Mais de 3.000 poetas e críticos de lusofonia!

Luiz Carlos Lemos

 

luzcar@oi.com.br

Thomas Colle,  The Return, 1837
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Poesia:


 

Crítica, ensaio, resenha e comentário:

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Fortuna crítica:

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Uma notícia do poeta: 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Velazquez, A forja de Vulcano

 

Sandro Botticelli, Saint Augustine, Ognissanti's Church, Firenze

 

 

 

 

 

 

 

 

John William Godward (British, 1861-1922), Belleza Pompeiana, detail

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Luiz Carlos Lemos

 

 

entre-aspas

 (para Soares Feitosa)

 Poeta,

"nas calendas de junho, (entre)
poetas negros da África negra de onde viemos, 
planta-se o distante,
grande armazém de poesia".

 

É como uma cidadela contra o esquecimento
o preço da alma,
eterno tributo e resgate.

É digitar um Navio, 
atualizar-lhe a orthographia 
de um livro velho, 
como se o recitasse aos berros...

E o coração (treme),
como quem pega um canário com as mãos
depois de alguns segundos
extraídos da eternidade.
(Freme), como um corisco selvagem 
que ninguém sabe donde veio!

De dentro do chão,
em língua portuguesa e para o mundo:

             ...Stamos em pleno mar!"

 

Emocionado, deveras, Luiz Carlos Lemos. 

(aprendiz de aprendiz)


Nota do editor:

O poema acima, dos inícios do JP, dos começos da Internet no Brasil (1966, mais ou menos), toca-me com muita emoção. Veja aqui a história do JP

Soares Feitosa

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Allan R. Banks (USA) - Hanna

 

 

 

 

 

 

Luiz Carlos Lemos

 

 

Patativa do Assaré,

A Voz que (ainda) Canta o Sertão!

 

                                    

Amigo Leitor, os dias

De hoje são diferentes.

Ainda temos repentes,

Ainda temos Cordel.

Ainda existe alegria

De se ler boa poesia

Escrita em bom papel.

 

Porém, o que tem mudado

Eu falo aqui, sem temor,

Não é o som, nem a cor

Da arte de antigamente.

É a ferramenta, Doutor

O tal do computador

Que faz as coisas pra gente!

 

Não se escreve mais à mão,

Nem com Datilografia.

Findou-se, pois, a magia

Do artesão-escritor!

Por um bom tempo eu lutei

E quase que recusei

O tal do computador!

 

Mas, enfim, ele venceu

E eu me rendi, conformado.

E um Cordel -  digitado! -

Escrevo, neste momento.

Pois estaria isolado

Se tivesse recusado

Utilizar este invento.

 

Portanto, eu me assento

Em frente ao computador,

Com a missão de expor

Uma estória verdadeira.

Peço a Deus proteção

E também a inspiração

Pra minha rima rasteira.

 

E a tarefa é pesada,

De responsabilidade.

Precisa seriedade,

Pra não mentir, na missão.

Pra dizer bem a verdade,

Mentira é calamidade

De que não faço questão.

 

Mas eu começo com fé

Que dou conta do recado.

Já rezei, “tou” preparado

Para “o que dé e vié”.

Vou falar do afamado

Poeta, que foi chamado

“Patativa do Assaré”.

 

Começando do começo

Quando nasceu Patativa?

Sua fama inda é viva,

Ser verso é o melhor!

Sua poesia é tão linda,

Que o povo se lembra ainda!...

E menino sabe de cor!

 

Foi na Serra de Santana,

Município de Assaré

Que esse poeta de fé

Saltou pra luz, nun repente.

O estado do Ceará

Muito se orgulhará

Do  poeta, eternamente!

 

No dia cinco de março

De mil novecentos e nove.

O povo, então se comove

Com o brilho daquele dia.

Mas não podia saber

Que estava vendo nascer

Um Menestrel da Poesia!

 

Naquele dia nasceu

Um forte e belo menino.

Na igreja tocou  sino,

Como  fosse dia santo!

E no choro, parecia

Que o menino dizia:

“Escutem todos, meu canto!”.

 

“Eu acabei de chegar

Nascido nesse Nordeste.

E sou um cabra da peste!

