César Leal
Ode quase
bíblica
Poetas, é preciso falar a Gog, príncipe
de Mosoc e de Tubal!
Podres estão os frutos da vinha de Baal-Hamon
e eis que é chegado o tempo do Dragão
anunciado pelos profetas
Cantemos a copiosa luz dos corações
e a paz, a paz cantemos,
que não há beleza nos monumentos em chamas,
em mulheres evaporadas
no vórtice das bombas apocalíticas
nos esqueletos cobertos de sono e cal.
Cantemos a paz das longitudes altíssimas,
a paz querida pelas mães e meninos e poetas
que todos desejam viver e amar.
Não cantemos a paz armada, ofertada
pelos canhões,
pelos tanques
e foguetes balísticas, that false peace
That masquerades between the troughs of seas
Deceives in the silence between earthquakes,
or he lull
Between atomic bombs.
Ai de nós!
Os barbitúricos já não limitam o desespero da
Terra
Montanhas se povoam de centauros
e por toda a paisagem noturna
há bazucas, morteiros e canhões
desafiando as estrelas com suas bocas de ferro.
Cantemos a paz, não
cantemos a paz de cinzas — que é triste —
a paz dos mausoléus, a paz
ofertada pelo Dragão
aos meninos de Hiroshima a Nagazaki.
... Peace is the pull
Towards the motion of tree, star and stone,
The contented rhythm of the child at the nipple
The moment of surrender after union.
Poetas, perdoai as rudes notas
deste canto:
— é que meu coração registra um pranto escuro,
o compassivo pranto das mães
cujos filhos foram soprados na Guerra
como lâmpadas. Choram
e não lhes ofereço o mistério de meu canto
porque os olhos são portas
por onde saem fluindo da memória
os recordos mais tristes.
Deixai-as chorar os filhos
sacrificados a um século de Bronze,
pleno de asas, motores e disparos.
Que retornando
aos meus abrigos secretos
como quem foge aos punhos de um bombardeio
ouço o estalar de granadas
em minhas arquiteturas cardíacas.
Cantemos a paz, aspera
tum positis mitescent saecula bellis, a paz
longínqua das estrelas,
o vôo do sol erguido sobre o porto
o lento crescimento dos arbustos
a luz descida nas montanhas
mas não louvemos a paz dos Rosemberg
carbonizados na elétrica tortura.
É preciso crer na paz
— tranqüila em sua esperança
altiva em sua vontade.
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