Mais de 3.000 poetas e críticos de lusofonia!

J. B. Sayeg 

+SP, SP, 28.07.2007, 73 anos

Poussin, The Exposition of Moses

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Poesia:


Ensaio, crítica, resenha & comentário: 


Fortuna: 


Contos:


Alguma notícia do autor:

Escritor, poeta e ensaísta. Livros publicados: Permissivo Amor (1978), Os Comedores do Museu (1989), Cavalos ao Sol (1982), e Pantomimas e Animação (1989), todos de poesia. Pertence ao Clube de Poesia, de São Paulo e à UBE - União Brasileira de Escritores. É advogado, formado pela USP (Faculdade de Direito do Largo São Francisco). Colaborou em várias Revistas e Jornais. Três livros inéditos, de contos, de poesias e um ensaio sobre "Poética". Aparece em verbete no Dicionário da Literatura Brasileira, de Afrânio Coutinho, e tem poesia publicada na antologia Savramena Poezija Brazila (Antologia da Poesia Brasileira - 1987, versão para a língua da ex-Iugoslávia). Faleceu em SP, capital, em 28.07.2007

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A menina afegã, de Steve McCurry

 

Franz Xaver Winterhalter. Portrait of Mme. Rimsky-Korsakova. 1864.

 

 

 

 

 

 

 

 

Delaroche, Hemiciclo da Escola de Belas Artes

 

 

 

 

 

J. B. Sayeg



 

Máquina de fazer gorgeio

 

Eu já te disse

ele é um passarinho lento

toda manhã em nossa janela,

não lhe preste qualquer atenção,

para não criar nenhuma dependência,

pois um dia ele se acabará

como tudo nesta cidade se consome,

sobretudo, quando se sabe,

não é um pássaro,

mas um brinquedo de corda,

proferindo-se a senha,

um estranho gorjeio

sai do mecanismo

querendo comunicar-se,

toda a vez que se vira a manivela.

 

 

(Pantomimas e Animação, 1989)

 

 
 

Olhos de um melro

 

Os olhos mecânicos do melro

eram as únicas coisas que se moviam

na sala. O quadro de Paul Klee desenhava

movimentos de um anjo,

eram movimentos eternos, insatisfatórios

porque não eram efêmeros resolúveis

numa fração de segundo. Os olhos porém

eram ágeis, falavam, escutavam, eram olhos

indagadores. Eu mesmo me imobilizei apavorado

perante aqueles movimentos rápidos e impacientes.

 

Sentei-me na cadeira de grande espaldar

defronte à escrivaninha. Dobrei a página,

deixando o marcador indicando-me a leitura

interrompida. Os olhos se detiveram,

por um instante. A seguir, desesperadamente

recomeçaram seus inteligentes movimentos.

 

 

                     (Pantomimas e Animação, 1989)

 

 

 

No tempo do forte verde

Na sala de jantar

um pouco acima

da cristaleira

o capacete da revolução.

E bem ao lado da terrina

de louça clara adornada

com frutos levemente esmaltados

o pente de balas de fuzil

espetava o dourado ocre do metal.

Foi quando olhei para a rua

e uma bandeira inflava levemente

ao ruflar de longínquos tambores.

Outra vez olhei para o interior

onde as mulheres costuravam.

Pude constatar que o verde

realmente era uma cor

muito forte.

 

 

                             (Cavalos ao Sol, 1982)

 

 
 

Clangor

 

Mundo em guerra

poesia quieta.

Os poetas andam

de bicicleta

não em suas pode

rosas máquinas

voadoras.

 

Vida inquieta

com sider

al all dreams

without lider.

 

A ciber (n) ética

ser / vindo

o homem a ser.

 

Vil medo

a dúvida do viver.

Para onde dirigir

o raio do laser?

 

 

 

                            (Permissivo Amor, 1978)

 

 

 
 

O velho

O velho disse vamos

vamos voltar para casa

mas você já está em casa

lhe disse a mulher, gentilmente,

vamos voltar para casa

falou o velho de novo

e entrou com lucidez

no mundo de sua velhice.

 

 

                   (Os Comedores do Museu, 1979)

 

 
 

 

 

 


 

 

 

 

 


 
 
 

 
 
 

 

 

 

 

 

 

 

Poussin, The Nurture of Bacchus

 

 

 

 

 

Caio Porfírio Carneiro



Marigê, me chame o Sayeg

 

Faleceu, no dia 28 de julho, nesta capital, aos 73 anos, o poeta, escritor e advogado João Baptista Sayeg. Nascido em Catanduva (SP), dividiu sempre sua vida entre a banca de advocacia e as letras, e foi ativo membro da União Brasileira de Escritores.

Poeta primoroso, e também excelente contista, Sayeg, como o tratávamos, era um virtuoso em tudo o que escrevia, até em trabalhos jurídicos. Um perfeccionista. Tudo o que escrevia examinava com atenção cuidadosa, mostrando-se até um pouco irritante aos que não o conheciam de perto. É que, para ele, tudo tinha de ter um lavor de Arte.

