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Rubenio Marcelo lança novo livro
Vias do Infinito Ser
Aconteceu em Campo Grande, na noite de 16/05/2017, em concorrido
evento no Teatro Prosa do SESC Horto, o lançamento oficial do
novo livro de poemas de Rubenio Marcelo: “Vias do Infinito Ser”,
publicado pela Editora Letra Livre. Com aprovação do FIC-MS, a
obra possui apresentação do prof. Paulo Nolasco (doutor em
letras) e prefácio do crítico literário e poeta José Fernandes
(prof. e doutor em letras), que assim afirma num trecho: “O
livro ‘Vias do Infinito Ser’ se compõe de uma poesia profunda,
marcada por forte dimensão metafísica, como requer a concepção
de infinito a que o ser tem de conquistar durante a existência.
Para isso, o jogo poético, tal como o existencial, se executa
entre o finito, o concreto, o físico, e o essencial, abstrato,
metafísico, infinito. Em decorrência, a leitura de cada poema
não pode ser feita em uma sentada, mas sorvida mediante várias
leituras, a fim de que se possa mergulhar na essência mesma da
poesia e no sublime que ela Já o poeta e membro da Academia Brasileira de Letras, Antonio Carlos Secchin, timbra na orelha/aba do livro: “Na poesia de Rubenio Marcelo, em vez de o ser humano habitar o cosmo, é o universo que reside no homem. Tudo emana da força da poesia, e é com essa luz de dentro, deflagrada pelo poder do verbo, que subitamente as coisas ganham forma e novo sentido. Como se lê em um de seus poemas, “palavras saltam muralhas e viram estrelas”.
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[Prefácio do novo livro de Rubenio Marcelo] por: José Fernandes
O ser, em sentido metafísico, está sempre em viagem. Viagem do nada para o tudo, do nada para a essência. A busca da essência implica, também, a busca do infinito. Não que se chegue a ser infinito; mas que, em sentido lato, o alcance por si mesmo ou por outros meios, por outras formas de o homem se essencializar, no verdadeiro sentido metafísico. Como nenhum ser, a não ser Deus e os números, define-se realmente como infinito, uma vez que se é dominado pelo finito, resta ao homem a única forma, em nosso entender, de se aproximar do infinito: a linguagem, mormente quando criação do poético, no sentido do sublime, de superlativo do belo. Na poesia, o jogo que se efetua entre o finito e o infinito, além de relacionar-se com a linguagem, pode efetuar-se entre os elementos que compõem o poema, como verificaremos na tessitura de Vias do infinito ser, de Rubenio Marcelo. O vocábulo Vias aponta exatamente para a viagem que o ser lírico empreende por dentro de si mesmo e por dentro da linguagem. Além disso, como se lhe segue a palavra infinito, que antecede ao ser, fica claro o sentido de conquista, de passagem que, se não acontece per se, pelo menos se tenta. Por isso que o poema de abertura do livro se intitula ‘Prenúncio e inquietação do real’. Inquietação, porque o poeta, para obter o efeito poético, joga com dados abstratos e concretos da realidade. Basta ver o sentido do vocábulo vago como qualificativo de olhar e, indiretamente, de euforia, a mostrar o caráter aparentemente indefinido do ser que olha. Por outro lado, esse vago olhar contrasta com a semântica concreta de mobília imóvel colocada na antessala do cotidiano, como a mostrar as dimensões finita e infinita de quem capta o real. Esse jogo entre o abstrato e o concreto, ou entre o finito e o infinito, se adensa na segunda estrofe, onde a percepção, tato, flerta com a alforria, ou seja a criatividade do poema, que se erige. Se o tato é concreto, a torre dos segredos, além de apontar para o abstrato, ainda se correlaciona com o infinito, com o sublime, próprio da poesia. Não o fosse e não se realizaria ante rodízio de sortilégios, de mistérios que envolvem a linguagem, nesse jogo de real e imaginário, de forças que se complementam na viagem do poema e do ser ao infinito. Esse processo se adensa na terceira estrofe, no verbo dinamizando-se e, sobretudo, em dinamitando-se, significativamente colocados entre colchetes para elevar-lhes a semântica e, sobretudo, para mostrar o poder de destruição-construção por eles impressos. Exatamente por isso dinamita-se, não qualquer coisa; mas o ranger de dentes do silêncio, elemento sobre que esse poema, e toda a poesia, se erige. Por isso, o silêncio/pode amanhecer no inverso do espanto..., porque ele nega e afirma a um só tempo a mensagem do poético. A prova desse fazer-se poemático de silêncio e no silêncio se confirma pela busca da reinvenção, tarefa insana a que o poeta se propõe ao recriar o belo estético. Assim, impera, na elaboração do poema, a brusca extravagância/ entre a arma e a alma do resíduo assíduo/ que de(s)cora o espelho do tempo... O papel da arte, segundo essa concepção de infinito, é vencer o tempo. É por isso que a habitual inquietação/ completa seu curso, uma vez que o fazer-se do poema vai além de sua composição, à medida que envolve o leitor e o hermeneuta que o estuda. Assim, os dois últimos versos se destacam, compondo uma estrofe, já que a inquietação resulta do silêncio que compõe todas as partículas do poema, por isso dinamitado. Essa disfarçada metalinguagem, obtida mediante o jogo entre o real e o imaginário, ou entre o finito e o infinito, evidencia-se na composição do poema que dá nome ao livro: Vias do infinito ser. Sem a ordem do dia do sobrenatural não haveria a natural ordem das coisas da noite...
