Mais de 3.000 poetas e críticos de lusofonia!

Paulo Gadelha

 

Thomas Colle,  The Return, 1837

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Ensaio, crítica, crônica, resenha & comentário: 

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Ruth, by Francesco Hayez

 

William Bouguereau (French, 1825-1905), L'Innocence

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Mais de 3.000 poetas e críticos de lusofonia!

 

 

 

 

 

Um esboço de Leonardo da Vinci, página do editor

 

 

Paulo Gadelha

 

 

A dama da literatura

 

Clarice Lispector, a ucraniana dos olhos da cor de poesia, fez-se brasileira pela emoção criadora, sensibilidade humana e amor à nossa história.

Aqui começou o seu mundo literário, nos idos de 1942, quando escreveu o seu primeiro romance – Perto do Coração Selvagem -, pela editora, à época da moda, A Noite, tendo apenas 23 anos de idade.

Agora, em plena Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), foi a grande homenageada do evento.

E não poderia deixar de sê-lo.

É que, durante a liturgia da festa, a obra desta brasileira nascida na Ucrânia recebe as homenagens da consciência literária mundial.

Dois ensaios – Aprendendo a viver e Outros escritos – ambos editados pela Rocco, foram lançados.

São textos de Clarice Lispector, ainda inéditos.

É verdade – e não vai nisso nenhum segredo de polichinelo – Lispector teve sóbria, elegante e afirmativa participação na formação da consciência feminista do Brasil.

Uma libertária com as limitações de estilo. O discurso administrado pela razão. A emoção contida pela estética.

Ou como muito bem conceituou o crítico literário Jerônimo Leite, no ensaio que publicou com o título de O Lado B de Clarice, quando lembrou que “tampouco tinha a inclinação ou o rigor argumentativo para se tornar uma teórica da emancipação feminina, como o foram a inglesa Virgínia Woolf e a francesa Simone de Beauvoir”.

Dona de uma soberba força intimista, foi, sem exagero algum, a grande dama da literatura brasileira.

De fato, a nossa maior escritora.

Do seu vasto artesanato literário, uma verdade lhe orna o talento: a liberdade de pensar e escrever.

E, sem subterfúgios, ela o confessa solenemente, quando diz que “liberdade é pouco. O que eu desejo ainda não tem nome”.

Depois justificando o ato e o instante de escrever, afirma coerente: “Eu escrevo como se fosse salvar a vida de alguém. Provavelmente a minha própria vida. Viver é uma espécie de loucura que a morte faz. Vivam os mortos porque neles vivemos”.

Sem dúvida, o testamento literário-existencialista da dama de ferro das letras nacionais.

Como ela viveu e escreveu.
 

Direto para Clarice

   
 
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

John William Godward (British, 1861-1922), Belleza Pompeiana, detail

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  

 

 

 

Paulo Gadelha

  

 Quintana: cem anos de ironia poética

 

Deu à sua vida o mesmo destino que a poesia lhe deu: liberdade, sensibilidade, solidariedade, espírito público e humor sadio.

Seu nome: Mário Quintana. Profissão: poeta dotado da mais fina ironia.

Para homenageá-lo, nos seus cem anos, garimpei o seu primeiro livro, “A rua dos cataventos”, e, de logo, anotei a sua declaração de amor existencialista: “Minha morte nasceu quando eu nasci”.

No verso, trocadilho à parte, a verdade brincando de vida e morte.

Aliás, um gênio que nunca se deixou queimar na fogueira das vaidades.

Só, sempre só, morou toda a sua existência em hotéis.

Um dia, a pousada, onde residia, foi vendida para se transformar em elegante condomínio, e ele, obviamente, despejado dos seus aposentos.

Ante tal paisagem, nenhum instante de irritação, nenhuma ruga na testa, solene e tranqüilo, sentenciou: “Não tem importância, moro dentro de mim”.

Depois, todo o seu vasto arsenal poético foi construído com impagável sinceridade.

Ele, sem dúvida, sonetizava o que a sua alma lhe ofertava.

Um fiel operário de sua inspiração.

É dele, pois, a exaltação de sua verdade intelectual: “Meus poemas são eu mesmo, nunca escrevi uma vírgula que não fosse uma confissão”.

Como todo literato consagrado, Quintana, logicamente, fitava os Andes da literatura brasileira.

Sonhou em ser imortal da Academia Brasileira de Letras.

Por três vezes, o sonho se fez pesadelo.

A frustração, em não ser membro da Casa de Machado de Assis, inspirou-lhe um dos versos mais alegres do cancioneiro poético nacional, quando fustiga, sem rancor, os que o derrotaram: “Todos esses que aí estão / atravancando meu caminho, eles passarão.../ eu passarinho”.

Imortalizou-se na memória e no respeito do povo brasileiro.

Hoje, em Porto Alegre, o Hotel Majestic, onde morou durante 12 anos, é a Casa de Cultura Mário Quintana, que recebe, por mês, cerca de 50 mil pessoas.

Certa feita, perguntado o que achava das estátuas em bronze, ele respondeu, preocupado, que “um engano em bronze é um engano eterno”.

Errou o grande vate.

Na Praça da Alfândega, na capital gaúcha, existe uma estátua em bronze do autor de “O aprendiz de feiticeiro”.

Não houve engano. É a história consagrando, em bronze, a poesia de um rouxinol telúrico chamado Mário Quintana.

 

   

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 4.4.2009