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Três jovens poetas goianos conversam com Soares Feitosa


Carlos Willian Leite, Fracisco Perna Filho e João Aquino Batista, três jovens poetas goianos, entrevistam o editor de poesia, Soares Feitosa. Goiânia-Fortaleza, em 5.3.2005, por email:

 

1. Chico Perna - O Nordeste tem-nos brindado com que há de maisFrancisco Perna Filho consistente na poesia brasileira, basta citarmos Gerardo Mello Mourão, Joaquim Cardozo, Ascenço Ferreira e, é claro, o senhor. Há uma predestinação do nordestino para poesia?

SF: Retomemos a Caverna de Platão: onde seria mais fácil fazer poesia, lá, do lado de dentro ou do lado de fora? Presumo que mais fácil seja para quem frequenta os dois lados ao mesmo tempo. Aqui, Nordeste, este excesso de luminosidade, lado de fora; a desesperança, terra de águas curtas, lado de dentro. Tragédia e glória, portanto, emparelhadas dia e noite – deve ser isto. Desconfio que temos, nordestinos, algo a ver com a cultura judaica: a certeza da inclemência, o tempo, o solo; a certeza de nossa feiúra — somos feios, sim, baixinhos, atarracados, disformes; e, em paralelo a certeza do estudo como caminho estreito da redenção. Uma porta estreita, muito estreita. Por isto mesmo, desde o Brasil colonial, as redações do País estão repletas de nordestinos. Aqui, o cabra, ou estuda ou desce. Não há alternativas. E, por favor, meu caro Chico Perna, trate-me por você, a não ser que o distanciamento jornalístico o imponha.

 

2. João Aquino - Quais os ícones da poesia nordestina você destacariaJoão Aquino Batista hoje?

SF: Pegaria muito mal para mim, editor de poesia, no Jornal de Poesia, mais de três mil poetas, sair por aí fazendo escolhas, porque se escolhas fosse fazer, o JP seria apenas de Castro Alves, ele, lá em cima, sozinho, emparelhado com Nosso Senhor Jesus Cristo. Contudo, não posso negar minha mancebia com Gerardo de Mello Mourão e com o Galo-Galo de Ferreira Gular. O Poema Sujo bem que poderia ser um estupendo poema não fosse a pornografia, o c*zinho azul do poeta que nem sei se é tão azul assim. Nem quero saber. Jamais o imaginei, nem a ele nem a ninguém, com esse produto, c*, azul, preto, vermelho ou roxo. Tenho certeza de que leitor algum necessita levar em conta os odores do c* gularteano para gostar ou desgostar da poesia dele. Tenho que a pornografia e o palavrão nada têm a ver com Arte. Incompatíveis, eu acho. No meu tempo de Cidade da Bahia lançaram, com patrocínio público, um CD do Gregório de Matos, que teria sido um magno poeta, não lhe fora a boca imunda. Pois bem, uma senhora de idade, até muito distinta, recitava aquela chuleria do Gregório, na Academia de Letras da Bahia, um fim de tarde, as ruas apinhadas, os colegiais nas paradas de ônibus bem em frente; a irradiadora da ALB a todo volume, que muito bem daria para escutar em todo o trecho do bairro da Piedade, e ela, a anciã, enchendo a boca de caralh* e grel*. Confesso-lhe, meu caro poeta Aquino, fiquei com muita pena daquela senhora, que, já de terceira idade, descambando para a quarta, desconfio nem soubesse o significado daquilo tudo. Poeta Aquino, temos que fazer uma campanha em prol do palavrão! Veja, no momento em que o palavrão ganhar foros de linguagem social, simplesmente terá deixado de ser palavrão, o que, para o palavrão, será uma perda irreparável. No meu tempo de jovem, porr* era um palavrão que não tinha tamanho. Começaram a dizer “pô”, mas nada a ver com o estouro de um saco de pão, de papel, seco, quando a gente aperta-lhe a boca e bate-o com as mãos, melhor com o pé: pô! Do “pô”, descambaram para porr*, que hoje freqüenta os melhores ambientes, talvez até nos sermões os padres já o digam. Eu não digo, mas é de puro respeito ao instituto do palavrão. Até senhoras de idade dizem “caracas!”, não na intenção do sobrenome de algum cristão, mas no sentido chulo, do Gregório de Matos, como aquela senhora recitava-lhe «carvalho» subtraindo-lhe o “v”. Agora mesmo, Ivo Barroso e Wilson Martins despacharam uma bela lapingonchada no lombo do Cristóvão Tezza, porque ele teria vulgarizado o palavrão, de tanto usá-lo à-toa, em livro recente. Veja, meu caro poeta Aquino, o palavrão há de constituir zona de segurança, um refúgio a ser utilizado só em absoluto desespero, quase in extremis. Se banalizar, na hora do sufoco vai-se usar o quê? Tiros, certamente, como o fez o ***. Ele matou seca e silenciosamente, sem dar uma palavra, o vigia do bar, que o impedira de entrar depois do expediente. Se aquela nobilíssima autoridade, depois do proverbial «Sabe com quem está falando?!», tivesse destampado a parte imunda que todos nós temo-la, e coberto aquele vigia de palavrões bem cabeludos, quem sabe, a má índole, lá nele, se dissipasse. O Tezza seria culpado? Bom, não deixa de ser interessante essa teoria conspiratória. Vá ver, tem o dedo da CIA, do FMI ou do comunismo internacional. É muito triste constatar que já não dispomos de um respeitável estoque de palavrões para descarregar a violência. Em vez de descarregá-la aos palavrões, descarregamo-la no revólver, tiros à queima roupa e pelas costas, na cabeça desses vigias mais insolentes. Isto mesmo, cadê o palavrão?! A literatura o banalizou. Os Tezzas do trecho escrevem palavrões como quem come pipoca com coca-cola, e ainda justificam que teria sido para dar ênfase, uma falta de criatividade, evidentemente. Fica lançado nesta entrevista, meu caro poeta João Aquino, o MPP, Movimento Pró-Palavrão! Há outra coisa da minha ojeriza em literaturas e literatices: o tal poeta demolidor, maldito, transgressor, perverso, essas bobagens. Prefiro os terroristas, sobretudo os suicidas, que, pelo menos, são coerentes. E honestos. Outro dia, fui ver um livro de transgressores. Corri-lhes os nomes nos antecedentes criminais dos “sites” da Justiça. Transgressores coisa nenhuma! Muito pelo contrário, pacatabilíssimos cidadãos, amantíssimos pais de família, sequer cheques sem fundos soltam na praça. CPF e Carteira de Motorista religiosamente em dia! Muito menos matam criancinhas, nem vigias de supermercado. Transgridem o quê? A paciência do leitor, certamente. E o feijão, às bocadadas, transgridem-no.