da noite para o dia silentes instantes tornam-se eternos...
do dia para a noite palavras saltam muralhas e viram estrelas...
instantes e estrelas conhecem os refúgios do tempo mas desentendem a quietude das pedras e a saga dos pássaros translúcidos do sétimo céu...
por via das dúvidas há vias de certezas que nos desafiam a percorrer in/conscientemente e em perfeita claridade a via láctea e o infinito do nosso ser... Destarte, na primeira estrofe contrasta a ordem do sobrenatural com a ordem do natural, ou seja o infinito e o finito, quer na composição do poema, quer na conquista da essência. Deste modo, a atividade lúdica que leva o poema a revelar e a esconder se clarifica na ordem/ das coisas da noite, que é sombra e escuridão que tem de ser vencida para que se obtenha o verdadeiro poema e o verdadeiro ser em sua viagem de infinito. Essa interpretação se aclara na segundo estrofe, quando os instantes/ tornam-se eternos. Eternos na conformação do poema, à medida que ele, o poema, dialoga com o ser, e na viagem do ser ao infinito, que se concretiza na linguagem e na conformação da essência que se vai conquistando através da existência e, sobretudo, mediante a transformação em poesia, através das imagens. Não sem razão, portanto, do dia para a noite/ palavras saltam muralhas/ e viram estrelas, uma vez que, no poema, a palavra salta da luz às trevas, e, das trevas à luz, transpondo obstáculos, a fim de se converterem em estrelas, ou seja, a fim de adquirirem brilho próprio na dimensão do infinito. Por consequência, na quarta estrofe, instantes e estrelas/ conhecem os refúgios do tempo e desentendem/ a quietude das pedras/ e a saga dos pássaros translúcidos/ do sétimo céu, realizam, concretamente, o percurso entre o infinito e o finito, entre o ser e sua essência nessa viagem essencial de homem e poesia. Como a viagem do infinito ser é um processo constante e não concluído, está-se sempre em vias, na estrada ou na dependência dos limites impostos pelo finito. Por isto, há também as vias da certeza e dos desafios a percorrer in/conscientemente, porque há a lucidez da luz e da sombra do finito, para se chegar à perfeita claridade da via láctea e ao infinito/ do nosso ser... Para materializar esse processo, em que se viaja do concreto ao abstrato, do finito ao infinito, a composição do poema joga com objetos concretos, no caso desse poema, pedras, e com elementos abstratos, como sétimo céu. Vemos, deste modo, o poema fazendo-se de realidade e de imaginário, de matéria e de substância de ser. Esse procedimento se confirma no poema ‘Falésias’, em que o poeta, além de jogar com esses elementos, afirma, mediante clara metalinguagem, a construtura de seu discurso poético, como se o próprio texto nascesse das falésias. Não o fosse e não diria que na solitude das falésias falou com suas falanges. Falou, porque é na solidão que se fala consigo mesmo, como é no concreto que se constrói o abstrato. As falanges, sem dúvida, são a própria poesia, em que o ser dialoga com a própria essência, porque erigida na paz com o corpo, elemento concreto em que o abstrato se sustenta. Justamente por isso, Inda sangram naqueles rubros paredões/− beijados de sal e sol ─/ os talismãs do primeiro verso..., em que o imaginário e o abstrato se encontram nas reticências que os estendem ao infinito. Esse recurso estilístico-semântico inerente à tessitura do poema e da obra se evidencia na sequência da segunda estrofe, notadamente no azul do silêncio do (...) olhar menino. Se a cor azul carrega o simbolismo de devaneio, próprio do ato de poetar, o olhar menino simplesmente o materializa, à medida que são próprios da infância a imaginação e o imaginário, o concreto e o abstrato, o físico e o