Angela Gutierrez
30.10.2000
A palavra é a lei
Napoleão Nunes Maia lança ‘‘O Antigo Peregrino’’, seu novo livro de
poesias, e aproxima o poder contemplativo da literatura da
racionalidade do mundo jurídico.
José Leomar |
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Napoleão Nunes Maia: poesia
permeada por tristezas, resignações e lembranças da infância |
A poesia como um complemento ao
direito; a intuição contemplativa em sintonia com a razão analítica.
Na visão do jurista Napoleão Nunes Maia Filho, essa é a
jurisprudência que encerra sua atividade como poeta. ‘‘Como juiz, eu
sou um romântico. E, como poeta, também trago comigo essa alta
dosagem de idealismo e de romantismo que me acompanha nos
julgamentos’’, explica. Juiz do Tribunal Regional Federal da Quinta
Região, em Recife, e autor de cinco renomados livros sobre Direito
Público e Direito Processual, Napoleão está lançando seu segundo
livro de poesias, ‘‘O Antigo Peregrino’’, publicado pelo programa
editorial da Casa José de Alencar.
O livro, que deverá estar sendo
lançado até o início do próximo mês, dá continuidade aos temas
abordados por Napoleão em ‘‘A concha impossível’’, publicado em
1998. Nele, o poeta/jurista retratava a busca espiritual e afetiva
de uma pessoa desencontrada de seus ideais. O que, nas palavras do
mestre Francisco Carvalho, foi descrito como ‘‘uma praia onde o
homem às vezes ancora a sua nau destroçada pelos ventos da ilusão’’.
‘‘Seus poemas ‘confessionais’, escritos numa ‘forma antiga de
escritura poética’, testemunham a tragédia do homem, na glória do
amor ou na finitude da morte’’, destacou Carvalho no prefácio do
livro.Em ‘‘O Antigo Peregrino’’, então, Napoleão retoma esse seu
personagem errante e o faz encontrar um ‘‘oásis’’, uma ‘‘situação
afetiva favorável’’, que, ao mesmo tempo em que lhe redime da
condição de nômade, também serve de impulso para próximas buscas.
‘‘Aqui, a minha alma conspira com a minha mente e uma vida cheia de
ausências se plenifica com olhares e gestos, tudo fruto do
pensamento vigilante, açoitado por distâncias (e distâncias
inexplicavelmente crescentes). Pode-se dizer que isso é um
desperdício inexorável, um exercício interminável da esperança ou da
insistência obstinada - ou qualquer outra coisa igualmente vaga e
imprecisa - mas nunca se diga que é um fingimento’’, avisa o autor.
De fato, com a leitura dos versos de
‘‘O Antigo Peregrino’’, percebe-se a profunda autenticidade e a
insuspeita força da poesia de Napoleão. Uma poesia que, segundo ele,
é permeada por tristezas e resignações mas também por alguma
religiosidade e por lembranças da infância, passada em sua cidade
natal, Limoeiro do Norte. Tudo repleto de metáforas da esperança: o
amor, o erotismo, o desejo, o encontro. ‘‘A fala do amor é mais no
silêncio/ da voz que logo não se diz,/ é a expressão do alado
sentimento/ total e pleno em si: tela e verniz// O completo, o
amplo, o real e o tudo/ cabem-se como um mar verde na mão:/ o
segredo é claro, enorme e mudo/ e desvenda-se apenas aos que amam’’,
ele adianta logo no primeiro soneto.
‘‘Essa produção poética é escrita com
a mesma paixão com que ele escreve os trabalhos jurídicos, prepara
as aulas da Faculdade de Direito ou estuda as questões da Justiça
Federal e até acho que isso só terminará nele quando terminar sua a
própria vida’’, garante o filho Mário Henrique Goulart Maia na
orelha do livro. ‘‘Sobre os temas das poesias... sei que são muitas
as pessoas que os admiram, sabendo (ou não) que se trata de relatos
da mais íntima verdade. Mas também há poemas que são mais lembranças
da sua infância, da sua vida em Limoeiro do Norte, de onde ele
parece retirar as suas principais forças, sempre me recordando, como
diz, que saiu do sertão, mas o sertão não saiu dele’’.
Tão íntimas são as verdades de ‘‘O
Antigo Peregrino’’ que Napoleão faz questão de destacar que os
sonetos são dirigidos a uma pessoas concreta e que ela se reconhece
nas narrativas. Na verdade, segundo ele, o livro é ‘‘uma reverência
menor a quem fez e faz por mim o tudo que me há de mais expressivo
na vida’’. Mas por falar em sonetos, ‘‘O Antigo...’’ é todo formado
por essa forma poética que, segundo o autor, é extremamente difícil
e demanda uma aplicação bastante precisa. ‘‘Quanto ao formato dos
poemas, ... aqui se representa uma ousadia, pois a adoção do soneto
faz supor que se tenha o completo domínio das suas muitas
singularidades, sendo mesmo uma espécie de signo da maioridade do
poeta’’, ele explica.
Vivendo atualmente em Recife, Napoleão
está preparando um novo livro de poesias e um outro sobre direito,
que deverão ser lançados no início do ano que vem. Com ‘‘O Antigo
Peregrino’’, o juiz chega ao seu sétimo livro publicado. Os outros
são ‘‘A Concha Impossível’’ (poemas, 1998), ‘‘Estudos Tópicos de
Direito Eleitoral’’ (1998), ‘‘Temas de Direito Administrativo e
Tributário’’ (1998), ‘‘Direito Processual - Quatro Ensaios’’ (1999),
‘‘Estudos Temáticos de Direito Constitucional’’ (2000) e ‘‘Estudos
Processuais sobre o Mandato de Segurança’’ (2000). Todos os livros
foram publicados dentro do Programa Editorial da Casa José de
Alencar, do professor Martins Filho, definido por Napoleão como ‘‘o
maior de todos os benfeitores da cultura no Ceará e um dínamo aos 98
anos’’.
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