Emerson Damasceno
Espasmos. É essa a conclusão a que chego em meio às
divagações noturnas do último dia do ano. As reminiscências do passado me provam
de forma insofismável que somos pequenos átimos de luz na história. Percebo que
um punhado de anos são somente dias atrás. Fatos acontecidos há algumas décadas
parecem-me semanas apenas. Tudo tão vívido e próximo. Imerso nessas reminiscências
nostálgicas. Vidas que transcorrem em alguns meses. Frágil tempo, o que dizer-lhe
colosso? E nessa ode ao passado morto, tão vivo, eu pensava nesse diletantismo
notívago, o que dizer sobre o tempo. Eis que recordo da ímpar poesia de Soares
Feitosa, mentor do instigante “Jornal de Poesia” amigo e poeta. Um cronômetro
para piscinas, onde percebo que a arte liberta! Talvez mais do que o desabrochar
dos grilhões que nos solapam os devaneios. A arte materializa o encontro que não
tive, os caminhos que não percorri, este beijo que eu não te dei. Nesse ambiente
cujo ilogismo é concreto, o tempo se arrasta sofregamente. Um cronômetro para
nossas vidas, o tempo nem sempre rege a razão no que a arte não lhe permite. A
arte não cria, apenas materializa ao agregar letras, a dor lancinante do poeta.
E dor é também o prazer infinito, como diria Schopenhauer. E percebo que quando
o Poeta Feitosa estava a agrupar as letras que deram causa a “Um cronômetro para
piscinas”, no alfarrábio de sua escrivaninha, trazia consigo um sorriso nos
lábios, murmurando à cumplicidade alguns arremedos que lhe ditava o Coronel,
que balançava-se sentado na cadeira de balanço ao seu lado. E quando lhe
faltavam palavras era ajudado pelos seus cúmplices de poesia. E vejo que o
Poeta fazia do imaginário esse mundo maravilhoso que só a arte liberta. Assim
vivemos no Século Cem de Ésquilo. E agora enquanto digito estes últimos suspiros
de palavra, o Coronel me chega e brada, açoitado com a paráfrase – eu ousaria
chamar licença poética – desautorizada, um plágio esdrúxulo dum fato que nunca
se deu, mas antes que puxe o gatilho da Lugger que sacara da bainha dos algozes
da cultura, ele sorri com os lábios cerrados e me diz: “É, doutor, só mesmo a
Arte, só ela...”.
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