Sent: Saturday, August 09, 2003 3:34 PM
Subject: Poema SE
Prezado
Soares,
Quando
um poema é capaz de me passar uma emoção, como aconteceu
com o teu bonito poema SE, isto para mim é uma prova
definitiva! O resto é conversa ou querela(quase sempre vã)
de crítico literário. Rainer Maria Rilke(em Cartas a um
Jovem Poeta, Edit. Globo) já advertia: "Leia o menos
possível trabalhos de estética e crítica. Ou são
opiniões partidárias petrificadas e tornadas sem sentido
em sua rigidez morta, ou hábeis jogos de palavas inspirados
hoje numa opinião, amanhã noutra. As obras de arte são de
uma infinita solidão; nada as pode alcançar tão pouco
quanto a crítica". Mas foi Edmund Wilson(conforme
citado por Hélio Pellegrino no artigo "Escuridão e
Rutilância", publicado no jornal Folha de São
Paulo de 08.10.86) quem melhor estabeleceu a diferença
entre crítico e artista criador: "O crítico, naquilo
que escreve, sabe mais do que diz, ao passo que o artista
criador diz mais do que sabe". E continua HP:
"Isto decorre do fato de que o crítico se move,
predominantemente, na área consciente e reflexiva do seu
psiquismo, ao passo que o artista criador, em seu mergulho
poético, ordenha leite da escuridão". (...) "O
crítico é sempre capaz de explicar o seu texto"[cartesianamente],
ao passo que "O artista criador é explicado pela
obra que faz muito mais do que é capaz de explicá-la. A
linguagem criadora é carregada de noite, de refrações
simbólicas, de confusos rumores, cuja crepitação
jamais se deixa capturar pela fome de clareza que define o
pensamento consciente. Aliás, há que precatar-se contra a
ilusão das claridades excessivas. Elas velam a realidade
muito mais do que a revelam. No centro do incêndio solar, há
um latifúndio de treva, da mesma forma que no caroço da
noite enorme, fulge uma fogueira de luz"(Hélio
Pellegrino, id. ibid.).
Acho,
então, que se pode aplicar a este teu poema(e, em geral, ao
que eu já li, até aqui, da tua poesia), o que o
poeta Robert Lowell dizia a respeito de si mesmo:
"tiro poesia de onde bem entendo, não dou muita
satisfação", e dizia ainda: "poeta pode
ser inteligente e cônscio do que faz. No entanto, caminha
meio aloprado e sobrearmado, preso[ao mesmo tempo] de
sua amnésia, ignorância e instrução".
"Então eu tomaria conta das forjas
dos ferros e do carvão"
Tal
qual acima, o teu poema é assim como o metal nobre
incandescente escoando, junto com a ganga bruta, da cratera
de Vulcano ou da forja de um ciclope. Às características
"heróica, telúrica e lírica"
da tua poesia, permito-me, então, acrescentar mais
uma: CICLÓPICA!
Um
grande abraço, com admiração!
Mauro
Mendes
Salvador
- Bahia
09/08/2003
|