Francisco Carvalho

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Nauro Machado

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Ledo Ivo

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Culpa

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Ricardo Alfaya

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Thiago de Mello

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Nei Duclós

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Vicente Franz Cecim

 

 

 

 

 

 

Rubenio Marcelo

 


 

VIAS DO INFINITO SER

sem a ordem do dia

do sobrenatural

não haveria

a natural ordem

das coisas da noite...

 

da noite para o dia

silentes instantes

tornam-se eternos...

 

do dia para a noite

palavras saltam muralhas

               e viram estrelas...

 

instantes e estrelas

conhecem os refúgios do tempo

mas desentendem

a quietude das pedras

    e a saga dos pássaros

                        translúcidos

do sétimo céu...

 

por via das dúvidas

há vias de certezas

que nos desafiam a percorrer

               in/conscientemente

e em perfeita claridade

a via láctea e o infinito

                 do nosso ser...

 

 

               (Rubenio Marcelo)

 

 

 

FALÉSIAS

 

Na solitude daquelas falésias

falei tantas vezes

com minhas falanges

em paz com meus dedos

meus pés, minhas mãos

falíveis...

 

Inda sangram naqueles rubros paredões

– beijados de sal e sol –

os talismãs do primeiro verso...

 

E certamente não descansa na praia
aquela jangada branca que dava ritmo

ao azul do silêncio

do meu olhar menino

[nas três pontas da sua vela

 milhões de sonhos abolicionistas

 apontam mares

 e mitos ressurgentes]

 

Se o abstrato é indispensável

para o contraponto da realidade,

os sortilégios não podem

prescindir do verde cio das manhãs

nem das lágrimas do tempo faminto...

 

Grande parte da súmula

dos meus ais

não está gravada em litogravuras.

      – litorais...

 

               (Rubenio Marcelo)

 
 

 

LAGOA DE LÓTUS

 

das partículas desta argila

moldarei em reverência

a tigela singela

           [concha natural]

            na qual beberei

na sede de filamentos de luz...

 

molhado de suave fragrância,

mirando o firmamento,

em sintonia de calor

e claridade,

buscarei a lúcida compreensão
e a aptidão mais exata

mais fluente

e mais liberta de pesados adornos...

 

enquanto

chamas de polens

fecundam o mérito

das melodias e dádivas

em denso denodo

                do sal do lodo

e do lado do sol...

 

                  Rubenio Marcelo

 

 

 

ESTAÇÃO NIRVANA

 

 

no primeiro poema

terei que partir...

 

mas não levo mala

nem o velho relógio

nem traje de gala

 

‒ a minha urgência já foi num trem-bala...

 

 

             Rubenio Marcelo

 

 

O VELHO

 

 

maltrapilho

sem brilho e fora do seu tempo

cansado

o velho sentou-se

ao lado do destino...

 

perdido em sua lucidez
tudo que traz

é uma sacola de lágrimas

misturadas com algumas palavras

             em andamento de sonatas...

 

algumas lúcidas palavras!?...

e quem as escutaria

- às escuras -

na calçada fria?...

 

ou quem lhe traria um chá,

sequer um violino?

 

   [ah... ninguém é digno

   de desfrutar da sua arte]

 

e mais uma vez

o seu olhar cor de avelã

sozinho  num incerto concerto

afaga o segredo do poente do sonho...

 

e alado... com seu destino

inventando harmonia
o velho amanhece...

solitariamente

solidando elegias

em expectações

  solfejando minuetos

     soletrando sonetos

para

As Quatro Estações...

 

 

               (Rubenio Marcelo)

 

 

MUSINSPIRAÇÃO

 

 

és nua companhia

meta e metabolismo

de fecundo gameta

 no útero do silêncio...

 

és figura e ação

figuração real

ação inteira e interação

colóquio e liberdade

tatuagem e mistérios

                   do tempo que dança

                   nas minhas retinas...

 

és a eficácia

da percepção mais leve

que se desvia

dos latentes ruídos

                    [subliminares

                      e corroídos]

e das recomendas do ego

 

és paisagem e passagem

e não te exalto,

            ó musa,

apenas ressalto

o leve toque do teu semblante

ao êxtase das palavras...