 

3. Carlos Willian Leite – Em qual Igreja o senhor reza?Carlos Willian Lete

SF: Não há, no mundo ocidental, literatura fora da Bíblia. Não sou religioso, nem ando rezando em igreja alguma. Há muitos anos, mais de vinte, não boto os pés numa igreja, embora tenha sido seminarista e venha de família muito religiosa, de pai e mãe. Minha avó paterna era tão rezadeira que jamais pronunciava “culher”, mas “còlhér”. Cueiros? Nem pensar! Ela dizia: “os paninhos da criança”. Fui passar uns dias por lá, tinha uns seis ou sete anos, e disse-lhe que queria cag*. Foi um escândalo! Ela disse: «Meu neto, o certo é defecar! Sua mãe não ensinou?!» E, no ato, me entregou um sabugo (material de “limpeza”) e me encaminhou ao matagal com uma tia que ficou de costas, lá de longe. Tão logo voltei do mato (lá no sertão, a privada é nos matos mesmo, numa moita, um suíno por perto, corrronche, corrronche, uma temeridade!); pois bem, mal retornei da “precisão”, já era de tardezinha, a avó ensinou-me o Ângelus, que depois aprendi em latim e esqueci em português. Retomando o tema da pergunta: Se é a igreja-igreja, considero-me bíblico, de leitura cativa, a minha, ali debaixo da rede, de ler e reler todos os dias. Tenho várias traduções a comparar o tempo todo, com preferência à Bíblia de Jerusalém e à magnífica edição de João Ferreira de Almeida, um clássico lusitano, do ramo protestante. Por favor, repito: não sou religioso, nem leio a Bíblia em nome da fé. Leio-a como suprema poesia de nossa vida nesta banda do mundo. Toda a poesia do Ocidente está lá. Devia ser livro texto obrigatório em qualquer escola de literatura, do primeiro ao último ano. Fico com muita pena quando um poeta me diz que não conhece a Bíblia. E o Corão. Claro que o Corão também tem que ser lido, relido e admirado. Aquilo também é pura poesia! Todos os grandes escritores são bíblicos, de Dante a T. S. Eliot; de Kafka a Harold Bloom. Chico Pires, o bardo inglês? Ninguém mais bíblico que Chico Pires! Hobbes, Milton, Mann, Frye, Graves, Borges, Eco e mais uns poucos, os de larga estirpe, é claro. O Menino, assim me refiro a Castro Alves, era bíblico. Um poeta da Bahia, Carlos Eduardo da Rocha, já falecido, publicou um opúsculo com as citações bíblicas de Castro Alves. Agora, se a pergunta é no sentido de igreja-igrejinha, a resposta é: frequento a igreja dos meus amigos. Se é amigo meu, tenha certeza, é grande poeta. Se mau poeta, fujo dele como o cão-demônio foge da cruz de Cristo. Aliás, fugia. Hoje foge a acudir meus inimigos, os maus poetas, que nem os tenho.

