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Kátia Borges


 

Alguma notícia sobre

o novo livro de

Luís Antonio Cajazeira Ramos,

Mais que sempre


“Clássica e moderna, rica de herança e com brilhante luz própria”. É assim que Ruy Espinheira Filho define a poesia de Luís Antonio Cajazeira Ramos. Vencedor do Prêmio Nacional Gregório de Matos, oferecido pela Academia de Letras da Bahia em 2000, o poeta retorna à cena literária com o lançamento de Mais que sempre (Rio de Janeiro: 7Letras, 2007), no dia 11 de maio, sexta-feira, a partir das 18h, no Palacete Góes Calmon, sede da ALB, na Avenida Joana Angélica. O livro reúne 24 inéditos e uma seleta de poemas retirados de trabalhos anteriores: Fiat breu, Como se e o premiado Temporal temporal. As orelhas são assinadas por Antonio Carlos Secchin, da Academia Brasileira de Letras, que destaca a “evidente sensibilidade lírica e o extremo domínio retórico” do autor, dono de uma extensa fortuna crítica.

Cajazeira Ramos estreou na poesia em 1983, com o livro Tudo muito pouco, trabalho renegado pelo autor, que só despertou para a poesia na idade adulta. Após queimar quase toda a edição do primeiro livro e passar mais de dez anos longe dos versos, voltou a escrever intensamente a partir de 1995 e lançou no ano seguinte Fiat breu. Em seguida, após a excelente receptividade da crítica especializada, editou Como se, pelo selo Letras da Bahia, em 1999, livro que merecera no ano anterior menção honrosa no Prêmio Nacional Cruz e Sousa, da Fundação Catarinense de Cultura. Em 2002, publicou pela Relume Dumará, do Rio de Janeiro, Temporal temporal, ganhador do Prêmio Nacional Gregório de Matos, parando novamente de escrever por quase meia década, embora sua produção tenha continuado a ser divulgada nesse período em antologias no Brasil, Portugal e França e em revistas literárias impressas e eletrônicas país afora.

Em Mais que sempre, Luís Antonio reafirma o domínio do soneto e, como destaca Ruy Espinheira Filho na quarta-capa do livro, “trabalha com naturalidade no espaço dos catorze versos”, seu território predileto. Na forma clássica, o autor encaixa reflexões contemporâneas, por vezes cáusticas, sobre o amor, a solidão, a existência e o sexo, encarnando um “Camões carnívoro” (título de um de seus novos poemas) de verve inquestionavelmente lírica, satírica, ácida e romântica. Tudo a um só tempo. Tanta habilidade no manejo das palavras, na alquimia poética, rendeu ao poeta elogios de peso, como o de Antônio Houaiss, que sobre ele escreveu: “Luís Antonio é impiedoso com o poeta que há nele e massacrante com os poetas em derredor, que se alteiam do que ele consegue.”

 


 

DADOS COMPLEMENTARES

 

EVENTO: Lançamento do livro de poemas Mais que sempre (Rio de Janeiro: 7Letras, 2007), do poeta Luís Antonio Cajazeira Ramos, em 11 de maio de 2007 (sexta-feira), a partir das 18h, na Academia de Letras da Bahia (Palacete Góes Calmon, Av. Joana Angélica, 198, Nazaré). O evento será aberto pelo professor Cláudio Veiga, presidente da ALB, seguido de pronunciamento do vereador Valdenor Cardoso, presidente da Câmara Municipal de Salvador, patrocinadora da edição, e apreciação do escritor Antonio Carlos Secchin, da Academia Brasileira de Letras. O livro possui 160 páginas e traz 24 sonetos inéditos e uma seleta de poemas dos livros anteriores do autor.


 

DADOS PESSOAIS DO AUTOR: Luís Antonio Cajazeira Ramos nasceu em 12 de agosto de 1956 em Salvador, onde ainda reside. Cursou Engenharia Elétrica e Agronomia na Universidade Federal da Bahia, mas abandonou ambos os cursos no penúltimo semestre. Ainda na UFBA, fez dois semestres de Medicina. Formou-se em Educação Física e em Direito pela Universidade Católica do Salvador. Mantém vínculo com a UCSAL como professor. É funcionário do Banco Central do Brasil, membro da Ordem dos Advogados do Brasil, sócio do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia e componente do conselho editorial de Iararana, revista de arte, crítica e literatura.


 

PRODUÇÃO LITERÁRIA: Não fez versos na infância nem na adolescência, despertando para a poesia na idade adulta. Estreou com o livro Tudo muito pouco (Cruz das Almas, 1983), mas rasgou e queimou quase toda a edição, abandonando a poesia por uma década. Voltou a escrever intensamente em 1995. Re-estreou com Fiat breu (Salvador: Edições Papel em Branco, 1996). Em seguida, lançou Como se (Salvador: Letras da Bahia, 1999), menção honrosa no Prêmio Nacional Cruz e Sousa, da Fundação Catarinense de Cultura, em 1998. Finalmente, publicou Temporal temporal (Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2002), ganhador do Prêmio Nacional Gregório de Matos, da Academia de Letras da Bahia, em 2000.