Uma promessa eu faço:

O mundo que me aprove,

Pois a vida me comove...

Vou ser poeta, no braço!”

 

“Eu vou cantar o sertão

Com a força do meu verso!

E o Rei do Universo

Me ajude, por caridade.

Vou cantar em verso nobre

A desventura do pobre

Sem faltar com a Verdade!”

 

Antônio Gonçalves da Silva

Foi na Pia batizado.

O padre disse, assustado,

Para a mãe de Patativa:

Eita, que choro danado!

Vai ser poeta, o safado,

De poesia criativa!

 

O pai, de nome Seu Pedro,

Não ficou muito contente:

“Vai ser poeta? Ô xente!

Mió sê trabaiadô!

Essa vida é uma briga

Poesia não enche barriga

Isso é  coisa de dotô.”

 

Mas a mãe, Dona Maria

Disse: “Deus sabe o que faz

Deixa o menino em paz

Móde sê o qui quisé.”

Selava assim o destino

Daquele feliz menino

Patativa do Assaré!...

 

E o Antonio menino

Cresceu ajudando os pais.

Não recusando jamais

O seu duro dia-a-dia.

Trabalhava  ele na roça,

Morava em uma palhoça,

Mas sempre com alegria!

 

Aos quatro anos de idade,

O nosso pequeno artista

Fica cego de uma vista,

De um mal chamado “dordói”.

Mas a tudo ele resiste

Pois da lida não desiste

Quem já nasceu pra herói.

 

Continua seu trabalho,

Sua vidinha na roça.

Porem sua língua coça

De vontade de versar.

“Se óio pra qui pra li

Vejo um verso se buli”,

Viria ele a cantar.

 

Mil novecentos e dezessete

Ele, com oito anos,

Passa por desenganos

Da sorte e triste vai,

Com a mãe e os irmãos,

Todos, juntando as mãos,

Ao enterro de seu pai.

 

Falecia, assim,  Seu Pedro

De quem tanto ele gostava.

E Patativa chorava,

Tomado de emoção.

Ao mesmo tempo, rezava

E ao povo todo ele dava

Exemplo de bom cristão.

 

Logo depois, a má sorte

Novamente lhe alcança.

Ele, ainda criança...

E a mãe,  morreu de repente.

Saudosa Dona Maria!...

Mas eles, com valentia,

Tocaram a vida pra frente!

 

O Nordestino é assim:

Um forte, por natureza.

Mesmo em grande tristeza

Não se abate, e vai com fé.

A força mais se aviva!

E assim foi com Patativa,

O Poeta do Assaré.

 

Os doze anos contava

Quando na escola entrou.

Só quatro meses ficou,

Devido sua pobreza.

Pois nem à escola primária

A classe minoritária

Tem direito, com certeza.

 

Mas esse tempo de estudo

Foi, pra ele, de valia.

Rapidamente aprendia

As letras do ABC.

Nesse tempo, ele já faz

Alguns versinhos banais,

Para a professora ver!

 

E ele, pra conseguir

Um sucesso tão marcante,

Teve um bom ajudante,

Facilitando o trabalho.

Estudou e deu valor

Ao  livro do Professor

Felisberto de Carvalho.

 

Começa assim, nesse tempo,

A carreira do poeta.

Sua alma inquieta

Sempre buscando a Poesia.

Nas festas da redondeza

Declamava, com beleza,

Já dando ao povo alegria.

 

Nesse tempo ele já lia

Poesia de Cordel.

“Na casa dos Coronel

Lia tudo o que achava”.

“Apois, então, muito bem

Eu posso fazer também!”

Já Patativa pensava.

 

E começou a escrever

Guardando o seu rabisco

Para não correr o risco

De sua obra perder.

Escrevia com emoção,

Falando sobre o sertão,

Onde adorava viver.

 

Só pra citar um exemplo,

Num poema, ele dizia:

“Eu sei que minha poesia

Já nasce do coração.

Não canto as coisa impussive,

Eu canto as coisa visive

Do meu querido sertão”.