 

4. Chico Perna - O senhor só escreveu o primeiro poema aos 50 anos. Diga-nos uma coisa, como foi comportar um poeta - da sua envergadura - adormecido durante tanto tempo?

SF: Dou balanço duplo: (i) na minha rede, comigo dentro dela; (ii) na minha cachola, eu do lado de fora. Não houve uma brutal mudança na minha maneira de “ver” as coisas. Sempre fui, desde menino, muito cutucador de coisas, sovacos e dobradiças. Ah, meu caro Francisco, no meu livro sem fim, Salomão, que já vai para oito anos, há um trecho que explica esse poetar-observar ou seria observar-poetar. Era jovem, uns 13 anos, lá nos matos, a fantástica história quando, montado num jumento, deparo-me com uma árvore no meio de muitas outras, e, sem motivos aparentes, agarro-me com o olhar àquela árvore, na passada bem lenta do jegue. Inicialmente quase de frente, mas o caule girando à medida que animal avançava. Depois, ficando para trás, a árvore, até que, num lance de total absorção, pufo no chão! — caí do jegue. Levantei-me e retornei, subindo a pé a ladeira até o início da visada. O jegue esperando na maior calma. Fiz o caminho de volta, a pé, no sol quente, até o jumento, sempre olhando aquela mesma árvore, só aquela, que os meus olhos não se cansavam de olhar. Montei e prossegui nos mesmos olhos, mas quando a árvore foi ficando para trás, na impossibilidade de olhá-la melhor, porque com a cabeça muito torta já tonteava, num salto súbito revirei-me na sela e prossegui olhando, agora de frente para a árvore, mas montado de costas para a cabeça do jumento. Bom, se alguém contar que já viu um caule de pau-branco, este o nome da árvore sertaneja, daqui, com mais observância, tenho todo o direito de duvidar. Em suma, o olhar, a visada: os elementos de fora; em paralelo, a introspecção a trazê-los para dentro. Sempre pratiquei distância muito curta entre o racional e o emocional. O pensamento, solto-o com muita facilidade. Mas não sou um zonzo. Pelo contrário, no meu trabalho ligo-me com segurança às coordenadas. Finalizando a resposta: sempre “poetei” para dentro, com o material de fora. Apenas não escrevia. Gastei 50 anos nesse tirinete, só com meus botões. Uma linha sequer, nenhuma mesmo.

 

5. Carlos Willian Leite – O crítico Wilson Martins o definiu como um poeta lírico de harmônicas universais. Como é possível ser lírico vivendo na era da barbarização. O que restou do lirismo?

SF: Ora, meu caro Carlos, não há ambiente mais propício para ser lírico do que em meio à barbarização. Discordo de Adorno, que declarou que depois de Auschwitz ninguém poderia escrever poesia. Acho que depois de Auschwitz é que temos o direito e a obrigação de escrever toda a poesia do mundo: «Glorifiquemos, estamos vivos!» Ou: «Estamos mortos, caiamos em contemplação!» No mesmo arame, portanto, vida e morte, a essência da poesia. É verdade, quem está de barriga bem cheia ou saciado de cama, não vai poetar coisa nenhuma! A poesia, «fazemo-la» «de noite», mas ela nos aflora «no de dia». Isto tem que acontecer sem nenhum esforço, tal como respirar ou comer uma tapioca com café bem quente. Veja, preciso transcrever a opinião do crítico de literatura, Sébastien Joachim, um canadense, do meu tempo de Recife: «Soares Feitosa: quem o vê/ouve declamando seus poemas se convence logo de que ele é uma encarnação poética, que carrega dentro de si e irradia poeticidade em estado puro». Claro que isto não pode ser de afetação, nem uma coisa forçada.

 

6. João Aquino - Em Goiás nós temos vários poetas que se acham conhecidos no universo inteiro. Você poderia comentar algo sobre a poesia goiana? Qual poeta você destacaria.

