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Geraldo Peres Generoso
Desafio
João Coletto: Eu não sei qual
é o teu nome,
Nem estou interessado,
Mas pelo que me parece,
Nem sequer foi batizado,
Nunca vi ninguém mais feio
Antes de ter te avistado.
Zé Mota : Sou chamado de Zé
Mota
Hás de pagar alto preço.
Tomaste a mão pelos pés
Eu também não te conheço;
Não quero saber quem és,
Nem quero teu endereço.
Coletto: Meu endereço não
dou,
Pra marmanjo como tu,
A minha casa é o mundo,
Cujo teto é o céu azul,
Mas sei que é ao matadouro
Que rodeia o urubu.
Mota : Urubu é o rei dos
ares,
De ninguém vigia o sono;
Como carne todo dia
E não os restos do dono,
És um cachorro sarnento
Ao relento no abandono.
Coletto: Não insulte a bela
ave
Em te comparar a ela,
A tua feição espanta
Até mesmo sobre tela,
O teu canto é um crocitar
De mau agouro à janela.
Ele estava convencido
Que ia me derrotar,
Foi então logo dizendo:
“Eu quero mesmo é apostar,
Mas nem dinheiro pra esmola
Tens aí em teu piquá.”
Respondi-lhe no repente:
“- Aposto qualquer quantia,
E se vivo humildemente
Não é por economia;
Se perder pago contente
E disso dou garantia !.”
Mota: Não fique só nessa
prosa,
Que prá mim é safadeza,
Abra logo essa sacola,
Bote o dinheiro na mesa,
Ou então não se acanhe
De expor sua miudeza.
Coletto: Aqui está o dinheiro
Que trago nesta viagem,
É o fruto do meu trabalho,
Não, de rolo, ou agiotagem,
Aqui estou com um milhão,
Pode fazer a contagem.
Ficou um tanto sem graça,
Mostrou desapontamento,
Arrancou do bolso um maço,
Contando só deu quinhentos,
O povo que assistia
Vaiou-o nesse momento.
Mota: A aposta é de um
milhão?
Tenho aqui quinhentos mil,
Do restante faço um cheque
Ouro, Banco do Brasil,
Tenho certeza que voltas
Com o teu piquá vazio.
Coletto: És nada mais que um
papudo,
Pouco toca nada canta,
Deixe de contar vantagem
E roncar essa garganta,
Tu és somente um terror
Em hora de almoço e janta.
Mota : Eu como bem no jantar,
Melhor ainda no almoço,
Como igual um lobisomem,
Tenho estômago de moço;
E se você pouco come
É por ter vazio o bolso?
João Coletto: Pondo o
dinheiro na mesa,
Já lhe provei o contrário,
Garanto minha despesa
Com o meu próprio salário,
Eu não sei o que é dever,
Nem empréstimo bancário.
Mota : Encontraste neste trem
Tua mais dura derrota,
Tenho certeza que estás
Perdido na tua rota,
Pois inteiro, tu nás dás
A metade de um Zé Mota.
Quinhentos mil era a aposta,
O cheque não aceitei,
Peguei então o excedente
E no embornal guardei,
Tomando então da viola
Novamente a afinei.
Mota: João Coleto, o desafio
Prá você levou à breca,
Está tremendo de medo
No braço de tua rebeca,
Garanto até que sujou
Sua esfarrapada cueca.
João Coletto: Isto é apelação
De derrotado que abusa,
Depois de hoje o derrotar
Te mando embora sem blusa
Pois pelo que me parece
Nem cueca você usa.
O povo então bateu palmas
Numa grande ovação,
Zé Mota ficou furioso,
Arroxeou de feição,
Deu um pulo para a esquerda
E partiu para a agressão.
Porque era de mais idade
Da luta eu quis poupá-lo,
Mas ele veio com tudo
Avançando como um galo,
Apliquei-lhe um piparote
E então fiz por afastá-lo.
O velho deu um pinote,
Vindo em minha direção,
No que aparei-lhe o bote
Devolvi-lhe um safanão,
Apliquei-lhe um piparote
E ele estalou no chão.
Sendo, pois, de mais idade,
Confesso, até quis poupá-lo,
Mas por questão de hombridade,
Tive, afinal, que enfrentá-lo,
Rebati com habilidade
O seu coice de cavalo.
A encrenca estava formada
E não havia outro jeito;
Abri a camisa listrada,
Zé Mota fez um trejeito
Quando uma cruz pendurada
Ele avistou no meu peito.
Levantou-se, à mostra o rabo
Avantajado e peludo
Fez-me ver que era o Diabo
Aquele ser carrancudo
Mas diante da cruz bendita
Quedou-se paralisado.
Deu um estouro e sumiu,
O trem ficou infestado
Com forte cheiro de enxofre
E odor de chifre queimado,
O vagão ficou vazio
E o povo foi dispersado.
Risquei na viola um ponteio
Que aprendi quando rapaz,
Na Fazenda Santa Rosa,
Com o Aparecido Vaz,
E enfim vi vitoriosa
A luta com Satanás.
Com protesto dos presentes,
Guardei a velha violinha,
Arrumei a minha mala
E outros pertences que tinha,
Despedi-me do pessoal
E rumei para a terrinha.
Nunca mais viajei de trem,
Mas da viola não deixo,
Embora naquele duelo
Eu senti tremer o queixo,
O Senhor foi o meu Guia
Do início ao desfecho.
Voltei para a minha terra,
O lugar em que nasci,
Não há nem longe nem perto
Um lugar igual aqui,
Este paraíso aberto
Que se chama TIMBURI.
Tem matas verdes e o rio,
Sem poluição a rodar
Por serras durante o estio,
Sem chuva nunca faltar,
Terra de gente de brio
Que faz desta terra um lar.
É um orgulho ter nascido
Em terra tão dadivosa,
Lugar de hospitalidade,
Do que espinho, tem mais rosa,
Terra que nos traz saudade
Cantada em verso e prosa.
E se poeta não sou,
Prá levar a esta Nação
O nome de Timburi
Em verso ou numa canção,
Desculpas não posso ter
Na falta de inspiração.
Sou nesta terra nascido,
Aqui a infância passei,
Tudo foi-me oferecido
Prá ser um poeta de lei,
De todos é o mais querido
Chão que no mundo pisei. |
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