Fabio Daflon
Judô
Justo naquele dia começara o horário de verão, talvez por isso o
atraso de Evaristo.Trabalhávamos no mesmo hospital há um ano, nossos
filhos tinham a mesma idade.Por contingências profissionais mudara
para Campo Grande, Zona Oeste do Rio de Janeiro, a fim de ficar
perto do Hospital onde possuía cotas.Éramos sócios.
Adiantar uma hora do relógio e ainda aturar atraso é dose. Antes
morava em Copacabana, ainda freqüentava o Leme Tênis Clube. O
combinado era pegar uma piscina e depois almoçar por lá. Mas
Evaristo só chegou depois das dez horas. Está tarde, disse, sem
desculpar-se, Copa fica muito longe, que tal se formos para Barra de
Guaratiba? Olhei para minha mulher. Ela estava de saco cheio. Está
bem, vamos logo então. Pode ser no meu carro? Pode. Marieta sentou
atrás com as crianças. Evaristo ligou o ar e pôs som na caixa.
Relaxamos. O trânsito ajudou, chegamos rápido. Está vendo lá embaixo
é a Prainha. Lugar lindo. Faixa estreita de areia entre dois
rochedos. Escadaria para descer do bar até à praia. Bom serviço de
garçom. Pedimos duas caipirinhas e patinhas de caranguejo. Marieta,
coca light. Guaraná para as crianças. Fascinada pelo mar Julinha não
me deixou beber a caipira inteira. Comi só duas patinhas.
Pai, vamos para praia? Já, já, espera um pouco. Comi mais uma
patinha. Felipe não quis descer comigo, preferiu ficar com o pai.
Evaristo se divorciara da mulher, o guri andava apegado. A Prainha é
mar aberto. Apenas uns gatos pingados estavam na areia. Caminhei
pela areia fofa. Senti piso duro e úmido sob meus pés. Hesitei em
seguir em frente. O mar a uns dez metros. O mar sempre me intrigou,
seja como metáfora do desejo seja pelas suas nuances de violência e
cor. Juju agachara-se. Percebi a língua d´água agigantar-se a tempo
de gritar, Ju corra para meu colo! Lutara judô pela equipe da
faculdade nos jogos universitários, mas já não praticava há mais de
10 anos. Acolhi minha garota ao colo. Ela agarrou-se ao meu pescoço.
Virei de costas e abri as pernas, com leve flexão dos joelhos. Os
gatos pingados debandaram com medo de água fria. Marieta trocava
olhar comigo. A língua d’água lambeu nossos corpos até o pescoço.
Foi lá na frente e voltou tirando areia debaixo dos meus pés. Cavou
um buraco. Saí do mar com areia até nos tornozelos. Fôramos salvos
pela base do judô. Subi até o bar do rochedo, bebi o resto da
caipirinha e disse Evaristo vamos para casa. |