SF: Poeta Aquino, tenho muita dificuldade em responder esta pergunta. Apesar de editor de poesia, creia-me, minha leitura é muito pouca. É inacreditável, mas na hora em que você está diagramando um texto na Internet, você é apenas um “tipógrafo” a trabalhar uma mancha gráfica na tela do computador. Nem o tipógrafo de papel e tinta, nem o programador de “pages” conseguem ler nada. Aconteceu um fenômeno muito estranho comigo: sempre li demasiado, mas abominei tudo que se fez do “Modernismo” em diante. Só aos 50 anos, fui tomar conhecimento dos Drummonds; dos Afonsos, o Romano e o Félix, este, por sinal, grande poeta goiano e falecido esposo de amiga minha, a poetíssima Astrid Cabral. Um belo dia, já metido a “escritor”, fui à livraria Livro 7, no Recife (morava lá, à época, 1993 ou 1994) e comprei cerca de dois metros de livros de poesia. A dificuldade de ler os “modernos” sempre foi imensa. Era abrir o livro e, à primeira grosseria, devolvê-lo bem ligeiro à estante como se fosse um escorpião ou uma lagarta de fogo. [Não! Bandeira, não. Bandeira é poeta!] É tanta coisa para ler, meu caro Aquino, que já não me chegam as horas. Pior, cada dia releio mais e mais. Acho que é uma “vantagem” da perda de memória, da velhice (61, eu, agora em janeiro deste 2005): a gente relê aquele livro tão conhecido, maravilhando-se como se fosse da vez primeira. Seria uma forma de ganhar uma nova “juventude”, a dos desmemoriados? Estou achando uma beleza! Com a palavra os Antónios Damázios, os estudiosos da mente.

 

7. Carlos Willian Leite – O senhor é editor do maior site de literatura da América–Latina, talvez do mundo, onde encontra tempo para escrever?

SF: Não gasto tempo para escrever poesia, meu caro poeta Carlos Willian. Tempo, gasto-o num parecer jurídico, numa tese de trabalho, do escritório. Esclareço: fui auditor, fiscal do imposto de renda, 35 anos, por concurso, um cabra estudioso e produtivo. Aposentei-me e tanjo hoje um escritório de advogados. As coisas não se misturam. Aliás, misturam-se todas. Sei que estou fazendo uma peça, um mandado de segurança, um agravo de instrumento, essas coisas bem complicadas, mas percebo que o “lado noite” está aceso, ali perto, tinindo, lampejando e faiscando. Atrapalhando, não! Até se complementam, com discrição, é claro. Por outra, estou lendo um poema, uma dissertação de literatura, e, sem mais nem menos, chega-me uma coisa da outra banda, a do escritório. Tenho que anotar, num caso ou noutro, senão esqueço para nunca mais. Um poeta me disse que eu devia andar com um gravador. Deus me defenda! É coisa demais! Melhor esquecer pelo menos uns 90%, senão a cachola arrebenta. Ah, retomando a pergunta: todos os meus poemas, por maiores que sejam, foram escritos no pei-pei, ainda que varando a madrugada. Jamais tive um texto pendente, um telefonema para um compadre para pedir uma rima. O texto “chega”, quando chega, sem me tomar tempo algum. É botar no papel e pronto, só isto. Aliás, no computador, que há muitos anos escrevo direto no “Bilgueites”. O livro sem fim, de que falei há pouco, Salomão, inicia-se com um poema longo, escrito de uma sexta para o sábado. Desdobra-se em prosa, ensaio, História, conto, fábula, apólogo, uma coisa dentro da outra, umas 800 páginas. O encadeamento desse cipoal é que toma tempo, que já não tenho nenhum. Esta entrevista era para ter sido respondida no mesmo dia, como garanti ao poeta Carlos Willian no email, mas tive que aprontar quatro defesas fiscais da maior importância. Dinheiro? Ele é que tem que correr atrás de mim. O fato que o tempo está totalmente tomado com as letras e a fala: leituras, muitas, jurídicas também. A complicar, escrevo na área jurídica, revistas especializadas do Direito Tributário. Mas lá, por favor, é o Francisco Feitosa, o advogado, nada a ver com o Soares Feitosa, este aqui, da palavra gratuita.

 

8. Chico Perna - Gerardo Mello Mourão, para falar da grandiosidade da sua poesia, vale-se de Ilarie Voronca, poeta romeno: Il nous vient perfois, d’um pays loitain (...) A poesia que Chega, não de onde se podia esperar, mas de onde tinha que vir. Fale-nos desse lugar, fale-nos de Francisco José Soares Feitosa.

SF: Poeta Chico, o assombrado com o Soares Feitosa sou eu mesmo. Tantas dificuldades, o suicídio do pai no mesmo dia do meu nascimento, uma infância difícil, mais difícil ainda a juventude, a quase indigência no seminário de Sobral, estudando de caridade. Depois, na maturidade a quebra comercial. Jamais uma carranca, nem a má-palavra, uma reclamação que fosse, uma praga ou mínima lamentação. O velho Jó? É meu colega, tenho certeza! Quem disse que é fácil? É fazer da vida interna o lema de um poema meu, Psi, a Penúltima, quando Chico Pires diz a uma raposa que passava por uma provação desesperada: «Eu glorifico, comadre! Eu glorifico, só isto!»

