Do
Círculo Hermenêutico Periférico
ou
Da
Introdução aos Símbolos
Soares Feitosa
5.
Da história melhor
contada
É
fundamental renovar a advertência: esta análise nada tem a ver com a realidade. Têm a ver, sim,
com a
"história melhor contada", que é aquela, verdadeira ou
não,
mais fortemente atrelada aos "símbolos", e, por isto
mesmo, prevalecente.
Antígona, proibida pelo rei, Creonte, de enterrar o
corpo do irmão, diz que
aquela proibição não lhe traz valia alguma, porque, por sobre,
pré-existiria uma outra "lei" muito mais forte; inarredável, a lei do
culto aos mortos, sobretudo aos parentes. Antígona paga o desaforo
com a própria vida, mas aquilo que disse há muito mais de 2.000 anos continua tão
atual quanto naquele tempo.
De
fato, em qualquer acidente grave, com morte em lugar inóspito ou de
acesso remoto,
gastam-se rios de dinheiro a identificar rebotalhos humanos, que, mais prudente e racional seria enterrá-los
lá mesmo. O esforço da identificação atende, é certo, ao direito
familiar, heranças, essas coisas. Mas atender primordialmente à
necessidade inarredável de ter, a família, tal qual Antígona, os restos do morto, a lhe
prestar homenagem.
A
coisa chega a níveis de absoluta irracionalidade, como no acidente
da Plataforma P-36, que mergulhou ao fundo do mar levando consigo nove
operários. Um Juiz Federal determinou, sob pena de pesada multa e
prisão, que a Petrobrás mandasse içá-la, não para recuperar a sucata
de altíssimo valor, mas para garantir o funeral das vítimas. A
diligência somente não veio a ser atendida, custasse o que custasse,
porque demonstraram em juízo que (ainda) não existe tecnologia capaz
de trazer à tona uma plataforma de milhares de toneladas de ferro e
aço, sob uma profundidade de 3.500 metros de mar abaixo, ou mais.
Os restos mortais daqueles operários não teriam mínima serventia,
nem à ciência, nem ao inquérito de engenharia e normas de segurança,
nem a nada; mas fundamentais a
atenderem àquele imperativo retratado por Sófocles em Antígona. Os
vivos haveriam de dizer, cobertos de pranto, ainda que o caixão
lacrado, esterilizado, intocado, impossível de ser aberto, tamanho o
risco de contaminação: «Eis a nossa carne; este, o nosso
sangue».
Veja o grito da jovem Antígona contra o rei, no direito de
enterrar o (corpo do) irmão morto, que o tirano mandara apodrecer aos cães e
abutres:
[...] e não
me pareceu que tuas determinações tivessem força
para impor aos mortais a obrigação de transgredir
normas divinas, não escritas, inevitáveis; não é de
hoje, não é de ontem, é desde os tempos mais remotos
que elas vigem, sem que ninguém possa dizer quando
surgiram. [...] (Antígona,
Sófocles) |
A
"verdade" do rei Creonte poderia até ser muito boa, razões de Estado,
a punir o sobrinho (Polinice) que o traíra; a punir a jovem que o
desobedecia (Antígona). Há quem defenda as famosas razões de Estado.
Antígona
trabalhava com um simbólico mais verdadeiro, mais "intra-nós-todos"
que as tais fortíssimas razões de Estado. De fato, lei alguma
garante pranto aos mortos. O Código Penal Brasileiro, em seus
artigos 209 a 212 não tipifica como crime o não-cultuar os mortos.
Ninguém será chamado ao tribunal porque não fez, à altura de suas
posses, o enterro de um parente; nem lhe mandou erigir templo de
marfim. Nem porque tenha caído na farra logo após a morte de
pai-mãe. [Se é doido e... amaldiçoado? Claro que é!]
Uma lei muito velha, que, de tão lei que sempre foi,
permanece no âmbito das leis não escritas, é que levou voz e força à atitude de Antígona. Apesar do
édito real, ela tinha que enterrar o (corpo do) irmão. O corpo do
morto não era para ela (nem para o parente que fica) apenas um
corpo, mas o irmão, o familiar, pai, mãe, noiva, esposo, ainda que morto. Enterrou-o. E morreu. E
provocou uma série de outras mortes. Tragédia: encanto, lição
e catarse. E que lição!
