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Rita Brennand


 

MimetismO


Essa argila de que tu és feito
penetrou em meus poros.
E, ultrapassada a pele,
friccionado o nervo,
de que mais precisarias?
Eu era teu instrumento,
e a minha imagem eu te fazia
embalada na tua vontade.
Moldei teu corpo,
lancei-te a pino pro alto
Tal qual Sol de meio-dia.


Meu sangue no teu corpo introjetado,
teus nervos e os meus
em sintonia.
Com teus olhos, eu vi
um mundo cansado.
Com meus olhos, percebeste a fantasia?


Esta argila de que sou feita
penetrou no mais profundo do tempo,
do tempo sem tempo do infinito.
E, porque sou uma vontade, quero, decido.
E, como se fosse um nó de laço, desfaço
o momento delírio!
E uma calma de fim de martírio
me penetrou. Te largo, me afasto.
Tu és. Eu sou.
 


 

Rita Brennand, O olhar de velhas árvores

Rita Brennand, O olhar de velhas árvores

 

 

 

Da Vinci, La Scapigliata

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Maria Azenha

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Thomas Cole (1801-1848), The Voyage of Life: Youth

Rita Brennand


 

Minhas RaizeS


Quando eu nasci, aninharam-me,
aninharam-me em berço pintado de verde.
Até que enfim, veio menina !
Respirei pela vez primeira
ouro e verde.
Nasci brasileira e nordestina !


Na casa do engenho com nome de santo,
(santo pobrinho!)
São Francisco!
minha vó Francisquinha,
minha mãe, Francisca,
me deram o nome de minha
Dindinha: Rita.
Nome forte como madeira
de que cupim não gosta.


Da janela do engenho só se via
o lençol verde do canavial.
O sobrado, tem tanta história!
Cada janela é um olho.
Quantos olhos dali, já olharam!...


Agora é a minha vez,
porque aqui nasci.
E é daqui o meu começo,
aqui finquei raiz.


Me criei asas e olhos.
E de onde eu estiver,
arribo de novo neste quintal.
Me sonho de novo nessa varanda,
me molho do cheiro
dos tachos de doce,
da manhã morna,
do gosto da brisa;
revejo os bichos caseiros,
os embuás, as lagartixas,
os sapos, as caranguejeiras,
besouros e formigas...


Passarada mangueiras
pitangas cajás cajueiros


É daqui desse engenho, na Zona da Mata,
do engenho São Francisco,
que escorro de mim
meu caldo de cana caiana,
meu refresco de pitanga,
meu sumo de caju.


Agora é a minha vez,
porque aqui nasci.
É aqui o meu começo.
Aqui finquei raiz!
 


 

Rita Brennand, O luar em meu olhar azul

Rita Brennand, O luar em meu olhar azul

 

 

 

Octavio Paz, Nobel

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Lucas Tenório

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Alessandro Allori, 1535-1607, Vênus e Cupido

Rita Brennand


 

MomentO


É madrugada, ela pinta com o pensamento,
a tela é o espaço diante de seus olhos.
Pisa o verde; entra no palco, onde
os ecos da passagem de cavalos
ainda estão presentes.


Um deles volta, como para cumprir
mais um prazer: o de ser
visto e desejado.
Os olhos se encontram,
olhos conspirantes,
olhos desejantes.


Harmonia, de bichos.
Êxtase de olhos nos olhos,
de afetos,
de potência.


Acabo de pintar o prazer!

 

 

Rita Brennand, O olhar do SOL nos Jatobás

Rita Brennand, O olhar do SOL nos Jatobás

 

 

 

Frederic Leighton (British, 1830-1896), Antigona

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Irineu Volpato