No vão das coxas dela
Ela
dizia que doí quando despontei à beira do poço escondido no vão das
suas coxas. Doí uma dor que ela nunca sentira.
Dor
doída, sangrada, melada, enrolada em tripa. Doí tanto que de
susto os mamilos fecharam as bicas e empedraram a Via Láctea. Susto
doído, gritado, esperneado, faminto, desamparado. Susto mariano,
enrolado em mantas franjadas e fraldas molhadas. Susto - que me
perdoem os Josés - solitário, frio por paredes frias de maternidades
mais frias ainda...
Hoje,
passados cinquenta e oito anos de vida aninhada em seus seios
murchos, caídos, carcomidos pela terra que agora a cobre num poço
escuro, sem coxas e sem vão, a dor -
a dor danada - me estilhaça em Via
Láctea sem leite, estrelas e vida. Doídamente descubro que
aniversário só tem sentido quando as mães estão por perto...
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