Antígona é apenas uma história saída da imaginação de um
poeta, Sófocles. Não obstante, porque fundada nos mitos mais
poderosos, ganha foros de história-verdadeira: Antígona agiu.
Antígona morreu. Não; Antígona existe! Antígona vive!
O
simbólico, em essência, é isto: a ligação preferencial com uma linhagem tão longínqua que ninguém consegue
ajuntar-lhe os apontamentos.
O que
seria, então, a história-verdadeira?
A história-verdadeira não me parece ser a história mais fácil, mais verossímil, como
o queria o monge medieval Guilherme de Ockham [1285-1349] em sua
famosa "navalha": «Pluralitas non est ponenda sine neccesitate».
Em livre tradução feitoseana: «Nunca complique sem necessidade».
Para
Ockham, a história-verdadeira seria preferencialmente a menos
complicada. Mais fácil, portanto, um boi a andar sobre suas quatro
patas do que um boi a voar às janelas, assim entendia o monge Ockham. Contudo, entre relatos de bois voadores e o delírio de
quem conta semelhantes potocas, melhor encaminhar o narrador à clínica
de alucinados, desde quê... Cuidado! Você corre risco de morte. Não
saia por por aí a dizer que profetas não voam.
Claro
que os bois voam! Sim, os profetas verdadeiros atravessam rios cheios, secos a um simples toque de suas
vestes santas, vide Elias, vide Eliseu, vide
Maomé. Com o máximo do respeito máximo, é claro! Afinal, o catálogo das
coisas implausíveis, dadas como verdadeiras, é praticamente infinito. Repito,
faço questão: com o máximo respeito! Amém.
6.
Da culpa: se culpados
são os símbolos...?!
Tenho
que a história-verdadeira, complicada ou não, é aquela melhor
contada, porque a melhormente atada aos mitos da
ancestralidade. Se verdadeira ou não, por favor, nada tenho a ver.
A minha "leitura" é sobre os mitos; e sob os mitos. Só isto.
Neste ponto,
indaga-se:
— Os
símbolos, se eles é que seriam "culpados"... então, não existiriam culpados?!
Muito fácil
agora botar a culpa nos símbolos do Partido dos Trabalhadores por
tudo que lhe acontece neste agosto de 2005, não?! Então, os
problemas do Banco do Brasil nada tiveram a ver com seus gestores,
clientes e acionistas, mas tão-só com o seu símbolo sinistro?!
Quem sabe, uma
simbiose: os símbolos inadequados a atrair pessoas inadequadas, que,
por sua vez, assumem-se da inadequação do símbolo. Da mesma
forma, o seu oposto: os símbolos bons a atrair augúrios favoráveis, que, por
sua vez...
Apenas conjecturas!
Quero, do alto de minha mente racional, funcionário público
concursado e aposentado em tempo completo; e de advogado
militante, descrer nexo em tais
fantasias. Não! Não as creio. Mas, as coincidências...?!
Se existem?
Conclua você mesmo.
Em
tempo: Antígona, de Sófocles, um pequeno volume em versos, pouco
mais de 50 páginas, é livro para ser lido, relido e treslido. Tem a
força do Evangelho de Mateus a nos pôr em contato com os valores
pré-fundados do Humano. Pretendo demonstrar ligações que
praticamente permanecem secretas em seus quase 2.500 anos de existência.
Uma obra superlativa. Sófocles, o Poeta! Profeta e sacerdote! Será o
último capítulo deste ensaio.
7.
Do símbolo sinistro do
Banco do Brasil
Fui do Banco do Brasil, ano
de 1965, Quixadá, Ceará, num tempo anterior ao símbolo atual. Fizera,
à mesma época, aos 21 anos, concurso ao Banco do Brasil e Fiscal do Consumo, em ambos
aprovado. O Banco
chamou-me de imediato.
A glória de ser bancário do Banco do Brasil,
o sonho de todo jovem de então. Não é mais. Baixos salários, com o agravante do risco de assaltos, que, àquele
tempo, só nos filmes
de bandido e mocinho. Rara a semana em que funcionários e suas
famílias, do BB, não caem reféns nas mãos de bandidos. Mortes?