 

9. João Aquino - Para você, a poesia é invenção, parto ou regurgitação?

SF: Poeta Aquino, eu diria que a poesia para mim é o meu estado de existir. Sempre foi. O poético não me atropela, vivo e convivo com ele. Lembro de uma passagem de Umberto Eco, em O pêndulo de Foucault, quando o personagem olha aquela geringonça, o pêndulo, em França, pra lá e pra cá, das alturas, aquele fio de aço retesado. Ele se assombra porque os circunstantes não se emocionavam nem um pouco. Pois bem, se é uma árvore bem tosca, da caatinga, que um dia me enleva, noutro dia é um pedaço de bolo, uma perna de mulher, independente de qualquer chamariz de sexo; noutro é uma perna só-sexo, ou o rosto de alguém passante, sei lá, os punhos de minha rede, uma buzinada lá longe, chocalhos, coalhadas, mas, e sobretudo, o «Passe a mão, amor!», tema do mesmo poema, Psi, a Penúltima. O Homem, meu caro poeta Aquino, em sentido amplo, é meu alvo, a minha busca. Escrever um poema para mim é simplesmente impossível se ele, poema, não vier chegando, assim mesmo, no modo presente. Tem que ser chegando; nem antes, nem depois. Um grande amigo meu, artista plástico e também tributarista, Valdir Rocha, fundador da Revista Dialética do Direito Tributário, resolveu lançar uma coletânea de poemas sobre as estações do ano. Ele me disse: Soares, mande um poema sobre a Primavera. Respondi-lhe que não sabia fazer um poema sobre a Primavera. Aliás, sobre coisa alguma. Ele, de início, até chateou-se porque choveram-lhe poemas primaveris na caixa de mensagem. Depois, acreditou na minha sinceridade. Se tiver que passar por uma prova de fogo para fazer um poema, sairei chamuscado, queimado, torrado, esturricado: não haverá poema algum. Logo, nem é invenção, nem regurgitação. Parto? Sim, mais para um parto. É chegar o poema e pari-lo inteiro, pei-pei! No a-te-o-tó! Percebo quando o bicho-poema está fermentando aqui bem de junto, mas não me avexo nem um pouco. Passo meses e meses semA menina afegã, de Steve McCurry escrever nada. Aliás, passei 50 anos sem uma única linha. Nem lembro o que escrevi da última vez. Acho que foi A menina afegã, há bem uns dois anos ou mais. O fazer do A Menina afegã foi assustador, creia-me. À época, o fotógrafo conseguira reencontrar aquela que um dia fora a jovem tão bela, do retrato. Uma coisa triste, acho que ele não devia tê-la exposto sofrida, envelhecida, caída. Mas expôs e, com a exposição, a foto inicial retomou todo o impacto, na imprensa mundial, na National Geographic e na TV. Ana Behrens, da Bahia, amiga e poeta, mandou-me um email com a foto. Aquilo deve ter ficado pinicando na cabeça do véio aqui, sem eu me dar conta. No escritório, depois de um dia terrível, já em cima da hora, corri para a Faculdade. De noite, levantei-me e ataquei o computador. Não é apenas um trabalho de texto, pois envolve também o recorte da foto, com todos os créditos, é claro, ao autor da foto. No outro dia, o advogado Rogério Lima, que trabalha comigo, levou um grande susto com A Menina Afegã, no ar, on line, no JP. Não acreditou. Disse que eu certamente estivera fazendo e refazendo aquele texto há meses. Hoje ele acredita. A Menina Afegã rendeu-me comentários de grande generosidade. Em suma, o tempo gasto, não o gastei; quem o gastou foi o “outro lado”, de noite, fermentando, fervendo, caldeando. No plano do consciente, creia-me, estou totalmente inocente de todas essas presepadas. Mas é coisa daqui mesmo, da outra banda do quengo, sinto-a cutucando-me todo o tempo. Se me mudo para o lado "emocional", esta banda de agora, do racional, pelo menos na aparência, racional, não se desliga de todo, tal como os aquecedores de gás quando apagados, aquela chama minúscula, acesa, ainda que apenas latente, bem verd’azulzinha, ótima de olhar, um perigo de pegar, pior de cheirar.

 

10. Carlos Willian Leite – Entre o purismo panglossiano e as rupturas de sintaxe, existe um caminho do meio?

SF: Se for para escolher entre o otimismo do Doutor Pangloss e o mal-triste de muitos poemas, prefiro a empolga. O tirinete alto, a onda alta, a la Álvaro de Campos. Para mim, o Fernando Pessoa verdadeiro é em Álvaro Campos. Salomão, o tal livro sem fim, é tirado de uma estrofe da Ode Triunfal, belíssima, quando Pessoa/ Álvaro de Campos, em 1914, ante a recém-inventada lâmpada elétrica, coisa que para nós já não causa mínimo assombro, escreveu que dentro daquela maravilha pulsavam o cérebro de Virgílio e de Platão, e que, aqueles mesmo átomos, de dentro da lâmpada, iriam fazer cócegas ao cérebro do Alexandre Magno do século cinquenta. Finaliza garantindo que aqueles átomos, tão fantásticos, haveriam de trazer febre ao cérebro do Ésquilo do Século Cem. Em suma, com este mote de Álvaro de Campos, o Século Cem de Ésquilo, intento uma viagem em torno do conhecimento milenar, ao destempo, das mãos sobre mãos — as nossas, minhas e vossas, que, aqui e agora, são herdeiras e continuadoras das mãos de Virgílio e de Platão, a encontrar as de Ésquilo no século cem. Se vamos honrá-las, isto é outra história.