 

OUTRAS PARTICIPAÇÕES: Sua poesia está incluída em várias antologias, destacando-se as seguintes: 1) no Brasil, A poesia baiana no século XX (Org. Assis Brasil. Salvador: Funceb; Rio de Janeiro: Imago, 1999); 2) em Portugal, Vozes poéticas da lusofonia (Org. Luís Carlos Patraquim. Sintra: Instituto Camões, 1999); 3) na França, Voix croisées: Brésil-France (Dir. Gerard Blua. Paris: Éditions Autres Temps, 2006). Sua poesia também pode ser encontrada em sítios eletrônicos, como o Jornal de Poesia www.jornaldepoesia.jor.br. Eventualmente, publica poemas, resenhas e outros artigos em revistas literárias e jornais.


 

FORTUNA CRÍTICA: Luís Antonio coleciona vasta fortuna crítica. Muitos artigos sobre sua poesia já foram publicados em revistas e jornais de circulação nacional e no exterior, além dos textos utilizados nos prefácios, orelhas e quartas-capas dos livros. Todos destacam seu domínio da linguagem, sua sensibilidade lírica, seu trânsito entre o sublime e o profano, entre o erudito e o vulgar, sua expressão ao mesmo tempo clássica e contemporânea, seu humor entre o riso e o sarcasmo, sua predileção pelo soneto e pela subjetividade lírica, seu discurso que une clareza e complexidade, sua poética com luz própria e personalidade. Hélio Pólvora o chamou de “poeta de veneno nas veias”. A crítica em geral o situa entre os melhores da poesia brasileira na atualidade.


 

TEXTOS CRÍTICOS EM MAIS QUE SEMPRE: Nas orelhas do livro, o rigoroso crítico Antonio Carlos Secchin frisa “a evidente sensibilidade lírica e o extremo domínio retórico” da poesia de Luís Antonio, que “navega em território próprio”, num “assédio à verdade não com o intuito de desvelá-la, mas de dissolvê-la”, por meio de um verso que “não é sentencioso, mas incisivo e lapidar”, com “uma arte aberta aos passos movediços do acaso, mas ancorada em uma base técnica de grande solidez”. No texto da quarta-capa, o premiado poeta Ruy Espinheira Filho observa que Cajazeira, como sonetista, “trabalha com naturalidade no espaço dos catorze versos”, numa poesia “a um só tempo clássica e moderna, rica de herança e com brilhante luz própria”.


 

ENSAIO SOBRE SUA POESIA: A poesia de Cajazeira foi objeto do ensaio Temporal lírico, lirismo temporal, do escritor Aleilton Fonseca, usado como prefácio em Temporal temporal. Para o crítico, sua “múltipla e inquieta poesia é rica em motivos e recursos, sendo ele um “poeta de vivências, de observação e de indagações existenciais”, cujos “temas são verdadeiros mergulhos da razão e do sentimento na essência e circunstâncias da vida”, com “riqueza semântica e metafórica, numa conformação de linguagem que sugere multíplices direções de leitura”, aberta ao “contínuo exercício de construir, lapidar e re-significar”, num “processo que é a força-motriz de sua criação”.


 

OUTRAS OPINIÕES PUBLICADAS ANTERIORMENTE:

Alexei Bueno (prefácio de Fiat breu): “Cajazeira capta, como poucos poetas, diversas situações e estados da nossa imediata atualidade, transformando-os em vivaz e direta expressão poética.”

Álvaro Alves de Faria (São Paulo: Jornal da Tarde, 1997): “Cajazeira percorre seus rumos devidamente traçados para mostrar que está além das formas.”

Ana Cristina Pereira (Salvador: Correio da Bahia, 1999): “Fica evidente o trabalho que faz com a linguagem, sempre em busca da palavra ou expressão mais apropriada.”

André Seffrin (orelha de Como se): “Crispado, agônico, sátiro, caminha sem medo de ferir ou ferir-se, aberto ao universo íntimo tanto quanto às intempéries do mundo.”

Antônio Houaiss (orelha de Como se): “Luís Antonio é impiedoso com o poeta que há nele e massacrante com os poetas em derredor, que se alteiam do que ele consegue.”

Assis Brasil (A poesia baiana no século XX. Rio de Janeiro: Imago, 1999): “Com rimas toantes ou tradicionais, repondo o sacral onde os iconoclastas de 1922 tinham eliminado.”

Clodoaldo Lôbo (Salvador: A Tarde, 1996): “Desmistificando-se ao expor a mistificação, transita entre o sagrado e o profano, o verdadeiro e o ilusório, o essencial e o circunstancial.”

Fernando Py (Petrópolis: Gazeta de Petrópolis, 1997): “Métrica e rima. Ambos os recursos, além de serem válidos, tornam-lhe mais natural a expressão poética.”

Fonseca Gaspar (Lisboa: Jornal da Amadora, 1997): “A palavra é usada com rigor e mestria para expressar emoções e pensamentos, ambos complexos ao mais alto nível da escrita.”

Gerana Damulakis (Salvador: Neon, nº 9, 1999): “Luís Antonio resolveu reabilitar a linha quebrada, e, esculpindo verso a verso, o resultado foi muita poesia.”

Hélio Pólvora (quarta-capa de Temporal temporal): “Tem a coragem de deitar sobre si – e, por extensão, sobre a sua espécie e sobre a vida – um olhar de corrosiva avaliação.”