Traduziu vários poetas americanos e ingleses.

Publicou em Poesia: Permissivo Amor; Os Comedores do Museu; Cavalos ao Sol; Pantomimas e Animação.

Em 1999 lançou o livro de contos A Torre de Mandarino, verdadeira surpresa no gênero. Aparecia como uma ficção a um tempo impressionista e mágica, limpidamente bem escrita, histórias às vezes trazidas dos idos vividos em Catanduva, sem cair, porém, na memorialística. O descritivo e o narrativo muito bem conduzidos.

Enveredou pela literatura infantil, com tanta emoção, que ele próprio tratou, com cuidado de artista, da parte artesanal. Único livro que publicou no gênero, intitulado.

Diretor e Conselheiro da União Brasileira de Escritores em várias gestões, sucessivamente, desde sua entrada para a entidade, em 13/12/1976, recebendo número 919. Participou de diversos eventos culturais, inclusive dos Congressos de Escritores no Brasil e em Portugal. Nas décadas de 70 e 80 integrou o grupo da Revista Escrita, editada por Wladir Nader, e participou de várias comissões julgadoras em concursos literários. Aparece com trabalhos ou verbetes em diversas antologias e dicionários literários, inclusive na Antologia de Poesia Brasileira Contemporânea, editada em Portugal, organizada pelo poeta Álvaro Alves de Faria, em 2001.

Dado ao seu espírito empreendedor, em tudo que participava fazia com muita paixão e zelo. A reforma dos estatutos da UBE mereceu da sua parte permanente preocupação, para bem adaptá-lo às normas do Código Civil Brasileiro.

Eleito coordenador da equipe que escreveria a história da UBE desde a sua fundação, em 1942, sessenta e dois anos, portanto da sua história,  quando viu que a comissão, por motivos vários, não se articulava bem, chamou-me para ajudá-lo, tomou o pião na unha, e partimos para uma aventura, porque  foi uma verdadeira aventura elaborar o livro, que a vida da entidade vinha de muitas realizações, lutas políticas, divisões e desentendimentos, provocando, com isto, um verdadeiro trabalho de formiga para deslindar ou quase decifrar, nos arquivos desorganizados, e descobrir nos diversos cartórios, todo o palmilhar da UBE. Sem falso exagero, tarefa dificílima, que nos tomou meses e meses de trabalho e fins de semana de insônia. Pronto o livro, editado pela RG Editores com o título por ele sugerido de A Vocação Nacional da UBE (62 anos), com algumas falhas, é verdade, falei para o Sayeg de algumas críticas injustas ao livro, particularmente de dois ou três sedentos de louvores, e que eu iria responder diretamente a cada um. Ele, com aquele espírito conciliador, mas determinado, respondeu: “Calma, Caio. Não dá bola. Daqui para frente outra história da UBE só será feita a partir desta. E vamos rever o livro daqui a cinco anos”.

Não há como traçar aqui, em apanhado curto, sobre a vida do amigo e do artista J. B. Sayeg. A amizade interfere demais. E ainda me parece um sonho o seu falecimento. Praticamente tudo o que eu escrevia mostrava para ele, e ele não era “bonzinho”, não. Sem ser ferino, lia, relia, argumentava, sempre à procura da perfeição artística, nele e nos amigos. Mas nunca se aborrecia, se malhávamos alguma coisa dele. Dizia apenas, com aquele meio riso: “Vocês são analfabetos mesmo... fazer o quê...?”.

Colaborou, desde a sua fundação, com o jornal literário Linguagem Viva, com poemas e comentários.

Deixou praticamente prontos para publicação um novo livro de poemas e um de contos e falava na reedição de Pantomimas e Animação, revisto e modificado. E sempre que me encontrava, lá vinha a bomba: “Prepare-se que vamos rever toda a história da UBE...”

Dominava bem o Espanhol, o Inglês, o Francês, e conhecia profundamente a poesia brasileira, desde os seus primórdios. Relia Camões e os clássicos e estava sempre atento e em dia com tudo o que, sobre o gênero, se escrevia no País.

Advogado de profissão, tendo se aposentado como chefe do Departamento Jurídico da Avon, e com bom escritório montado, era, em tudo, para além do jurista, o intelectual e o artista.

Casado com a poetisa Marigê Quirino Marchini, deixou filhos e neto.
E foi trágico quando eu soube da sua morte. Telefonei para a Marigê, sábado, logo cedo:

– Marigê, me chama aí o Sayeg. Quero falar com ele sobre as modificações que estamos fazendo nos estatutos da entidade.

A resposta quase me fez cair da mão o telefone:

– Caio, o Sayeg acabou de morrer...
 



Caio Porfírio Carneiro é escritor, crítico literário e secretário administrativo da União Brasileira de Escritores.

Caio Porfírio Carneiro

 

 

Um cronômetro para piscinas

Início desta página

Conceição Paranhos

 

 

 

 

 

 

20.10.2007