 

vezes,

te vislumbro

em núpcias com o luar

ou em caravela no balé do horizonte...

silhueta de uma gaivota

errante

distante

inalcançada...

 

vezes, teu destino

   é o meu destino:

   completas a incompletude

                  dos meus passos,
passeio contigo

             lado a lado –  a l a d o . . .

 

 

                  (Rubenio Marcelo) 

 

 

 

 

REFÚGIO

 

apenas uma maleta

numa das mãos...

o suficiente para levar

a carteira de identidade e o cartão,

a sandália antiga,

meia dúzia de vestes simples

e objetos pessoais,

o copo com prendedor de canudo

e algumas palavras cruzadas...

 

tudo... ou quase tudo

material dispensável

como a aspirina no bolso

e o velho termômetro

ainda colado

(por esquecimento)

na axila esquerda...

 

já no táxi

dormiu...

e quase chegando ao destino

sonhou

com um desbotado lençol,

cheiro de éter e penumbra

                          no quarto,

um camisão esverdeado,

uma bandeja metálica,

colherzinha de plástico,

copo descartável,

e uma janela 

| a b e r t a | 

para sonhos azuis...

 

acordou

e viu que somente a janela

não existe.

 

pegou a carteira...

           regou com lento pranto

           a sua desbotada identidade...

 

e novamente descansou.

 

 

        (Rubenio Marcelo)

 

 

 

 

RAMALHETE DE ENIGMAS

 

com o olhar fechado sobre si
a mais de muitas indecisões/h

embarcou numa nuvem...

                   e com ela

                   num diálogo viajante

                   a céu aberto

nem se deu conta de sua fragilidade...

 

[e seriam justos os efeitos fragmentados
  e a causa das imagens

                 transluzidas

                 na sua mente,

  ou seriam vertigens?]...

 

e haveria um lugar estratégico

para pousar com seus delírios

conscientes?

 

o certo é que
até a funda respiração

dispensava as acrobacias

                   e estranhos mapas

de impérios crocitantes...

 

no avesso da percepção da jornada

[carregando um ramalhete de enigmas
 entre sonhos e crenças]

                       buscando o ponto

                            alvo do roteiro

chegou ao destino:

sentiu que estava longe de si

            e perto do que sentia...

então

desacertou o encanto

desapertou o cinto

despertou um tanto

e nem estava tonto...

 

abandonou o assento

[que não tinha brilho

 muito menos rito]
e mudou de assunto...

 

   e ouviu um grito:

   – olhem o andarilho!

 

         (Rubenio Marcelo)

 
 

 

RE-NASCER



Era um tempo de sombras

 

em divagações e carrosséis

 

no olhar pensativo

 

daquele menino de cabelos dourados...

 

e um colibri

com bico de pólen

pousou no silêncio do seu poema,

que

brotou

girassol...

 

 

     (Rubenio Marcelo)

 

 

 

 

UM VULTO EM VOLTAS



da janela do quarto

tantas vezes ficou

[sem pestanejar

 bebendo um vento gelado]

tecendo as plumagens do silêncio

em retinas de tigres

                 de insaciáveis rotinas...

assim

soletrava as senhas de pontes e tronos,

sondava o sono das montanhas esquecidas

                                em impérios sombrios

e intuía o imenso croqui

de um paraíso incerto,

além das ilhas sem horizontes...

 

não era prisioneiro

de suas indecisões,

mas só iluminou seus pensamentos

com disciplina

no dia em que aprendeu

a seguir procissões de formigas...

 

           (Rubenio Marcelo)

 

 

 

 

 

Rubenio Marcelo lança novo livro

 

Vias do Infinito Ser

 

Aconteceu em Campo Grande, na noite de 16/05/2017, em concorrido evento no Teatro Prosa do SESC Horto, o lançamento oficial do novo livro de poemas de Rubenio Marcelo: “Vias do Infinito Ser”, publicado pela Editora Letra Livre. Com aprovação do FIC-MS, a obra possui apresentação do prof. Paulo Nolasco (doutor em letras) e prefácio do crítico literário e poeta José Fernandes (prof. e doutor em letras), que assim afirma num trecho: “O livro ‘Vias do Infinito Ser’ se compõe de uma poesia profunda, marcada por forte dimensão metafísica, como requer a concepção de infinito a que o ser tem de conquistar durante a existência. Para isso, o jogo poético, tal como o existencial, se executa entre o finito, o concreto, o físico, e o essencial, abstrato, metafísico, infinito. Em decorrência, a leitura de cada poema não pode ser feita em uma sentada, mas sorvida mediante várias leituras, a fim de que se possa mergulhar na essência mesma da poesia e no sublime que ela
encerra. A viagem pelo poema, deste modo, assemelha-se à viagem do ser em busca do infinito. Tem de ser executada passo a passo...”.