José Alcides Pinto (Fortaleza: Diário do Nordeste, 2001): “Cajazeira inova sua poética por dentro da palavra. Um clássico moderno, na expressão mais legítima do termo.”

Luís Carlos da Silva (Paris: Latitudes, nº 10, Cahiers Lusofones, 2000): “A presença do Eu está omnipresente na poesia de Luís António Cajazeira Ramos.”

Luiz Nogueira Barros (Maceió: Gazeta de Alagoas, 1997): “Os bons são assim: surpreendentes, loucos, humanos, desumanos, mitológicos, carnais, espirituais e uma gama infinita de surpresas...”

Marcos Cordeiro (Recife: Encontros, nº 16, 2000): “Sátiro impiedoso do homem, do seu eu e do outro, não encontra limites ao seu exercício poético de reciclar palavras e evocações textuais.”

Renato Bittencourt (Rio de Janeiro: O Globo, 2001): “Sua procura é a expressão medida, mas com régua larga. O tema é a vida, com sua ampla e múltipla abrangência.”

Ricardo Vieira Lima (Rio de Janeiro: Jornal do Brasil, 2000): “Dicção nova, tradição, humor desabusado. Incomum opulência verbal, aliada ao domínio das formas poéticas tradicionais.”

Sérgio de Castro Pinto (João Pessoa: A União, 1997): “Cajazeira se assenhoreia do soneto.”

Soares Feitosa (Jornal de Poesia, na internet): “Só os que possuem um ouvido absoluto sabem dos sons da palavra. Luís Antonio Cajazeira Ramos tem ouvido absoluto.”

Direto para página de Luís Antonio

Direto para página de Kátia Borges

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Antonio Carlos Secchin


 

Poesia mais que sempre

[ Orelhas ]

 

Em Luís Antonio Cajazeira Ramos, a evidente sensibilidade lírica e o extremo domínio retórico, atributos que nem sempre se reúnem no mesmo escritor, revelam-se qualidades indissociáveis. Para além do espontaneísmo informe e confessional, ou da mera habilidade versejadora, sua poesia navega em território próprio: uma implacável máquina do poema, que retrata, com humor, farsa e melancolia, as vias e os desvios de um sujeito lírico em confronto, o mais das vezes, irônico frente ao mundo.

Luís Antonio evita lançar luz sobre o poder corrosivo de seu discurso, como se a face jocosa do texto não abrigasse uma outra e clandestina configuração do real. Com freqüência, na evocação de um quadro cotidiano o poeta injeta o veneno de sua percepção enviesada: o que há pouco era rotina se transforma em desordem (a desordem do desejo, por exemplo).  Contra o torpor da paisagem plácida de um real domesticado, ele libera a voz de súbitos e insidiosos fantasmas.

Em seus textos, percebe-se que os dados referenciais, anticabralinamente, se encontram subordinados a uma explícita hipertrofia da subjetividade, com a fundamental ressalva de que tal sujeito autocentrado não possui centro, (des)amparado por crenças e valores nômades.

Os muitos eus de Luís Antonio remetem à idéia de um assédio à verdade não com o intuito de desvelá-la, mas de dissolvê-la: eus que abrem nós, que desatam identidades, ao propor que a verdade – se houver – habita no intervalo das versões em que a fixamos. Daí a convivência de contrários, a presença de paradoxos que – paradoxalmente – não se contradizem, pois só o fariam se fosse monolítica a figuração do sujeito poético. Ao multiplicar-se, Cajazeira concede alforria ao personagem de si mesmo.

O verso de Luís Antonio não é sentencioso, mas incisivo e lapidar. Percorre, sem hierarquias, um espectro de situações que ora flertam com o sublime, ora namoram o vulgar e o irrisório. Tudo se equivale, ou melhor, no poema, é como se tudo se equivalesse, já que o simulacro ficcional, paralelo à existência, se apresenta mais intenso e real que a própria vida.

Ressalte-se, ainda, outra singularidade da poesia de Cajazeira Ramos: a clareza. Sustentando-se no impecável compasso rítmico dos decassílabos (para nos atermos a esta medida), ele demonstra que clareza e complexidade não se excluem.

Ao desenvolver uma arte aberta aos passos movediços do acaso, mas ancorada em uma base técnica de grande solidez, em Mais que sempre Luís Antonio Cajazeira Ramos, como todo efetivo criador, reafirma ser, ao mesmo tempo, um mestre do verso e um persistente e inquieto aprendiz da poesia.

 


 

Antonio Carlos Secchin, poeta e crítico de poesia, é membro da Academia Brasileira de Letras.

 Direto para página de Luís Antonio

Direto para página de Secchin

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Ruy Espinheira Filho


 

Mais que sempre, de Luís Antonio Cajazeira Ramos

[ 4ª Capa ]

 

Como sonetista – pois soneto é o seu meio principal – Luís Antonio Cajazeira Ramos situa-se entre os melhores da poesia brasileira. Trabalha com naturalidade no espaço dos catorze versos, adicionando à sua voz o melhor da tradição e, em contrapartida, enriquecendo-a com seu timbre pessoal.

