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Constança Lucas

constancalucas@gmail.com

Riviere Briton, 1840-1920, UK, Una e o leão

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Poesia:


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Alguma notícia da autora, suas pages:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Ruth, by Francesco Hayez

 

William Blake, Death on a Pale Horse

 

 

 

 

 

 

 

William Bouguereau (French, 1825-1905), Reflexion, detail

 

 

 

 

 

Constança Lucas


 

 Há palavras


Há palavras que nos atordoam
e eu gosto de não gostar
neste não saber de ser
de não vender a alma ao diabo
Há palavras que nos tiram paz
longas nas fugas de enfrentar
com gosto de histórias compridas
Há palavras que nos sacodem
num amor perdido no rio
de águas onde a foz é o teu medo
num adeus intenso e morno
Há palavras que nos inventam
nas mais doces cantigas
de sonhos entrançados
nos cabelos livres
que sequer em nada mais crêem
Há palavras que nos beliscam a alma
dizem-nos para desenhar
frenéticos olhares audazes
de ti que calado morres aos poucos
não sei que desejo te impede
Há palavras que nos escrevem as cartas
tristes e fortes, cansadas e doces, perdidas
sonhadoras as mais amadas
em mim, não te quero assim ausente

 

 

 

William Bouguereau (French, 1825-1905), L'Innocence

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Aleilton Fonseca

 

 

 

 

 

 

 

Jean Léon Gérôme (French, 1824-1904), Plaza de toros

 

 

 

 

 

Constança Lucas


 

Porque me dói o coração?


trezentos dias de sonhos
havia eco em todas as letras
fantasias de vogais enamoradas
pelas consoantes mudas
assim de vez o mundo em paz
numa conversa terna, vivida
no encantamento diurno
canta-me ao ouvido,
adormecida sonho
esquecida da vida
dentro do vento misterioso,
inquietas ilusões escritas
num livro de almas, pergunto
porque me dói o coração?

 

 

 

Sophie Anderson, Portrait Of Young Girl

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Francisco Carvalho

 

 

 

 

 

 

 

Jean Léon Gérôme (French, 1824-1904)

 

 

 

 

 

Constança Lucas


 

Natal


Quando era menina bem pequenina, uns 5 anos,
lembro-me de andar a apanhar musgo com o meu
irmão Diogo, tínhamos de o pegar com cuidado
para não partirmos as placas que iríamos
usar para fazermos um presépio em casa.
Tínhamos várias figuras de cerâmica muito
bonitas, uma árvore cheia de bolas coloridas
lembro-me muito de umas azuis, bonecos de neve,
estrelas..., e no jardim os pinheiros também
recebiam enfeites. A casa cheirava a filhoses
e rabanadas, biscoitos e geléia de marmelo.
Rituais que se cumpriam para dar continuidade
aos fazeres coletivos mais genuínos, acreditava-se
que era um tempo de maior alegria e que a humanidade
viveria em Paz para sempre.
A nossa casa irradiava luz, cheia de varandas
e janelas, sempre a cheirar bem. As prendas eram
importantes e assim eu fiz cordões de crochê
para todos, tinha acabado de aprender a fazer
crochê e partilhava esse conhecimento com todos
os que me rodeavam, mesmo o nosso cão recebeu
nova coleira de crochê, todos ficaram com a
minha renda e eu feliz.
Era inverno e as roupas quentes, sempre havia
novas roupas nessa época, blusas de lã colorida,
meias quentinhas, ficou-me na memória uma saia
cor de laranja com um peitilho cheio de atilhos
complicados de arranjar mas era linda jorrava
sol por todos os poros. O meu gorro amarelo
com cachecol atrelado foi companheiro
de muitas aventuras.
Acompanhar a azafama dos preparativos era muito
mais divertido, quebrar nozes e amêndoas no
quintal, com os meus irmãos, comia parte delas e
quando os adultos me perguntavam quem tinha comido
eu respondia que tinha sido o homem invisível.
Gostaria que todas as crianças tivessem a infância
que eu tive, protegida e com alegrias.
Hoje o Natal poderia ser um momento de confraternização,
pela paz no mundo, um momento de reflexão
e de esperança.

 

 

 

Da Vinci, Madona Litta_detalhe.jpg

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Weydson Barros Leal

 

 

 

 

 

 

 

 

William Bouguereau (French, 1825-1905), Reflexion, detail

 

 

 

 

 

Constança Lucas


 

Esperança


Comecei dezenas de vezes
não que não soubesse contar,
as palavras nos caminhos
de ouvidos e olhos dispersos,
voltadas para o rio,
treinei o esquecimento
nas sílabas sem resposta,
apaguei os jornais por dias
fiquei sonâmbula por meses
sem saber quantas almas
em mim viviam, sem calma
nas minhas paisagens
as que mais sonhei ou desejei
inventadas por anos
sem saber o que sentir
vou lendo as cartas dos mistérios,
nunca nada tem sentido,
crio-os por dentro e solto-os
os sonhos, existem na vida
a correr dentro de mim
como as águas procuram o mar
no desenho de quem respira
no vento adormecido
que nos leva no sono,
nem sempre somos iguais
ao nosso canto, por isso
comecei dezenas de vezes
a adormecer no colo
da esperança


 

 

 

William Bouguereau (French, 1825-1905), L'Innocence

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Aleilton Fonseca

 

 

 

 

 

06/09/2007