Já o poeta e membro da Academia Brasileira de Letras, Antonio Carlos Secchin, timbra na orelha/aba do livro: “Na poesia de Rubenio Marcelo, em vez de o ser humano habitar o cosmo, é o universo que reside no homem. Tudo emana da força da poesia, e é com essa luz de dentro, deflagrada pelo poder do verbo, que subitamente as coisas ganham forma e novo sentido. Como se lê em um de seus poemas, “palavras saltam muralhas e viram estrelas”.

 

Link para Rubenio Marcelo

 

 

 

 


O (IN)FINITO SER

[Prefácio do novo livro de Rubenio Marcelo]

                                                                                                 por: José Fernandes

 

 O ser, em sentido metafísico, está sempre em viagem. Viagem do nada para o tudo, do nada para a essência. A busca da essência implica, também, a busca do infinito. Não que se chegue a ser infinito; mas que, em sentido lato, o alcance por si mesmo ou por outros meios, por outras formas de o homem se essencializar, no verdadeiro sentido metafísico. Como nenhum ser, a não ser Deus e os números, define-se realmente como infinito, uma vez que se é dominado pelo finito, resta ao homem a única forma, em nosso entender, de se aproximar do infinito: a linguagem, mormente quando criação do poético, no sentido do sublime, de  superlativo do belo.

 Na poesia, o jogo que se efetua entre o finito e o infinito, além de relacionar-se com a linguagem, pode efetuar-se entre os elementos que compõem o poema, como verificaremos na tessitura de Vias do infinito ser, de Rubenio Marcelo. O vocábulo Vias aponta exatamente para a viagem que o ser lírico empreende por dentro de si mesmo e por dentro da linguagem. Além disso, como se lhe segue a palavra infinito, que antecede ao ser, fica claro o sentido de conquista, de passagem que, se não acontece per se, pelo menos se tenta. Por isso que o poema de abertura do livro se intitula ‘Prenúncio e inquietação do real’. Inquietação, porque o poeta, para obter o efeito poético, joga com dados abstratos e concretos da realidade. Basta ver o sentido do vocábulo vago como qualificativo de olhar e, indiretamente, de euforia, a mostrar o caráter aparentemente indefinido do ser que olha. Por outro lado, esse vago olhar contrasta com a semântica concreta de mobília imóvel colocada na antessala do cotidiano, como a mostrar as dimensões finita e infinita de quem capta o real.

 Esse jogo entre o abstrato e o concreto, ou entre o finito e o infinito, se adensa na segunda estrofe, onde a percepção, tato, flerta com a alforria, ou seja a criatividade do poema, que se erige. Se o tato é concreto, a torre dos segredos, além de apontar para o abstrato, ainda se correlaciona com o infinito, com o sublime, próprio da poesia. Não o fosse e não se realizaria ante rodízio de sortilégios, de mistérios que envolvem a linguagem, nesse jogo de real e imaginário, de forças que se complementam na viagem do poema e do ser ao infinito.

 Esse processo se adensa na terceira estrofe, no verbo dinamizando-se e, sobretudo, em dinamitando-se, significativamente colocados entre colchetes para elevar-lhes a semântica e, sobretudo, para mostrar o poder de destruição-construção por eles impressos. Exatamente por isso dinamita-se, não qualquer coisa; mas o ranger de dentes do silêncio, elemento sobre que esse poema, e toda a poesia, se erige. Por isso, o silêncio/pode amanhecer no inverso do espanto..., porque ele nega e afirma a um só tempo a mensagem do poético. A prova desse fazer-se poemático de silêncio e no silêncio se confirma pela busca da reinvenção, tarefa insana a que o poeta se propõe ao recriar o belo estético. Assim, impera, na elaboração do poema, a brusca extravagância/ entre a arma e a alma do resíduo assíduo/ que de(s)cora o espelho do tempo... O papel da arte, segundo essa concepção de infinito, é vencer o tempo. É por isso que a habitual inquietação/ completa seu curso, uma vez que o fazer-se do poema vai além de sua composição, à medida que envolve o leitor e o hermeneuta que o estuda. Assim, os dois últimos versos se destacam, compondo uma estrofe, já que a inquietação resulta do silêncio que compõe todas as partículas do poema, por isso dinamitado.