Amor, solidão, perplexidade, desencanto, esperança, desespero, humor... Destes estados humanos se compõe sua poesia, que se faz de rigoroso artesanato e epifanias. A um só tempo clássica e moderna, rica de herança e com brilhante luz própria, autoriza o poeta a dizer, sobre ela, como nos versos finais de “O som da concha”:

Quem escuta seu som, não tem jeito:

toca a concha que toco no peito.

 

Ruy Espinheira Filho, poeta e ensaísta, é membro da Academia de Letras da Bahia.


 Direto para página de Luís Antonio

Direto para página de Ruy

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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José Inácio Vieira de Melo

A Tarde, Salvador, Bahia, Brasil

5.5.2007


Terrível e doce lira 

 

Completar um cinqüentenário é sempre motivo de comemoração. E é nesse clima que o poeta Luís Antonio Cajazeira Ramos tem vivenciado seus cinqüenta anos. Uma prova disso é a publicação do seu novo livro, Mais que sempre (Rio de Janeiro: 7Letras, 2007), uma edição bem cuidada que faz jus ao conteúdo que envolve.

Além de trazer 24 sonetos inéditos no capítulo de abertura, Mais que sempre faz uma viagem pela obra de Luís Antonio, reapresentando poemas de seus três livros anteriores, distribuídos em cinco capítulos, arrumação esta que exigiu do poeta o cumprimento da árdua tarefa de escolher, como ele mesmo afirma na “Nota do autor”: “Saio doído da escolha – é duro eleger uns poemas e abrir mão dos demais, quando se gosta paternalmente de todos.” Assim, os poemas do livro Temporal temporal (2002), vencedor do Prêmio Nacional Gregório de Matos, da Academia de Letras da Bahia, encontram-se nos capítulos “Temporal temporal” e “Lucidez insana”. Os elegidos de Como se (1999), nas seções “Estos do estio” e “Veia Vernal”. Na seção final, “Fiat breu”, estão os poemas do livro homônimo, publicado em 1996.

Destacar este ou aquele poema dessa antologia coesa é querer padecer do sofrimento que o autor experimentou ao fazer a sua seleção. É certo que sonetos como “Pantomima”, “Véspera do dia dos mortos”, “O amor de minha vida” e “Religião poética” têm-se tornado emblemáticos dentro da trajetória de Luís Antonio. Mas o seu tom é tão marcante, que, ao se ler o livro, fica a impressão de que estamos diante de um único poema. Isso acontece porque o poeta vai cerzindo seus poemas um no outro, chegando a usar o verso final de um poema logo no início do seguinte, como numa coroa de sonetos. Outras vezes, o título de um soneto aparece bordado no âmago de outro, como é o caso de “Na solidão do campo de narcisos”.

Luís Antonio Cajazeira Ramos é um poeta terrível, como terríveis são os anjos de Rilke. O sarcasmo que perpassa seu conjunto de sonetos é de deixar qualquer leitor espantado. Não que sua lira cause aversão, mas é que Luís Antonio canta tão bem e tão profundamente a miséria humana, que nos coloca na pele do poema e, por conseguinte, da miserável condição que nos é implícita. Ler a poesia de Cajazeira Ramos é ser o Cajazeira Ramos. Deslizar pela lama de sua métrica perfeita e sentir o cheiro da origem, uma vez que somos o barro que sonha odisséias, mas que não sai do pântano. Luís Antonio, um demiurgo gozador, ri de tudo.

Ao contrário do que possa parecer, a sua atitude poética não é de indiferença, mas de compreensão do humano. Diante do caos que o rodeia, só pode entender o grito da criação como um “fiat breu”. E o seu clamor se estende para uma divindade – não aquela de onipotente ausência, mas a que arrasta as suas asas negras sobre nós, à maneira de um Baudelaire, quando este invoca: “Oh Satã, tu que és o rei dos anjos, tenha piedade de nossa longa miséria!” Mas estas afirmações não fazem do poeta dos temporais um cantador de aberrações e das trevas. Muito pelo contrário. Luís Antonio fala, o tempo todo, do amor, da solidão, do eu (e como dói) e da dor. Seus poemas nada têm de lúgubres, sombrios, pesados. A grande faceta desse poeta é dizer essas coisas claramente, atribuindo a cada verso leveza e espanto, tudo, ou quase tudo, dentro de uma forma que elegeu (ou que o elegeu): o soneto.

Que conforto é para o apreciador de poesia se deparar com um poeta da estatura de Luís Antonio Cajazeira Ramos, que dialoga com a tradição, mas que, sobretudo, com voz própria e firme, atualiza e renova o discurso poético e inova no soneto, dando uma contribuição singular para essa forma dentro da poesia brasileira contemporânea. Resta, então, ao leitor, experimentar a intensidade dessa poesia, caminhar “na solidão do campo de narcisos” e perceber que o seu tempo, leitor, já passou e que você nem se deu conta. Diante desse lirismo tão irônico, no entanto, não é preciso atormentar-se. A voz do poeta, que penetrou na sua ferida, agora vem e, “enquanto a nuvem se exauria aflita”, “enquanto o bom pastor toca sua flauta”, “enquanto eu busco, imperfeito, a poesia”, “um novo amor convido para a dança”.

