de Azevedo e dos modernistas quando ainda empenhados na sua missão de iconoclastas antiparnasianos. E a tentação metalingüística de pôr a palavra ao encalço de si mesma será outra marca inequívoca de toda prática vigente em tempos saturados de memória literária e consciência cética.

Em Elementos, um dos conjuntos mais elaborados da obra, faz-se intensa e quase diria ubíqua a presença da palavra – sonora ou escrita – em um universo de evocações da matéria cósmica. Se o ar ancora no vazio, o poeta quer saber “como preencher/ o  seu signo precário”. Há desejo de captar a “matéria plena”, mas são o nome e a fala que ocupam imperiosamente o corpo do poema. Se é o fogo do sol sagrado que arde no espaço subjetivo, ouve-se “o galope louco das cinco letras”, a soletrar a agonia do eu lírico. Se passo à poesia da terra, “o que em mim é terra está ruindo, / e a forma não murmura o meu excesso”. Enfim, a água: “Sobre as águas passaram / o perfil das aves ciganas, /  o nome noturno dos mastros”. Nesses e em outros versos Secchin leva-nos à fronteira móvel que antes une do que aparta os quatro elementos do mundo e os seus inumeráveis signos.

Antonio Carlos Secchin sabe alcançar o nível raro da expressão singular, forte e desempenada. Leiam-se os belos sonetos ingleses “O menino se admira”, “Poema para 2002” e os jorgelimeanos “De chumbo eram somente dez soldados”, “À noite o giro cego” e “Estou ali”. Nestes, para voltar à perfeita distinção crociana, a “literatura” existe, sim, mas já se fez poesia. Como poesia tout court é “Reunião”, em que lirismo com seiva e raízes se dá na palavra densa. O poema fala de uma misteriosa estrada tropical que vem da Itália e desemboca em Cachoeiro de Itapemirim  rimando com Secchin:

 

E se recompondo o que nós fomos

este instante cintilar dentro de nós

num sopro que a vida não apaga

mesmo sozinhos não estaremos sós.

 

Que esta bela coda acompanhe o leitor e o leve, em um exercício de empatia, a penetrar o tecido polifônico que são  Todos os ventos.

 

Alfredo Bosi

 

Antônio Carlos Secchin