 Essa disfarçada metalinguagem, obtida mediante o jogo entre o real e o imaginário, ou entre o finito e o infinito, evidencia-se na composição do poema que dá nome ao livro: Vias do infinito ser.

Sem a ordem do dia

do sobrenatural

não haveria a natural ordem

das coisas da noite...

 

da noite para o dia

silentes instantes

tornam-se eternos...

 

do dia para a noite

palavras saltam muralhas

               e viram estrelas...

 

instantes e estrelas

conhecem os refúgios do tempo

mas desentendem

a quietude das pedras

    e a saga dos pássaros

                        translúcidos

do sétimo céu...

 

por via das dúvidas

há vias de certezas

que nos desafiam a percorrer

               in/conscientemente

e em perfeita claridade

a via láctea e o infinito do nosso ser...

 Destarte, na primeira estrofe contrasta a ordem do sobrenatural com a ordem do natural, ou seja o infinito e o finito, quer na composição do poema, quer na conquista da essência. Deste modo, a atividade lúdica que leva o poema a revelar e a esconder se clarifica na ordem/ das coisas da noite, que é sombra e escuridão que tem de ser vencida para que se obtenha o verdadeiro poema e o verdadeiro ser em sua viagem de infinito.

 Essa interpretação se aclara na segundo estrofe, quando os instantes/ tornam-se eternos. Eternos na conformação do poema, à medida que ele, o poema, dialoga com o ser, e na viagem do ser  ao infinito, que se concretiza na linguagem e na conformação da essência que se vai conquistando através da existência e, sobretudo, mediante a transformação em poesia, através das imagens. Não sem razão, portanto, do dia para a noite/ palavras saltam muralhas/ e viram estrelas, uma vez que, no poema, a palavra salta da luz às trevas, e, das trevas à luz, transpondo obstáculos, a fim de se converterem em estrelas, ou seja, a fim de adquirirem brilho próprio na dimensão do infinito.

 Por consequência, na quarta estrofe, instantes e estrelas/ conhecem os refúgios do tempo e desentendem/ a quietude das pedras/ e a saga dos pássaros translúcidos/ do sétimo céu, realizam, concretamente, o percurso entre o infinito e o finito, entre o ser e sua essência nessa viagem essencial de homem e poesia. Como a viagem do infinito ser é um processo constante e não concluído, está-se sempre em vias, na estrada ou na dependência dos limites impostos pelo finito. Por isto, há também as vias da certeza e dos desafios a percorrer in/conscientemente, porque há a lucidez da luz e da sombra do finito, para se chegar à perfeita claridade da via láctea e ao infinito/ do nosso ser...

 Para materializar esse processo, em que se viaja do concreto ao abstrato, do finito ao infinito, a composição do poema joga com objetos concretos, no caso desse poema, pedras, e com elementos abstratos, como sétimo céu. Vemos, deste modo, o poema fazendo-se de realidade e de imaginário, de matéria e de substância de ser. Esse procedimento se confirma no poema ‘Falésias’, em que o poeta, além de jogar com esses elementos, afirma, mediante clara metalinguagem, a construtura de seu discurso poético, como se o próprio texto nascesse das falésias. Não o fosse e não diria que na solitude das falésias falou com suas falanges. Falou, porque é na solidão que se fala consigo mesmo, como é no concreto que se constrói o abstrato. As falanges, sem dúvida, são a própria poesia, em que o ser dialoga com a própria essência, porque erigida na paz com o corpo, elemento concreto em que o abstrato se sustenta. Justamente por isso, Inda sangram naqueles rubros paredões/− beijados de sal e sol ─/ os talismãs do primeiro verso..., em que o imaginário e o abstrato se encontram nas reticências que os estendem ao infinito.