 

 

José Inácio Vieira de Melo é poeta e jornalista, co-editor da revista Iararana. Publicou, entre outros, A Terceira Romaria (2005). Tem no prelo A Infância do Centauro.

 


 Direto para página de Luís Antonio

Direto para página de José Inácio

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Lima Trindade

A Tarde, Salvador, Bahia, Brasil

5.5.2007


Armadilhas e fugas de Cajazeira Ramos

 

Uma celebração. Ao completar seus cinqüenta anos de idade, o poeta Luís Antonio Cajazeira Ramos lança o livro Mais que sempre, antologia que revisita três de seus livros anteriores e traz 24 poemas inéditos. Em meio a fugas e armadilhas, tentei que nos falasse sobre o seu ofício, a sua vida e o estar no mundo.


 

Lima Trindade – Em seu livro anterior, Temporal temporal, o tempo se apresenta como uma “angústia máxima”, que “avança a volta sem volta”. Nesse sentido, Mais que sempre poderia ser lido como uma resposta para as diversas mortes que vivemos? Um retorno à infância e à renovação de velhos mitos por meio da poesia?

Luís Antonio Cajazeira Ramos – Se o dia “avança a volta sem volta”, “eu aguardo o pôr-do-sol”, para fazer um “brinde ao crepúsculo” e ser surpreendido pela “noite escura”. Estas são imagens de um de meus poemas favoritos daquele livro. Não busco nem tenho respostas às mortes e perdas. Minhas visitações ao passado são apenas turismo pela memória, e minhas indagações não incluem futurologia, nesta minha vida subjetiva. Os mitos não se renovam. Seu ciclo é ditado pelo dia: nascem com a aurora, envelhecem e dormem. Estão lá, presentes, enquanto nos debatemos em busca de sei lá o quê.

 

LT – Sua lírica, desde o início, evita a armadilha da autocomplacência, convidando o leitor à vertigem, à perda e ao esquecimento. A atemporalidade do título estaria na total imersão no agora, na urgência do contemporâneo?

LACR – Não cabe condescendência em poesia. Drummond proclama: “meu nome é tumulto”. Por isso e por tudo, o tempo não basta. O agora, esse eterno, é, como tudo mais, insatisfatório. Mas não busco verdades sentenciosas. Quero apenas as versões poéticas. Não perco tempo com filosofia e psicologia: a poesia transita em outro território. Ela não é a construção de uma torre, um castelo, uma ponte, uma cidade. Não é superação nem domínio. Talvez seja estranhamento e desencontro, conflito e perplexidade, comoção e gozo. Se poesia é fuga, nisto é também encontro, transitório e perene. Como em “Bolha de sabão”: vertigem, perda, esquecimento. O título? O título de meus livros é, mais que sempre, o mesmo.

 

LT – Nega então que em Temporal temporal predomine a sombra da morte, enquanto Mais que sempre afirma a pulsão da vida, a sede, o amor, o sexo e o gozo?

LACR – Eu me sinto como se escrevesse o mesmo poema desde junho de 1995, a partir deste verso: “Acordo para um mundo novo no jornal.” Meu texto vai crescendo como um diário. Neste, as confidências estão impregnadas de circunstâncias, tais como o estado de humor, a emoção de plantão e as vivências recentes, mas é sempre o mesmo réu confesso. Já os poemas, como aponta Gerardo Mello Mourão numa carta, são “um memorial”, em que “a pura geometria do consciente rende-se à magia caótica das intuições”. Temporal temporal vai de 1996 a 2001, as circunstâncias e motivações foram muitas e variadas. É um livro heterogêneo nos temas, na abordagem, nas soluções de linguagem. Nele há também a questão da morte, mas não somente. Mais que sempre foi um mês e meio em torno de uma coisa: o amor. O amor e suas vestes. O desnudamento do amor.

 

LT – E como é a sensação de comemorar cinqüenta anos, você teme a perda da juventude?

LACR – Fazer 50 é o caminho de quem passa dos 49, não é, meu velho Dorian Gray? Agora, comemorar é que é o bom. Inventei que gosto de comemorar meus aniversários. Se decido dar uma festa, então, pareço um pinto no lixo, rindo à toa. O cinqüentenário tem sua liturgia própria. Mais que isso, tem toda uma retórica: meio século de vida, hein? Quanta experiência, não? E a juventude que se foi? E o valor da maturidade? Voltemos ao “Brinde ao crepúsculo”: da “pele lisa da aurora” às “rugas do fim da tarde”, será que aquelas tolices enganam a solidão? Talvez eu pense nisso, quando mergulhar noite adentro... 

 

LT – Qual foi o critério para seleção dos poemas dos livros anteriores?

LACR – O gosto pessoal. Dito assim, parece simples. Mas foram meses de ansiedade, angústia, dilema, sofrimento, delícia. Nesse processo, mexe numa palavra aqui, burila um verso ali, corta um trecho, refaz um poema, mostra a uns poucos amigos, volta às dúvidas, à atenção total, à dispersão do resto do mundo, à vigília noturna, ao vai-vem de anotações, papéis rasgados, impressora, nova leitura, decisão, indecisão, versão final, ponto de partida, abandono, novos estalos, novos rascunhos, redação definitiva. Tudo inconcluso. E por aí vai.

