Rita Brennand

A máscara


Em todas as minhas manhãs,


acordo a máscara primeiro.
Sem ela, agrido meu companheiro,
seja ele quem for.


Uso a máscara com consciência,
com espanto, com tanta dor!


Mas a máscara que uso não consegue


encobrir o brilho dos meus olhos.
Ainda ontem, quando vi o caroço do abacate


brotar...
a boca da máscara consentiu
que a minha boca, quase a sussurrar:
Pai amado,
quanta grandeza!


E a máscara que uso por um instante,


desfeita,
banhada de sol,
transformou-se,
e a face que, há muito tempo, eu não via,


a minha face sorria.


É que o brilho dos meus olhos


a máscara que uso encobria!
 

Rita Brennand, Inocência de um olhar

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Rita Brennand

Cérebro @ estômagO


O pensamento vai
do cérebro ao estômago;
se leve e azul é a imagem


que no cérebro habita,


dentro da musculatura
lisa, como na maré baixa,
há apenas mansidão de areia
molhada pela renda fina
da vaga sonolenta.


Mas, se, crispados, explodem
vagalhões roliços, emprenhados,
e toda a praia treme e, no cérebro,


endoidecidos pensamentos
se agitam, em convulsões
sem ritmo, o estômago se
ressente, e o músculo que
era liso é agora punho fechado.
Para defender, se, grita,
e, num rasgo de liberdade,
explode, vomita.
 

Rita Brennand, Tão escuro em mim!

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Rita Brennand

Chove a cântaroS


Esságua que sou mareja
pelos poros das paredes
de lodo verde.


Esságua que sou explode
por uma fenda de rocha.
Despenco e, por instinto,
procuro, ávida, os caminhos
dágua salgada.


Guerreira, água,chumbo,
estilhaço no alto o surdo
ribombo do meu poder.
Inevitável choque. Como
um espetáculo
de ziguezagues mortíferos,
desabo, aguaceira que sou,
com a sensação de entrega,
e gozo, embebida na doçura
da terra sedenta de mim,
que juntas parimos a vida.
 

Rita Brennand, Olho Útero

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