 

11. Chico Perna - Ao pensar o poema, como o poeta deve tratar o sentimento?

SF: Poeta Francisco, desculpe-me responder com a mais absoluta franqueza: nunca pensei poema algum. Nem os que escrevi, nem aqueles que li. Como leitor, gosto ou detesto, sem pensar coisa alguma. O sentimento? Ah, o sentimento! Poema e sentimento chegam-me ambos aos emboleus, sem pensar, já pensados. Lembro como se fosse hoje, botando no papel Psi, a Penúltima, lia em voz alta, com a garganta e as lacrimais — mas era em silêncio! —, aquilo que ia escrevendo na tela do computador. Sim, o poema tem que ser escrito em voz alta, ainda que sem som externo algum. Desculpe-me esta outra colocação: «Desde quê!» Esta expressão meio cruel, «desde quê», uso-a aqui com meus amigos da poesia e do jurídico. Dizemo-nos: é tudo muito fácil... «desde quê». Montar num burro bravo? Nada mais fácil...! «desde quê». Se não, ou o burro está morto, ou prepare o sedém para uma bela queda... ou, quem sabe, você nem caia... «desde quê» seja um bom domador de cavalos. Encanto-me com uma senhora negra, do laboratório onde repito os exames de colesterol e próstata: ela faz aquela picada na veia do cristão, que fico horas e horas olhando, na minha, que até acho bom, perícia que me sublima a dor; e de quem chega... olhando... «desde quê» naturalmente, vapo!... bem ligeira a agulhada, os sangues, olhando, eu, os vidrinhos bem arrumadinhos em uma bandeja, tudo muito limpo, afrouxa-me o garrote do braço, séria e meiga: Pronto! — ela diz.

 

12. João Aquino - A crítica literária é indiferente à poesia? Quais os críticos que merecem respeito quando o assunto é poesia?