 

LT – Qual a razão de não ter incluído nenhum poema de seu livro de estréia?

LACR – Logo vi que Tudo muito pouco foi só uma viagem. Eu tinha largado Engenharia Elétrica no finzinho. Fim dos anos 70, fiquei um ano e meio por aí. Fui do desbunde à macrobiótica. Me mandei para a Agronomia no interior, em Cruz das Almas. Os anos 80 avançando, e eu numa casinha no meio do mato, bosta de boi à vontade... Achei que estava suficientemente nu, inventei de fazer poesia a partir dos gritos dentro da cabeça. Depois, imprimi num volume todos os garranchos que escrevera, mas era tudo muito pouco. Rasguei quase mil livros e toquei fogo nos restos mortais, no quintal de casa, numa manhã nublada. Fui ler Pessoa e Drummond, e por dez anos tudo acabou.

 

LT – Uma década sem escrever. O que aconteceu nesse período? Fiat breu remete a esse momento?

LACR – Aconteceu um piscar de olhos. Dois anos de retorno à casa paterna, como um Buendía renegado num quarto dos fundos. A aproximação inaugural com meu pai e sua morte. Os 30 anos, o ingresso do jovem coroa na geração saúde dos adolescentes e o curso de Educação Física. A docência. Uma espiada de um ano em Medicina. O despertar, não para o trabalho, mas para a sobrevivência: concurso público, cargo público. O curso de Direito. A vidinha de todos nós misturada com o singular que é só meu. Sexo, que ninguém é de ferro. O descompromisso amoroso de toda a vida se alternando com paixões leoninas. Menos de um poema por ano em dez anos. E a avalanche poética a partir de junho de 1995. Agora, sim, poesia. Fiat breu.

 

LT – Essas vivências mudaram a noção que você tinha de poesia? Como você julga a qualidade de um bom poeta?

LACR – Vou dizer algo em linguagem direta: “Tentei fazer um poema, não consegui.” Agora vou dizer a mesma coisa (ou quase a mesma coisa) de outra forma: “Escavaquei o chão dentro de mim, lavrando em busca do cristal dos versos. Toquei no nervo lírico e senti a erosão evasiva do silêncio.” Mudou? Poesia é forma: ritmo, composição, metáforas, sugestão de imagens, pluralidade de sentidos, rigor de linguagem. Todo e qualquer tema. Conteúdo? Em poesia, o conteúdo é a forma. A fôrma é só circunstância: versos livres, medidos, rimados são escolhas por afinidade, não determinam o caráter poético do poema. A linguagem é a poesia. E não há o mau poeta. Há sim o não poeta, quase todos o são. Mas há bons e há melhores.

 

LT – Você é um exímio sonetista. Há explicação lógica para essa afinidade?

LACR – Havia um louco, um mulato jovem, gordão, em farrapos, com um furúnculo no abdômen, que vinha e ficava por muitas horas sentado à porta da casa de minha mãe, até que em certo momento defecava e ia embora, tudo em completo silêncio. Fizemos de tudo, mas nada o abalava. Pensamos em chamar o poder público. Meu irmão psiquiatra demoveu-nos da idéia: criaríamos um vínculo legal e, quem sabe, uma responsabilidade para com ele. Mesmo porque, um dia, sem que esperássemos, ele iria sumir, meu irmão nos garantiu. Pois assim foi. Assim sou eu. Sentei-me ao lado do soneto, estou ali. Ninguém entende idéias fixas, nem seu louco dono, não é mesmo? Um dia acaba.

 

LT – Qual o papel da educação escolar na sua formação de escritor? Acredita que o ensino de literatura nos dias de hoje piorou, que ele é responsável pela atual falta de prestígio da poesia, ou tudo continua como sempre foi?

LACR – Meu pai sofria de prisão de ventre, passava horas sobre o vaso, lendo livretos de faroeste e outras coisas. Todos os filhos pegaram a mania de ler. Fui com Monteiro Lobato, enciclopédia Conhecer em fascículos, super-heróis em quadrinhos, Jorge Amado, Hermann Hesse, bíblias e gitas. No 2º grau, uma visão das escolas literárias e seus autores, além da grande dúvida existencial do professor: quem é o melhor, Gonçalves Dias ou Castro Alves? Depois veio Dostoiévski, etc. Eu não sei o que é que a escola teve a ver com isso. Por outro lado, com o shopping center aberto até nos domingos e feriados, você não acha que está perdendo tempo falando de poesia? Ela está bem, onde sempre esteve, e não vai sair de lá.

 

LT – E você, também, não estaria perdendo tempo (risos)? Rimbaud se aproximou da poesia graças ao banco do colégio e a disposição de um professor. Não acredita na importância do ensino na formação de leitores e escritores?

LACR – Mas eles dois não trepavam? Ou melhor, foi o contrário! De tanto treparem com a poesia, sua relação virou uma trepada. Não creio que Rimbaud tenha chegado às musas via colégio e preceptor. Ninguém ensina poesia a um poeta, ninguém aprende poesia e vira poeta. Ainda mais se for um Arthur Rimbaud! Tenho um amigo que defende um currículo tão-só com três disciplinas: Letras, Números e Teatro. É o suficiente: representação. Ou seja: ler. Quiçá escrever.

