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Álvaro Santi

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Poussin, Acis and Galatea

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Poesia:


Ensaio, crítica, resenha & comentário: 


Fortuna crítica: 


Alguma notícia do autor:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A menina afegã, de Steve McCurry

 

Um esboço de Da Vinci

 

 

 

 

 

 

 

Poussin, Rinaldo e Armida

 

 

 

 

 

Álvaro Santi


 

Bio-bibliografia


Álvaro Santi nasceu em Lajeado RS, em 1964. Graduado em Música e Mestre em Letras pela UFRGS. Lançou em 2004 o ensaio Do Partenon à Califórnia: O Nativismo e suas origens (Ed. da UFRGS), em que investiga o fenômeno poético do Nativismo Gaúcho. É autor dos volumes de poemas Dança das Palavras (IEL, 1998), O primeiro anel (SMC, 1996) e Viagens de uma caneta por meus estados de espírito (UFRGS, 1992), seu livro de estréia que recebeu o Troféu Armindo Trevisan; além de participação em várias antologias. Técnico em Cultura da Prefeitura de Porto Alegre, atualmente gerencia o FUMPROARTE - Fundo Municipal de Apoio à Produção Artística e Cultural. Integrou comissões julgadoras de diversos concursos literários. Colaborou com poemas ou artigos para as seguintes publicações do RS: Revistas "Porto & Vírgula", "Blau", "Continente Sul-Sur" e "Cadernos do IL"; e Jornais "O Informativo do Vale" e "Jornal do Vale". É violonista e compositor, tendo participado de festivais no interior do Estado e feito trilhas sonoras para teatro. É um dos coordenadores do Forum Permanente de Música do RS. Membro da Câmara Setorial de Música do Governo Federal e do Conselho Nacional de Políticas Culturais (a ser implantado em 2006). No momento, prepara um CD com suas composições e conclui seu primeiro texto dramático.


Sobre Álvaro Santi:

 

  • “Viajou bem, tua caneta: os poemas revelam uma poderosa vocação, testemunhada pelo seguro domínio da palavra e por imagens surpreendentes... tens uma grande carreira pela frente!” Moacyr Scliar

  • “Que bom que você escreva tão bem!! (principalmente para nós, leitores.)” Adriana Calcanhotto

  • “Na forma do soneto, por exemplo, o Álvaro é seguramente um dos mais hábeis poetas de nosso tempo e em nossa língua.” Luís Augusto Fischer

  • “Santi escreve admiráveis poemas de amor. O seu lirismo é enxuto, tenso, freqüentemente acerado [...] é mestre em tratar temas sociais sem incidir em chavões populistas ou sibilinas denúncias ideológicas[...] não receia utilizar formas clássicas, inclusive o soneto, do qual obtém efeitos surpreendentes, de alto nível” Armindo Trevisan


     

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Theodore Chasseriau, França, 1853, The Tepidarium

 

 

 

 

 

Álvaro Santi


 

Con anima


Que posso eu cantar de novo?
Salomão já fez os cânticos.
E o Outono, entretanto,
vem cobrando seu tributo:
quer sempre mais e mais frutos.

Sei que o Inverno já vem,
futuro exato, esperado.
Mas eis que brota, entre as pedras,
a mais teimosa das ervas
que nem a neve contém.

E tu, Primavera fresca,
vens inaugurar o espanto
e erguer, com ares de anjo,
novo castelo de vento
sobre as pedras da represa,

em cujas águas contidas
eu me vou banhar agora,
pois é verão. Quem se importa
se haverá outros ou não,
se é de ti que sopra a vida?


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Jean Léon Gérôme (French, 1824-1904) - Phryne before the Areopagus

 

 

 

 

 

Álvaro Santi


 

Lição


Receber água das valas
mais sujas ou das piscinas
azuis, sem diferenciá-las:
é isso que o mar ensina.

Rodear igualmente a lata
de cerveja ou a menina
que nada cheia de graça:
isso também ele ensina.

A gota que se destaca
só por um instante brilha
como que em luz transmutada,
mas pouco do brilho fica
quando volta a ser só água
do mar, que a lição ensina.

Rugir pela madrugada,
assustando as avenidas,
de manhã voltar à calma:
eis o que o mar ensina.


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Riviere Briton, 1840-1920, UK, Una e o leão

 

 

 

 

 

Álvaro Santi


 

Inverno de 85


No inverno de oitenta e cinco,
dezessete anos atrás,
escrevi cartas demais.
O fel vertia da pena
e à noite eu lia Rousseau,
à procura de um sistema
pra meu coração vazio,
onde não cabia o amor.

No inverno de oitenta e cinco,
Mercúrio andava por Gêmeos,
enquanto eu, como prêmio,
aos infernos fui descido.
Confesso que tive medo
de permanecer sozinho
ou me casar muito cedo.

No inverno de oitenta e cinco,
eu escrevi muitas cartas
― ou algumas, já não lembro.
Não sei se ela as terá lido,
se as guardou por algum tempo...
(Será que eu as despachava
ou punha eu mesmo no lixo?)

No inverno de oitenta e cinco,
eu no quarto me escondia.
Só da videira as ramadas,
de toda a vida despidas,
vinham até meu abrigo,
feito esquálidos fantasmas
tentando escapar do frio.

No inverno de oitenta e cinco,
escrevi algumas cartas
― ou terá sido uma só?
Todas prá ex-namorada,
nenhuma para um amigo.
Tudo o que eu tinha era dó
de mim e de meu umbigo.

No inverno de oitenta e cinco,
ou, para ser mais exato,
no solstício desse inverno,
faltei a um aniversário.
E foi meu castigo eterno
esperar cada solstício
anunciar que estou mais velho.

No inverno de oitenta e cinco,
escrevi inúteis cartas,
Travei o mais vão combate:
não encontrei a palavra
mágica que reparasse
um simples mal-entendido.
Era tarde, muito tarde...

No inverno de oitenta e cinco,
queria mudar o mundo
sem conhecer a mim mesmo.
Meio oculto atrás de um muro
(que eram meus longos cabelos),
mesmo assim era bonito,
na opinião de meu espelho.

No inverno de oitenta e cinco,
escrevi também poemas,
para acalmar minhas penas.
Alguns saíram em livros;
outros, como almas penadas,
perambulam pela casa
pedindo que os reescreva.

No inverno de oitenta e cinco,
enquanto eu não escrevia,
conheci outra menina
que me deu algum carinho,
no fusca azul de meu pai.
(Se ela me amasse, mas ai!
nem automóvel eu tinha...)

No inverno de oitenta e cinco,
se é que existiu esse ano,
melhor é ter esquecido
do que nele eu escrevi.
Tudo não passou de engano,
o sol não parou no solstício.
Só no verão fui feliz.

No inverno de oitenta e cinco,
eu tinha cabelos longos.
Porém mais longos e louros
eram os dela, bem sei.
E desde então misturei
algum sangue nos meus sonhos.
E o mais lindo deles todos
morreu: o amor infinito.


 

 

 

 

 

03/08/2006