Joaquim Cardozo
A Escultura
Folheada
Aqui está
um livro
Um livro
de gravuras coloridas;
Há um
ponto-furo. um simples ponto
simples furo
E nada
mais.
Abro a
capa do livro e
Vejo por
trás da mesma que o furo continua;
Folheio as
páginas, uma a uma.
- Vou
passando as folhas, devagar,
o furo
continua
Noto que,
de repente, o furo vai se alargando
Se
abrindo, florindo, emprenhando,
Compondo
um volume vazio, irregular, interior e conexo:
Superpostas aberturas recortadas nas folhas do livro,
Têm a
forma rara de uma escultura vazia e fechada,
Uma
variedade, uma escultura guardada dentro de um livro,
Escultura
de nada: ou antes, de um pseudo-não;
Fechada,
escondida, para todos os que não quiserem
Folhear o
livro.
Mas,
prossigo desfolhando:
Agora a
forma vai de novo se estreitando
Se
afunilando, se reduzindo, desaparecendo/surgindo
E na capa
do outro lado se tornando
novamente
Um
ponto-furo, um simples ponto
simples furo
E nada
mais.
Os seres
que a construíram, simples formigas aladas,
Evoluíam
sob o sol de uma lâmpada
Onde
perderam as asas. Caíram.
As linhas
de vôo, incertas e belas, aluíram;
Mas essas
linhas volantes, a princípio, foram
se
reproduzindo nas folhas do livro, compondo desenhos
De fazer
inveja aos mais “ sábios artistas”.
Circunvagueando, indecisas nas primeiras páginas,
À procura
da forma formante e formada.
Seus vôos
transcritos, “refletidos” nessas primeiras linhas,
Enfim se
aprofundam, se avolumam no vazio
De uma
escultura escondida, no escuro do interno;
Somente
visível, “de fora”, por dois pontos;
Dois
pontos furos: simples pontos
simples furos
E nada
mais.
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