 

LT – Quais os autores da tradição que mais aprecia? E contemporâneos?

LACR – Adoro essas coisas: classificação, ordenamento, taxonomia, cartesianismo. Nada igual a nada, mas tudo comparável. Valoração. Listar em ordem, do primeiro ao último, do general ao soldado, ou ao contrário, em direção ao clímax, ao poder, à glória. Não é uma delícia? Isso é alimento, que vai do ovo à maçã. Serei cronológico e bem avarento ao listar: Camões, Gregório, Bocage, Cecéu, Pessoa, Drummond. E Augusto dos Anjos desmedido. Todos eles contemporâneos. Há outros, claro: no penúltimo andar há bem mais moradores do que na cobertura. Se começar a citá-los, posso esquecer algum. Mas os vivos são poucos.

 

LT – A ordenação não implica uma adesão ao cartesianismo ou hierarquização. Se não há diferenças entre a produção canônica e a contemporânea, qual a razão de se negar a falar dos poucos vivos?

LACR – A poesia canônica é a contemporânea. A poesia contemporânea é a canônica. A poesia fundada não afunda, é perene. Petrarca é hoje, Baudelaire é hoje, “pois na poesia estou destacado do tempo.” Os contemporâneos ainda vivos são poucos mesmo. Mais de um poeta num século é exagero! Acho mais lógica a idéia de vários séculos sem um poeta. Tá legal, tá legal, não quero deixar você assustado com meus critérios, por isso faço uma concessão: o século XX, nesta avaliação, posso dizer que foi meio exagerado, tá legal?

 

LT – Bem, esqueçamos os relógios e nos voltemos para o espaço. Pensa que a literatura produzida na Bahia fica a dever aos demais estados brasileiros?

LACR – A poesia é tão rara, tão incomum, que nós termos Gregório de Matos, Castro Alves e Sosígenes Costa já é um assombro quantitativo. E poetas não surgem do nada. Essa tradição, associada a mestres de outras províncias, é garantia de continuidade. Baiano tem lábia, verve, imaginação, cartola de mágico, coelhos e pombas à vontade. De vez em quando me chega às mãos um livro. Há cearenses, pernambucanos, cariocas, nunca deixará de haver baianos. Na Bahia, apesar da cultura ágrafa que ganhou nossos becos, ladeiras, avenidas, lares e corações, ainda há quem lê e escreve, abrigado nas trincheiras do lirismo. Imagem batida de resistência? Creio mais que seja imagem de sonho.

 

LT – E que cultura ágrafa é essa?

LACR – Não digo nem sob tortura. Em minhas leituras enviesadas de livros e tudo, aprendi marotamente com o Tao Te King que o governante não deve alimentar o espírito do povo, mas os ossos. O Mestre deve ter pretendido dizer outra coisa, coitado, mas o que eu quis entender é que corpos nutridos e cabeças ocas são um resultado apetitoso. Para que contrariar? 

 

LT – Se fosse convidado para a Academia Brasileira de Letras, aceitaria?

LACR – Aceito ser qualquer coisa tirada a bacana: presidente, rei, papa, síndico, líder da turma, capitão do time, animador de auditório, mestre de cerimônia, bobo da corte. Só não serei destaque de escola de samba: apesar de baiano, exposto a toda sorte de barulho, eu detesto batucada. Mas não espere de mim, em tudo, grandes resultados. Nada além de canastrice. A não ser que eu esteja emocionalmente tomado. Nesse caso, minha ligação com a coisa passa a ser compulsiva, frenética, e consigo convencer como o canastrão-mor. Claro que aceito a imortalidade! Mas a fila é sempre grande. Tem muito escritor, historiador, professor, inventor, compositor, ator, imitador, enganador, bajulador, sem falar em governador, senador, desembargador, comendador, administrador, consultor, assessor, monsenhor, cardeal, general, maioral e o coisa-e-tal. Onde caberia o poeta? De Homero para cá, há um vazio que me cabe preencher...

 


Lima Trindade é mestre em letras pela UFBA, editor da revista eletrônica Verbo21 e autor dos livros Todo Sol mais o Espírito Santo (contos) e Supermercado da solidão (romance).

 

 Direto para página de Luís Antonio

Direto para página de Trindade

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Mais de 3.000 poetas e críticos de lusofonia!

 

 

 

 

 

Luís Antonio Cajazeira Ramos


 

Bolha de sabão

 

A Kátia Borges

 

The art of losing isn’t hard to master.

Elizabeth Bishop

 

Um dia perderei a juventude,

se já não a perdi. Perdi a conta

de tudo o que perdi. Hoje o que conta

é tudo o que não sou, não sei, não pude.

 

Ah, chega de trilhar a senda rude

de perdas e saudade. A sorte aponta

o lugar da vertigem, vida tonta.

Resta perder a sede de altitude.

 

Girar... e a cada giro perder tanto,

que reste apenas giro e inconsciência,

depois que tudo for perdido. Entanto,

 

deixar para perder a prepotência

no último momento, quando o espanto

revele que foi tudo reticência.

