Ary Albuquerque é um
poeta de permanentes surpresas. Via-se bem isto em
“Tríade Poética”, seu livro anterior. E assim se
mantém em “Momentos Divididos” (Topbooks, Editora,
Rio, 2007). Ambos definem a linha estética do autor,
que vai dos seus sentimentos íntimos à visão do
mundo que o cerca, embora em “Momentos Divididos”
isto se amplie e melhor se universalize.
As surpresas não se
exsurgem de achados poéticos inesperados. Ao revés,
vêm a relevo através de aparentes disfarces do seu
como dizer poético. Ou seja: os poemas, quase sempre
curtos, e as crônicas poéticas, também sucintas,
trazem ao vivo uma enganosa despretensão que se
transmuda em poesia da melhor qualidade no corpo
inteiro de cada poema.
Eis porque, à primeira
vista (sempre a aparência), as criações tomam a
linha do descritivo, tal como na prosa, em versos de
levitação coloquial, com ressonância poética
pulsante e subjacente, quase diríamos submersa, que
surpreende o leitor. É um poeta de lirismo ameno,
suave, ricamente impressionista, e transfere, muitas
vezes, as visões e sentimentos poéticos para o campo
filosófico. Essa filosofia que amplia as
inquietações interiores e pinta, com nitidez, o
mundo exterior.
Fazer citações que,
embora palidamente, comprovem isto, seria apenas
eleição pessoal, visto que toda a sua poesia traz em
si este tom e este tônus que lhe dão uma
particularíssima leveza, de uma envolvência
inconsútil. Vão apenas lapsos de amostragens, que
sinalizam o que antes ficou dito: “O tempo é o
tempo/e triste vejo/a hora esconder-se no infinito”
in “Vida”. Ou: “Praia deserta./Mar revolto./Alma
contrita”, in “Marinas”. O mar está muito presente
na sua poesia, embora ela seja diversificada e
andeja, que o poeta vale-se dela, ou a ela se volta,
nas suas várias viagens.
O toque descritivo
marca nitidamente a linha de solidão do poeta. Não a
solidão banal dos solitários. A outra, ilocalizável,
presente na paisagem espiritual, em unção com a
natureza. E prevalece outro ponto curioso e notável:
o poeta se põe quase sempre, para além da
transfiguração poética, de observador e
contra-espelho do que sente e do que mostra.
Vê-se, ainda, que Ary
Albuquerque guarda alguns timbres, não em ritmo ou
rimas, mas em certos andamentos dos poemas, da
eterna aura parnasiana, que lhe qualificam ainda
mais as criações.
Os seus vôos são bem
da escala dos meios-tons, que nobilitam os bons
autores da arte poética. Cria ele, através dos
poemas e prosas poéticas, uma empatia imediata com o
leitor, porque é liberto de metáforas enganosas,
humano e essencial. Tal como afirma em “Destino”:
“Não sou posteridade/nem epitáfio./Serei saudade e
eternidade/no amanhã distante”.
CAIO PORFÍRIO CARNEIRO
Escritor e crítico literário