 Esse recurso estilístico-semântico inerente à tessitura do poema e da obra se evidencia na sequência da segunda estrofe, notadamente no azul do silêncio do (...) olhar menino. Se a cor azul carrega o simbolismo de devaneio, próprio do ato de poetar, o olhar menino simplesmente o materializa, à medida que são próprios da infância a imaginação e o imaginário, o concreto e o abstrato, o físico  e o metafísico.  

 Não bastasse essa verdade, o silêncio do olhar menino ainda se liga a três pontas de vela e a milhões de sonhos, como a expandir o abstrato, o infinito, uma vez que todas essas imagens remetem para o imaginário. Não fossem suficientes essas imagens, a elas ainda adere o fato de apontarem para mar e mitos, que são o infinito sendo. O mito se confunde com o imaginário, à medida que ele encerra toda capacidade imaginária do homem em criar figuras que se colocam além da matéria, além do finito.

 Para mais solidificar seu método de elaboração do poema e do livro, o poeta Rubenio Marcelo se refere ao abstrato como elemento indispensável no contraponto com a realidade, com o finito, a fim de se chegar ao infinito, pois os sortilégios não podem/ prescindir do verde cio das manhãs/ nem das lágrimas do tempo faminto... O tempo, ao mesmo tempo em que destrói o finito, constrói o infinito, como bem o substantivam as reticências que fecham o último verso dessa estrofe. Além disso, o tempo se liga aos mitos, à medida que ele é, na estrutura dos mitos, o responsável pela sua repetição e pela sua atualização infinita, enquanto tempo houver. Justamente por isso que a súmula dos ais do ser lírico não está gravada em litogravuras; mas em linguagem, à medida que ela é que revela o ser e lhe permite estender-se ao infinito e vencer o tempo.

 Essa consciência de se erigir uma obra pautada por uma forma determinada, concreta, para se obter um conteúdo, uma mensagem metafísica,  através da linguagem, é observada em grande parte dos poemas. Assim, ao mais navegarmos pelos seus poemas, encontraremos ‘Poema de dezembro’, em que o poeta, à semelhança do que vimos no poema anteriormente analisado, deixa claro que o  processo, em que o físico e o metafísico se digladiam para o ser lírico seguir sua jornada rumo ao infinito, porquanto a palavra não se cansa/ ante o verso fugidio/ renova-se/ pois se nutre de silêncio/ e de ausências... Até estrutura visual do poema materializa o procedimento, como o comprova o fato de o verbo renova-se constituir-se um único verso, a fim de colocar nele essa carga semântica especial, e as reticências que fecham o poema, à medida que elas são a presença da ausência. Presença, porque vistas fisicamente, e ausência, porque deixam a mensagem em suspenso, a fim de que o leitor continue lendo além das palavras, além das imagens que transformam a essência das palavras, porque aproximam o significado de realidades que, muitas vezes, sequer se tocam.

 Observamos, deste modo, que o livro ‘Vias do infinito ser’ se compõe de uma poesia profunda, marcada por forte dimensão metafísica, como o requer a concepção de infinito a que o ser tem de conquistar durante a existência. Para isso, como fica bem claro pela estrutura dos poemas, o jogo poético, tal como o existencial, se executa entre o finito, o concreto, o físico, e o essencial, abstrato, metafísico, infinito. Em decorrência, a leitura de cada poema não pode ser feita em uma sentada, mas sorvida mediante várias leituras, a fim de que se possa mergulhar na essência mesma da poesia e no sublime que ela encerra. A viagem pelo poema, deste modo, assemelha-se à viagem do ser em busca do infinito. Tem de ser executada passo a passo, porque nunca se lê um poema uma única vez.

 Resta-nos, neste momento, parabenizar o poeta Rubenio Marcelo por nos brindar com essa poesia física e metafísica, essa poesia marcada por imagens que transitam entre o real e o imaginário, entre o concreto e o abstrato, porque sorvida nas vias do infinito ser.

 

 

José Fernandes

Crítico literário, poeta, membro da Academia Goiana de Letras.

Doutor em Letras pela Universidade Federal do RJ

 

 

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