Ivana Arruda Leite:
Muito humor para falar de pouco amor
Com o mesmo humor preciso, às vezes
ferino e quase sempre afetuoso com que constrói seus contos — que
versam, em grande parte, sobre relacionamentos amorosos para lá de
fracassados — a escritora Ivana Arruda Leite se define como a
“rainha dos baús”. É que apesar de escrever incessantemente desde
bem jovem, essa paulista de Araçatuba, que cedo trocou o interior
pela capital, só viu seu primeiro livro publicado em 2002 (“Falo de
mulher”, pela Ateliê), quando já tinha 51 anos. E quando já tinha,
em seus baús, material suficiente para publicar mais uma série de
obras.
Pois foi o que aconteceu. Depois de
tanto tempo cumprindo o mesmo trajeto feito por milhares de
escritores — ou seja “mandar originais para as editoras e receber um
não como resposta”, diz Ivana — a autora, hoje com 54 anos, já tem
quatro livros nas prateleiras e textos em outras tantas coletâneas,
o que a faz também se auto-intitular carinhosamente de “rainha das
antologias”. Embora Ivana continue a escrever sem parar, muitos dos
contos presentes em seus livros, inclusive no mais recente, “Ao
homem que não me quis” (Editora Agir), foram resgatados dos velhos
baús.
— Acho que o melhor do meu baú está em
“Falo de mulher” e neste “Ao homem que não me quis” — conta Ivana,
que cursou arquitetura nos anos 70 e depois formou-se também em
ciências sociais. — São histórias escritas há dez, 15 anos. Mas tem
coisa nova.
Do baú ou mais recentes, as histórias
de Ivana têm em comum cenas de infelicidade amorosa, com mulheres
sofrendo por homens que as rejeitam, sofrendo a cada partida do
parceiro, sofrendo porque o par ideal nunca aparece, sofrendo por
amar. Leitura deprê? Nem pensar. Nos quinze minicontos — pequenos
achados literários de um ou dois parágrafos — e três contos do novo
livro, todos esses fracassos amorosos não derrubam as personagens
diretamente na lama. Elas podem até cair, mas não sem antes cravar
duas ou três observações que provocam risos no leitor.
Como por exemplo no miniconto “A
quinta carta”, em que uma mulher acredita que vai encontrar o homem
da sua vida de repente, e que vai reconhecê-lo imediatamente, como
previu uma cartomante. O problema é que no dia em que vislumbra o
tal sujeito ele está de carro, e ela a pé. “Foi assim, por uma
fração de segundos, que eu perdi o homem da minha vida. O destino
sempre cumpre o que promete, mas o trânsito nem sempre ajuda”,
filosofa a coitada.
— Como só falo de desgraça, como não
há um só amor bem-sucedido, uma mulher feliz, uma coisinha leve, o
meu respiro é o humor. Se eu não lançasse mão dele não me salvaria —
conta Ivana, lembrando, às gargalhadas, que uma tia vive perguntando
a ela quando vai escrever um conto com final feliz.
Ivana diz que trafega pela contramão,
ou seja, mostra personagens que não são as mulheres lindas e
bem-resolvidas que ilustram revistas e programas femininos: — As
mulheres dão cabeçadas a torto e a direito. Minhas amigas não vivem
esse paraíso, eu não vivo esse paraíso. Então me proponho a falar
disso.
Fracassos amorosos que divertem os leitores
Embora reitere que sua literatura não
é autobiográfica, Ivana, como todo escritor, reconhece que leva para
seus textos um pouco da vivência pessoal.
— Minha vida é uma vocação para o
fracasso amoroso total, eu sou talhada para não dar certo — conta
ela sem qualquer pingo de drama. — Me separei quando minha filha
(hoje com 26 anos) era pequena, depois namorei, tive casos. Até que
resolvi parar com as minhas histórias de desgraça fazendo literatura
que divirta as pessoas.
Apesar de ter uma boa reserva de
textos ainda inéditos, Ivana continua a escrever sem parar. Boa
parte dessa escrita, aliás, pode ser vista no blog da autora (www.doidivana.zip.net),
diversão criada em janeiro [22005] e na qual ela se confessa
irremediavelmente viciada.