 

E continua o poeta,

Com sua simplicidade

Dizendo só a verdade,

Pois quem não mente, não erra:

“Assim que eu óio pra cima

Vejo um dilúvio de rima

Caindo in riba da terra”

 

No ano de  vinte e cinco,

Ele, já quase homem feito,

Fez um negócio direito

E ficou todo pachola.

Vendeu uma cabra, um dia,

Apurou uma quantia

E comprou uma viola!

 

E começou a cantar!

Com a violinha na mão,

Percorria a região,

Fazendo e cantando verso.

Viajava sempre a pé,

Contando com sua fé

No Criador do Universo.

 

Nesse tempo ele faz

Sua primeira viagem.

Conhece nova paisagem

Que jamais esquecerá.

Com o primo Zé Montoril,

Vai conhecer o Brasil

Lá em Belém do Pará!

 

Ficando por cinco meses

Naquelas terras do Norte,

Conhece, com muita sorte,

Zé Carvalho, um jornalista.

Que lhe diz com voz ativa:

“Você nasceu Patativa

É o seu nome de artista!”

 

Patativa logo aceita

E muito gosta do nome.

No entanto, ele diz: “Home,

Não esqueço meu lugar.

O nome bonito é...

Mas, Patativa do Assaré

Eu passo a me chamar.”

 

E assim, nosso poeta

Em todo lugar chegava.

E o povo o aclamava

Dizendo: “Esse é que é

O poeta  arretado,

Que pelo povo é chamado

Patativa do Assaré!”

 

Nesse tempo também,

Se bem me lembro e não erro,

Ele anda de trem de ferro,

Alegre, feito criança.

Pra percorrer o Estado,

Ele vai aboletado

No trem da Belém-Bragança!

 

De volta ao Ceará

Continua a sua luta.

Na roça, tem a labuta.

À noite, escreve poesia.

Conhece, ainda pequeno,

A um Juvenal Galeno,

Poeta, que lhe auxilia.

 

É citado em um livro

Pelo seu belo trabalho.

O mesmo José Carvalho,

Lá do Belém do Pará,

Escreve bela missiva

Dizendo que Patativa

Grande poeta será!

 

No dia seis de janeiro

Do ano de trinta e seis

Chega a hora e a vez

De Patativa casar.

Casa-se, então, com Belinha,

Uma linda moreninha,

E a família vai formar.

 

Desse belo casamento

Quatorze filhos nasceram.

Só sete sobreviveram...

Outros sete, Deus levou.

Mas os dois não protestavam.

Humildemente acatavam

Aquilo que Deus mandou.

 

E Deus mandou ao Poeta

Nunca esquecer a Poesia.

Patativa então seguia

Sempre, sua vocação.

Na roça, durante o dia

E à noite ele fazia

Seus versos, de coração!

 

E sempre fiel à terra

Nordestina, que amava.

Em seus poemas falava

Das coisas do seu Sertão.

Observando, escrevia

O que de belo havia

Entre o céu e o chão.

 

Amava também contar,

Dizendo sempre a verdade,

Toda a dificuldade

Da vida de quem é pobre.

Descrevendo, com amor,

A vida do agricultor

Em verso simples, mas nobre!

 

Junto com João Alexandre,

Que era um grande violeiro,

Roda o Sertão inteiro

Levando sua poesia.

Onde quer que ele chegava

O povo já o aclamava

E ele, contente, sorria!

 

No ano cinqüenta e cinco

Conhece José Arraes

Que, impressionado demais

Pega seus versos e bota

Nun livro de um escritor

Que lhe faz grande louvor!

Seu nome: Moacir Mota.

 

No ano cinqüenta e seis,

Cumprindo a sua sina

“Inspiração Nordestina”

Patativa então publica.

Poesia que dá e sobra!

Era o começo da obra

Que viria a ser tão rica!

 

Já em sessenta e dois,

E tendo um certo cacife,

Vai cantar lá no Recife

Em um São João Popular.

Miguel Arraes patrocina

A Poesia Nordestina

Para o  povo admirar!

 

Dois anos depois, somente

O grande Luiz Gonzaga,

Encantado com a saga

Contada em “Triste Partida”,

Pega o poema e grava.

Essa obra, aonde chegava,

Por todos era aplaudida!

 

Esse fato por si só

De tal forma projeta

Patativa, o poeta,

Por todo nosso país.