metafísico. Não bastasse essa verdade, o silêncio do olhar menino ainda se liga a três pontas de vela e a milhões de sonhos, como a expandir o abstrato, o infinito, uma vez que todas essas imagens remetem para o imaginário. Não fossem suficientes essas imagens, a elas ainda adere o fato de apontarem para mar e mitos, que são o infinito sendo. O mito se confunde com o imaginário, à medida que ele encerra toda capacidade imaginária do homem em criar figuras que se colocam além da matéria, além do finito. Para mais solidificar seu método de elaboração do poema e do livro, o poeta Rubenio Marcelo se refere ao abstrato como elemento indispensável no contraponto com a realidade, com o finito, a fim de se chegar ao infinito, pois os sortilégios não podem/ prescindir do verde cio das manhãs/ nem das lágrimas do tempo faminto... O tempo, ao mesmo tempo em que destrói o finito, constrói o infinito, como bem o substantivam as reticências que fecham o último verso dessa estrofe. Além disso, o tempo se liga aos mitos, à medida que ele é, na estrutura dos mitos, o responsável pela sua repetição e pela sua atualização infinita, enquanto tempo houver. Justamente por isso que a súmula dos ais do ser lírico não está gravada em litogravuras; mas em linguagem, à medida que ela é que revela o ser e lhe permite estender-se ao infinito e vencer o tempo. Essa consciência de se erigir uma obra pautada por uma forma determinada, concreta, para se obter um conteúdo, uma mensagem metafísica, através da linguagem, é observada em grande parte dos poemas. Assim, ao mais navegarmos pelos seus poemas, encontraremos ‘Poema de dezembro’, em que o poeta, à semelhança do que vimos no poema anteriormente analisado, deixa claro que o processo, em que o físico e o metafísico se digladiam para o ser lírico seguir sua jornada rumo ao infinito, porquanto a palavra não se cansa/ ante o verso fugidio/ renova-se/ pois se nutre de silêncio/ e de ausências... Até estrutura visual do poema materializa o procedimento, como o comprova o fato de o verbo renova-se constituir-se um único verso, a fim de colocar nele essa carga semântica especial, e as reticências que fecham o poema, à medida que elas são a presença da ausência. Presença, porque vistas fisicamente, e ausência, porque deixam a mensagem em suspenso, a fim de que o leitor continue lendo além das palavras, além das imagens que transformam a essência das palavras, porque aproximam o significado de realidades que, muitas vezes, sequer se tocam. Observamos, deste modo, que o livro ‘Vias do infinito ser’ se compõe de uma poesia profunda, marcada por forte dimensão metafísica, como o requer a concepção de infinito a que o ser tem de conquistar durante a existência. Para isso, como fica bem claro pela estrutura dos poemas, o jogo poético, tal como o existencial, se executa entre o finito, o concreto, o físico, e o essencial, abstrato, metafísico, infinito. Em decorrência, a leitura de cada poema não pode ser feita em uma sentada, mas sorvida mediante várias leituras, a fim de que se possa mergulhar na essência mesma da poesia e no sublime que ela encerra. A viagem pelo poema, deste modo, assemelha-se à viagem do ser em busca do infinito. Tem de ser executada passo a passo, porque nunca se lê um poema uma única vez. Resta-nos, neste momento, parabenizar o poeta Rubenio Marcelo por nos brindar com essa poesia física e metafísica, essa poesia marcada por imagens que transitam entre o real e o imaginário, entre o concreto e o abstrato, porque sorvida nas vias do infinito ser.
José Fernandes Crítico literário, poeta, membro da Academia Goiana de Letras. Doutor em Letras pela Universidade Federal do RJ
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