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Valdir Rocha
Bloco de poemas
do livro Títeres de Ninguém
CENSOR
Risque-se o óbvio,
apague-se o visível,
elimine-se o claro,
corte-se o acabado
e ponha-se tudo a queimar,
em fogo brando,
até que amoleça o sentido.
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TRADUTOR
Penetro o âmago das palavras;
encontro sentidos insuspeitos
e direções que ainda não tinham.
Delas, labio o seio.
Melhoro o vinho que bebo,
como os fatos que reconto,
sem inveja, sem ciúme.
Despioro a verdade absoluta.
Faço múltipla a unicidade.
Exagero com moderação.
Coiso o nada.
Tiro para acrescentar.
Veja ensaio de
Eduardo Ferreira |
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DISSIMULADOR
Quando digo eu, eu, eu,
entendam-se vários eus.
Eus ou eles,
lá ou aqui,
sempre ou jamais,
alisados ou toscos,
desenvolvo em nós o encanto neutro
de escolher
a quem me enganar.
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DISTANTE
Aqui mesmo
é tão longe.
Cansa olhar
para lugar nenhum.
Há muito tempo
não me visitava.
Faço contas
sem usar número.
Lembro-me de homens
que não existiam.
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NOMEADOR
Para identificar,
mergulho na intimidade
dos vãos.
Lá permaneço.
Ouço o desejo.
Trago-o,
liberto,
à tona:
conto, revelo.
Antes do nome,
não se é.
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SEM-PALAVRAS
De memória,
invento histórias tão verdadeiras e cruas
que lamento não poder contar.
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SONHADOR
¿Todas as coisas têm sexo
ou somente as inanimadas?
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TINHOSO
Fiz-me tantos
que não me encontro.
Desde outreras,
estou em tudo.
Sei a palavra;
delicio-me em não a dizer.
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Valdir Rocha |
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