Muitas!
Pior,
o Banco do Brasil já quebrou diversas vezes, não tendo ido à
falência, assim o noticia a imprensa, unicamente porque o Tesouro o
socorreu com inversões maciças de capital. E os escândalos! O da
«Mandioca», em Serra Talhada, Pernambuco, com mortes, inclusive a de
um Procurador da República e prisões. Muitas prisões, dizem que até
mesmo de inocentes. E o do «Adubo Papel», RS. E
muitos e muitos outros.
E agora a estreita vinculação do BB, assim
informam os jornais, com o "mensalão", depósitos e saques
do senhor Marcos Valério, aliás, um símbolo novo sobre este: senhor
Marcos
Valerioduto!
Verdadeira ou não a vinculação — volto a repetir, não tenho
compromisso com a verdade, mas tão-só com os "registros" da opinião
geral e sua ligação aos símbolos.
Noticiam os jornais que o presidente de uma das CPIs,
Senador Delcídio, encontrou-se com o Ministro da Fazenda a cobrar
providências contra aquele que já foi o símbolo mestre da excelência
administrativa no Brasil. É que o antes eficientíssimo Banco do
Brasil não teria mandado os papéis
solicitados há mais de dois meses, tarefa normal de poucos minutos,
sobretudo hoje, todas as operações informatizadas, disponíveis a um
simples enter do computador.
Em
seus quadros, pessoas de altíssima responsabilidade. E capacidade.
Mas, o símbolo...
Bom, o
símbolo... o que teria ele de mau/mal?
Leia-o, meu caro leitor. Se puder "lê-lo".
Anote o que tiver para anotar. Não
tenho certeza se o símbolo do BB é do meu tempo de jovem bancário na
cidade de Quixadá, 1965. Se não, veio logo depois. Até já lhe
busquei a história, mas perdi as anotações. Acho que é do tempo de
Nestor Jost, concurso nacional, com rica premiação.
Belíssimo,
elogiado por todos. Mas...
A
primeira vez que o vi, não me fez bem.
Deve ter sido uma das minhas primeiras "leituras", ainda num tempo
em que me limitava a gostar ou desgostar. Ainda é assim, gosto ou
desgosto, "de ouvido", como se fosse — no á-tê-ó-tó! —, mas já consigo,
quase sempre, verbalizar razões.
Repito: o símbolo não é aquilo que o publicitário Duda Mendonça,
competentíssimo, diga-se de passagem, diz que seja; nem aquilo que
ele intencionou que o fosse. O símbolo é que aquilo que representa
sob arquétipos mais fortes.
Como saber se o símbolo realizará a tarefa que lhe foi proposto pelo
seu criador? Como
saber se, pelo contrário, porá tudo em prejuízo? Já disse que o desenhista está inocente. Sim,
está inocente, isto eu garanto. Por outra, desconheço o mecanismo de produzir um símbolo ótimo
ou produzi-lo péssimo. O do BB, para
mim, apesar da montanha de elogios que sempre escutei, é péssimo.
Maligno.
Também
nada sei dessa estranha arte de lê-los. Jamais a busquei. Nenhuma
especialização. Nunca pus os pés na calçada de uma escola de arte,
desenho, publicidade, comunicação, arquitetura ou lingüística.
8.
Do símbolo terrível do Banco do
Nordeste
Não se
contesta um símbolo com argumentos lógicos, nem com a verdade dos
fatos. Contesta-se um símbolo com outro símbolo, desde quê...
Recentemente, o Cardeal Arns, São Paulo, Brasil, deu uma entrevista
à revista Veja comentando acontecimentos da época da revolução: «De
nada adiantaria os generais dizerem cobras e lagartos contra a
Igreja... ninguém acreditaria».
É que a Igreja, mercê de seus
símbolos, formara um patrimônio tal de integridade, que, defendesse
água de serra acima ou bois voadores,
ainda assim, todos acreditariam, ou, no mínimo ficariam calados.