 

 

 

Na solidão do campo de narcisos

 

Deus criou o homem à sua imagem, plantou um jardim

no Éden oriental e aí colocou o homem que modelara.

Gênesis 1,27 e 2,8 (in A Bíblia de Jerusalém)


Eu não queria amar a quem eu amo,
mas rego a erva daninha que carrego:
descarrego o veneno de meu ego,
como escravo do amor, sobre meu amo.
 

E cresce da peçonha ramo a ramo
o amor, árvore bruta a que me apego
e cujo fruto me envenena, cego
a que ela vem do solo em que me acamo.
 

De árvore em árvore, o pomar assoma,
cruzam-se flores, frutos do desejo
dão novas árvores. E em tudo há sombra
 

do amor, seiva restrita ao próprio seio.
Lenho que em si é berço, lar e tumba,
eu sangro o amor que sangra de si mesmo.

 

 

 

 

Ao encontro

 

A Ennis Del Mar & Jack Twist

 

A vontade de muito amar invade

leve, para pesar como um defeito

encoberto e ora exposto, num sem jeito

de solidão vazia e de saudade.

 

O que era gozo é só banalidade

aos olhos nus do corpo insatisfeito.

O desejo desloca-se: arde o peito

uma dor impalpável, que não há de

 

revelar-se saciada no disfarce

das distrações do abismo. Sem saída,

não cabe à fome no jejum fartar-se,

 

mas ver na escuridão luz escondida,

pois o amor crava na alma uma catarse:

apenas dar-se com quem dê a vida.


 

 

 
 

Amar, verbo reflexivo

 

 

Eu não amo você, mas sua imagem

surge oportuna na invenção dos rumos

e irrefletidamente espelha a face

idealizada sobre meus escombros.

 

Você agora eu amo. E sobretudo,

entre nós dois, já não existe margem

para marcarmos nosso desencontro

do que em tudo de mim você faz parte.

 

Dói-me a dor sua. Vejo por seus olhos.

Meu anseio lateja de seus poros.

Nada em você que não de mim conheço.

 

Se estou todo em você, você em si

não vejo. Que alma estranha vive em mim:

jamais verei a quem eu mais desejo.

 

 

 

 

 

 

Ciranda 

 

O ser amado nunca vai embora,

mesmo que parta: o amor a tudo marca

e fica inteiro, mesmo que se parta

nas horas – não se aparta e não se evola.

 

Sua ausência é presença em todo aroma

que ora inflama um vulcão de carne e brasa,

ora exala uma pétala de calma,

ora sufoca o sopro e envolve em sombra.

 

Um amor que se esgota nas estrelas,

um que se vai na crina das quimeras,

um que o luto seqüestra e não mais livra

 

– os amores se vão. Mas não se vão

uns por outros ocultos: mão a mão,

eu amo cada amor que amei na vida.

 

 

 

Camões carnívoro

 

Busque Amor novas artes, novo engenho.

Luís de Camões

 

Seu puro coração de sonho crê

guardar em calma minha sede ambígua

com carícias de amor, na mais contígua

companhia e unidade: eu e você.

 

Lá fora a solidão definha à míngua,

alma minha gentil... E ninguém vê,

cara, vem não sei como um não sei quê

de dentro e acorda a mágica da língua

 

na palavra de seda e fogo: dê

de sua carne à minha carne amiga

a polpa suculenta, a fim de que

fartemos nossa fome mais antiga.

 

Abocanho voraz seu colo quente...

Agora somos um completamente.

 

 

 

 

 

Soneto voraz

 

Eu tenho gula de você em tudo

tenro que haure os sentidos. Por exemplo,

ao comer ostras vivas, esse templo

do deus bivalve em qual calor exsudo.

 

E gana de você em todo agudo

ser que exaure a emoção, como o momento

em que apalpo o molusco vivo e tento

sorvê-lo, deus de bilabial escudo.

 

E sanha de você enquanto estudo

o que exaspera o senso, e me concentro

na captura final, no escuro centro

da concha, no entra e sai do deus peludo.

 

Ergo senso, emoção, sentidos, falo

do deus em que me farto e me regalo.

 

 

 

 

Sol de nuvem

 

Outros olhos e os mesmos: o amor

diverso e idêntico no azul do peito.

Ruy Espinheira Filho

 

Nenhum olhar havia em teu olhar

que não fosse de nuvens sobre o Sol.

Um sol incógnito entre nuvens – tu,

depois que tudo passa, permaneces.

 

Enquanto multidões que te soterram

revolvem-se à procura de si mesmas,

eu cismo num torrão de balaustrada

o castelo de nuvens que desejo:

 

um soldado de chumbo, um potro alado,

um cisne arisco, um quase girassol

na solidão do campo de narcisos.

 

Qualquer céu é lembrança de teu beijo.

As nuvens se dispersam, todo o azul

revela o Sol em ti. Mas tu és nuvem.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Câmara Municipal de Salvador

Academia de Letras da Bahia

convidam para o lançamento do livro

 

 Mais que sempre

do poeta

 

 Luís Antonio Cajazeira Ramos

Data: 11 de maio de 2007

Horário: A partir das 18 horas

Local: Academia de Letras da Bahia

Palacete Góes Calmon

Av. Joana Angélica, 198

Nazaré - Salvador - Bahia