SF: Igrejas?! Aqui é legítimo falar em igrejas. Há duas correntes absolutamente inconciliáveis. Pró-Wilson Martins, contra Wilson Martins. No ambiente das letras, universidades sobretudo, a turma do “op cit”, essa gente que apenas cita e cita, fala muito mal de Wilson. Na mesma proporção que fala de mal, fala de bem de Antônio Olinto, de Antônio Cândido, do Portella, aquele que esteve Ministro, de Silviano Santiago, de Luiz Costa Lima, de mais uns 30 ou 40, desde que não seja o Wilson Martins. Os "op-citeiros" quando escrevem sobre crítica literária aplicam em Cândido a patente de O maior crítico brasileiro, sem esclarecer como teria sido realizado o concurso, se é que houve algum. De pleno acordo, é excelente o Doutor Cândido. No meu tempo de Cidade da Bahia, Ildásio Tavares, não tão alto, apostava com Fernando da Rocha Peres, alto e elegante, quem seria, na fita métrica, o maior poeta da Bahia. Bom, no quesito barriga, Ildásio ganhava de dez a zero. Sim, Ildásio é poeta! Eu também; poeta nem tanto, mas baixote e barrigudo, com certeza. Aqui mesmo, no Ceará, um amigo meu, das letras, a quem não via há uns trinta anos, quando mostrei a ele a página inteira do jornal O Globo, Wilson Martins falando muito de bem do filho único da velha minha mãe, ele, Teoberto Landim, torceu a cara. Disse-me que aquilo não valia o que o gato enterra. Evidente que fui tomado de grande pena do meu bom amigo, colega de classe no seminário, o Professor Teoberto Landim. Quem pensar que aquela senhora, Dona Cica-não-sei-de-quê, aquela que teria botado, assim disseram os jornais, a rival para correr na festa do jogador, en France, poderia ser tomada como exemplo de desbocada, pelo contrário, o ofidiário é aqui mesmo, nas Artes, tanto pior na poesia. Veja a mim, aqui, um sujeito tão pacato, descendo a malho, gratuito, nos "op-citeiros", coitados, que mal nenhum me fizeram! Mas ninguém faz idéia do tanto de bordoadas que cada um de nós sai ganhando por aí. Reciprocamo-las, parece. E o professor Teoberto Landim? Continua meu amigo. E cliente do meu modesto escritório! Sabe, poeta Aquino, essa gente que apenas cita e cita, vão todos perder o emprego com esse tal de Google! Para que consultá-los, se o Google "cita" tudo? Assim como o pessoal da política conseguiu ficar contra as catracas eletrônicas porque desempregariam os trocadores de ônibus, temos que fazer uma campanha para acabar com o "Google ponto com". Do contrário, de que viverão nossos "op-citeiros"? Muito bom que o político anti-catraca passasse pelo menos um dia inteiro, sentado naquela joça, ônibus, andando de banda, sob a mira dos assaltantes. Meu terror é que o governo invente uma MP a demitir os tratores para contratar carros-de-bois que empregam muito mais, bois inclusos. Para mim, Wilson Martins é sério, extremamente sério. E competente. Agora mesmo desceu a ripa no ilustre Tezza, contra os palavrões. Não teria sido mais cômodo fazer que não leu? Pelo contrário, leu! E aborreceu. Concessões? Não consta que as faça. Jamais o vi pintado, nem a ele, nem ao Tezza. Digo-me a favor da igrejinha, mas é de pura molecagem: tenho a maior dificuldade, impossibilidade até, de elogiar algo de que não gostei. Os especialistas do elogio trabalham fórmulas, o linguajar chavanesco-comadrial. Experimente botar um bode num lançamento, como autor: «Este estupendo escritor universal...!», dirá o chavanesco em meio aos vivas e hurras, cheio de ternura, a contemplar o caprino, ali bem calminho, de autor, fedendo e pensando nas cabras da fazenda. Se é uma lindeza? Claro que é, sobretudo o bode. Os críticos daqui da província? Engraçadíssimos! Coleciono-os. Outro dia, um saiu-se com este comadrial: «constrangedor e provocador; escrita madura e original». E mais, na mesma tirada: «atrita e cala». Como é? O bicho dá-lhe uma ferroada nas costelas, depois fica lá, ó, bem calminho, bem caladinho, só atritando...! Um carrapato? Não! Não era um problema sanitário, nem uma endemia rural; era um elogio. Um outro, ainda mais afoito, garantiu que o elogiado era portador de alexia. Fui olhar no dicionário, saí de lá correndo, assombrado. Nem vá, por seu favor, é coisa muito ruim, uma doença terrível, degenerativa e incurável. Acho que nem com a célula-tronco dá jeito. Pois era de glória! O melhor é que elogiam à margem de qualquer fundamentação técnica. O foro, repito, é o comadrial. Um belo foro, com certeza. Escrevem muito bem, são bons poetas, são jovens; quem sabe, um dia levem a crítica a sério. Anote aí, por seu favor: Carlos Augusto Lima e Manoel Ricardo de Lima, a dupla local. Já foi muito pior, todavia. Nem havia eu terminado de chegar em minha terra, completamente falido, livrinho meu, Psi, a Penúltima, debaixo do braço, um deles (Augusto) aplicou-lhe(me) uma sova de fazer dó. Havia um outro, o Rodrigo de Almeida, especialista em demolir os animais de pequeno porte, mas até com os bois, jacarés e as onças do trecho ele se meteu. Alcides Pinto, Francisco Carvalho e Artur Eduardo Benevides, com estes também? Sim, com todos: poeta armorial, o rótulo que Almeida aplicava nas costas de todo mundo, menos nos concretos. Desconfiei que o tal armorial bem que poderia ser comigo, afinal, lidávamos com açougues no Recife. Ora, não há açougues sem facas. Afiadíssimas. Armas...! Pronto! Armorial, o dono do açougue, não? Ou, quem sabe, não seria coisa pior?! Nunca me atrevi a perguntar-lhe o significado. Ele lá, de carimbo em punho, no portão do jornal, quem lhe mostrasse um verso, no ato a carimbada, plaft!: armorial! Não; nos concretos, não. Havia um suplemento literário, era só esperar o sábado para ler o "obituário". Um belo dia, ele (Almeida) pegou um poeta daqui, o Alano de Freitas, e desceu-lhe a lenha. Fui ler o poema do Alano e comprovei, com demonstração fundamentada que, pelo contrário, o poema era ótimo; o crítico, péssimo. E o Almeida? Consta ter-se-ia mudado das Letras para Economia, com meritório doutorado na Fundação Getúlio Vargas. Faço votos de que em breve ressurja com a patente, no mínimo, de Presidente do Banco Central e de grandes corporações internacionais. Espero que, na glória, se lembre de reconhecer que deve o êxito ao Alano de Freitas e, ainda que por vias indiretas, ao véio Chico, este aqui, o armorial dos açougues; e nos convide, a mim e ao Alano para um almoço e gorda premiação sem concurso. Os prefácios, meu caro poeta João Aquino, são necessários, fundamentais para vender o produto, mas ai do leitor que se fiar em prefácios. Melhor ler antes o miolo; só depois, prefácios e orelhas, para comparar tudo na calma. A matéria comporta quilos e mais quilos de ensaios, bolinhos de bacalhau, teses, lingüicinhas fritas, resenhas, castanhas torradas, telefonemas, e cerveja. Bem gelada, por favor. Convido-os, banco as despesas, menos as passagens. Ah, se quiser ver o tirinete contra o Alano (e a favor!), está aqui, basta clicar: Alano 