[Ficar calado... o comportamento de Ismênia, a irmã de Antígona, um
símbolo extra-forte, o supremo símbolo do sobre-viver, assim mesmo,
hifenizado, matéria
a ser
examinada mais adiante.]
Aproveito a viagem para colocar aqui o símbolo do Banco do Nordeste.
Coisa de uns 12 anos, acho que da administração de Byron
Queiroz. Uma pessoa correta, que só problemas
teve
nesse Banco. Problemas e mais problemas. Levou-os ao
Banco? Ganhou-os lá? Reciprocou, levando-os, ganhando-os? Gravíssimos!
Ainda hoje Byron carrega uma
montanha de processos judiciais nas costas, diz a imprensa. Se são
justos ou injustos, nada tenho a dizer. Digo-o do símbolo do Banco.
Também
não quebrou, registram os jornais, graças aos recursos do Tesouro, via FNE, mas suas ações já não têm nem rastro do prestígio que tinham ao tempo
do símbolo anterior.
Em Recife, PE, havia uma turma de
advogados — notícias dos jornais — de maçarico em punho, prontos para
arrombarem o cofre do banco à noticia de qualquer depósito em dinheiro.
Tudo com base em sentenças
judiciais, o banco trabalhando sem um centavo de esmola. Em
Fortaleza, também não se fez por menos. Até moedas foram
apreendidas, os senhores caixas correndo com os patuás de troco, os
oficiais de justiça no encalço, pega-não-pega! Cenas terríveis, nos
jornais quase todos os dias.
E
agora a imagem arranhada pela cueca do dirigente do PT. De fato, cada vez
mais
o Ministério Público estreita a acusação de que os dólares cuecais
pertenceriam a pessoas ligadas à Diretoria do banco.
Se é verdade, se
é mentira, por favor, nada tenho a respeito. Tomo o símbolo e faço-lhe a
ligação. Só isto.
Vejamos o que o
banco tem a dizer sobre seu belo logotipo.
Sim, muito bonito! Acima, quatro demonstrações. A primeira, em seu
completo; a segunda como papel de timbre; a terceira, o seu
rascunho-desenho e quarta uma derivação estilizada ao departamento
cultural. Transcrevo as palavras do BNB, a partir de sua page:
O Banco do Nordeste tem agora uma nova programação
visual, mais bonita e moderna, com as cores dos Estados
nordestinos e capaz de refletir todo o processo de
modernização que vem ocorrendo no Banco.
O resultado reflete um novo Banco do Nordeste, que se
transforma cada vez mais para melhor servir o Nordeste.
O Símbolo
-
O Nordeste: o quadrante ocupado pelo feixe em leque,
na área superior direita do círculo.
-
Os 10 estados onde o Banco atua: representados pelo
número de faixas do leque.
-
As cores das bandeiras do Nordeste (vermelho, azul e
verde): cores que estão presentes na maioria das
bandeiras dos estados do Nordeste. São também as
cores
tradicionais das jangadas.
O dinamismo, expansão e crescimento: pela expansão
do leque Nordeste.
Uma nova marca - um novo Banco.
A escolha do vermelho como principal cor transmite
vida e agilidade, agressividade e competitividade,
urgência e renovação.
O nome Banco do Nordeste: transmite a
essência da identidade da instituição. É "Banco" e é
do "Nordeste".
|
Sem
dúvida, belíssimas imagens. Terríveis, porém. Leia-as,
se consegue "lê-las". Na página seguinte,
confira-as.
Índice - basta clicar:
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Início desta desta página: Do Círculo Hermenêutico
Perifério ou Dos Símbolos — Prólogo e proposta.
-
O
Partido dos Trabalhadores e sua crise de 25 anos, algo a ver com
os símbolos?
-
Os símbolos
do PT, decifrações.
-
Os
símbolos de Severino Cavalcanti e sua crise mensalinha.
-
Os símbolos do Banco do Brasil e do Banco do Nordeste
-
Decifrando os símbolos do BB e BNB
-
Ascensão e queda de Roberto Jefferson — símbolos: o riso,
as palmas e o silêncio.
-
Mais
símbolos, os varapaus da Bíblia
-
Clique na figura:
decifração dos símbolos do BB e BNB
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