 

13. Carlos Willian Leite - Poesia visual é poesia?

SF: Poesia, no sentido habitual de texto de ouvir, não é não. Disse noutra pergunta que a poesia tem que ser escrita em voz alta. Poesia visual nada tem para ler, é contra os cegos, privaria Homero de entendê-la... A oralidade! Pode até ser poético o visual, se conseguir despertar o enlevo de quem olha. Nesse tom, tudo poderia ser poesia, inclusive a Natureza. A poesia requer palavras, vozes, sons que trabalharão o ouvido externo, o ouvido médio e o ouvido interno. [Fique muito claro, por favor: palavras só não bastam à boa poesia! Há muito mais coisas, muito mais... Mas isto já seria assunto para léguas e léguas de cervejas, castanhas e paçocas. Se bastassem, um programa de computador com rimas e metro seria um estupendo poeta.] A maioria, "poesias", 99%, destina-se ao ouvido externo, boas de ouvir, ritmadas, de bom metro, mas de conteúdo nenhum, ouviu-esqueceu. Entrou num ouvido, saiu no outro? Nem isto! Bateu nas orelhas, boa de ouvir, do lado de fora porém, dali mesmo dissipou. Sobraria, "para dentro", apenas 1%? Isto mesmo, o sal, o fermento, quando existem... desde quê...! Estou escrevendo um ensaiote a respeito desses três mágicos níveis da poesia, ouvido externo, médio e interno. Não dá para estender por cá. O mais fantástico nessa demonstração é indicar que o poema verdadeiro atua diretamente nos centros vitais do leitor, ascendendo-os, no rumo de cima (mas pode ser no de baixo também) e acendendo-os como iluminação. E, por favor, mais assombroso ainda, no poema verdadeiro, no Navio, dentre poucos, as rimas estão também do lado de fora! O leitor sabe que gostou, mas não identifica exatamente o que, nem por quê. É lado mágico da Arte Poética. Daí a sua permanência; daí o lado cruel, a impossibilidade de traduzir. Essa impossibilidade de traduzir, ainda bem, é apenas parcial, posto que nos poemas-magnos não existe. Chico Pires, o bardo inglês, seu Hamlet é bonito e grandioso em qualquer língua. A Bíblia também. [Haveria, pois, aos universais, uma língua universal?! Ou seria por que eles escrevem fácil? Os grandes, é claro, por que a miunçalha faz tudo por escrever difícil, a impressionar.] Já o Corão, dizem, é absolutamente intraduzível porque os sons originais fazem parte intrínseca da mensagem religiosa. Deve ser verdade, que livro nenhum desperta mais fascínio do que o Corão, ainda que o fiel nada entenda do árabe. Você já escutou, de ouvido, quando o sacerdote do Islã, clama, lá do alto da mesquita, convocando o fiel para orar? Sim, não é um escutar apenas de orelhas! Se aquilo é bonito? É muito bonito! Com que direito o operário da palavra arma-se de armas que não a palavra em sua força primitiva e absoluta?! Devemos pleitear um voto novo para o homem-que-fala: «Pelas musas, eu juro que minha arma será tão-só a palavra, ainda que entrecortada de selás, o meu silêncio». Por estas razões mesmas, palavra de escrever e de ouvir, não creio em garatujas, caretas e mungangos como poesia. Muito menos em tiros e pontapés. Como lhe disse, faço um ensaiote. Sem esquecer que o corpo e o gesto podem ser poéticos, vide Chales Chaplin e a jovem da sandália quebrada, desfilando ainda mais bela, mas a poesia é coisa de "ouvir". Poeta, desarmemo-nos! Dizem que (é)ra uma pessoa distinta, o juiz matador. Armou-se, arruinou, arruinou-se. Teria ele querido "ouvir" o estampido? Tenho que seria muito valioso submetermo-nos, todos, a um curso de tiro "para dentro", dramatizando o real, o tiro, que, a rigor, é "para dentro". Os surdos também? Sim, também os surdos: há o coice da arma, no braço, táctil; há o estertor, no chão, matando. A partir da escola primária, não?! Sim, a crianças deviam ser treinadas contra a morte. Quando aprontar, avisarei. O ensaiote, por favor. Estou velho, misturo as coias.  

 

14. Carlos Willian Leite - E Paulo Coelho é literatura?

 

 

 

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Jean Léon Gérôme (French, 1824-1904)

 - Phryne before the Areopagus