Mas sua simplicidade

Não lhe permite vaidade

E humildemente, ele diz:

 

“A minha rima é rasteira

É fruita de jatobá.

É fulô de trapiá

É canto de passarinho.

É fulô de gamilêra,

É gente humilde, na feira,

E na puêra do caminho!”

 

E assim nosso poeta

Seguia sempre em frente.

Escrevendo humildemente

Sem nunca ligar pra fama.

“Eu escrevo porque gosto

Se nun escrevesse, eu aposto,

Morria in riba da cama!”

 

Porém dois anos mais tarde

- Mil novecentos  sessenta e seis -,

Usando mais uma vez

Sua veia criativa,

Ele lança um livro novo

E entrega a seu povo

Os “Cantos de Patativa”

 

Já em mil novecentos setenta

J. Figueiredo Filho

Lança, com muito brilho,

Os “Poemas Comentados”

São versos de Patativa

Comentados, em voz viva

E grandemente exaltados.

 

No ano setenta e dois

Raimundo Fagner, cantor,

Que é também compositor,

Faz uma coisa malina:

Com música de sua autoria

Encantado com a poesia,

Grava o poema “Sina”.

 

Mas no encarte do disco,

Esquece, sem ter má fé,

De registrar de quem é

O poema que gravou.

Patativa não reclama

Mas logo Fagner lhe chama

Reconhecendo que errou.

 

Ficam, então, amigos

Sem guardar nenhum rancor.

Patativa, o professor,

Ensinando humildade.

E Fagner, reconhecendo

A ele disse: “Pretendo

Te mostrar lá na cidade!

 

Alguns anos mais tarde

Isso iria acontecer.

Nós ainda vamos ver

Patativa em grande show

Mostrando sua verdade

Com toda a simplicidade

Que nunca lhe abandonou!

 

Mas prossegue o poeta

Cada dia, a criar mais

Aparece nos jornais

Sua fama se espalha.

Enquanto o mundo comenta

Patativa não esquenta.

E simplesmente... trabalha!

 

E a sua produção

Vai ficando numerosa.

A poesia, talentosa,

A muita gente comove.

Ele não se envaidece.

“Não sou aranha, que tece,

Quem gostar... que me aprove!”

 

No ano setenta e três

Um fato inesperado:

Patativa é atropelado

Andando em Fortaleza.

Perna mecânica ganhou

Até o fim da vida, usou.

Mas não chorava tristeza

 

Dizia ele, brincando:

Chorar, por que, meu irmão?

Eu escrevo é com a mão

Obedeço o que Deus qué.

Não tenham pena de mim.

Sou poeta até o fim

Não faço verso com o pé!”

 

Chegando setenta e oito

Conformado com o acidente

O Poeta, diligente,

Continua a trabalhar.

E publica, sem problema

O seu mais lindo poema:

“Cante Lá, Que Eu Canto Cá”.

 

Um ano depois se muda

Indo morar na cidade.

Pois já tá com certa idade

E se vai, todo feliz.

Residir no Assaré.

Porque é homem de fé,

Bem na Praça da Matriz.

 

Nesse ano acontecem

Inúmeras homenagens

Onde grandes personagens

Se rendem ao seu talento.

Entre participações,

Faz “Poemas e Canções”

Em disco, nesse momento.

 

Na Campanha da Anistia

Ampla, Geral, Irrestrita,

Sua poesia bonita

Comove o Brasil inteiro.

Fizeram um filme, até

E Patativa do Assaré

Participou, bem faceiro.

 

Do Show Massafeira Livre,

“Theatro José de Alencar”,

Ele foi participar

Nesse ano produtivo.

Sua obra, conhecida!

E ele, feliz da vida,

Um poeta sempre ativo.

 

No ano seguinte, oitenta

Fagner de novo estava

Com ele, e assim grava

“Vaca Estrela e Boi Fubá”.

E sem correr qualquer risco

Patativa  grava o disco

“A Terra é Naturá”.

 

Tinha um  programa na Globo

Chamado de “Som Brasil”.

O poeta então se viu

Convidado a apresentar.

Foi o Rolando Boldrin

Quem lhe chamou e, assim,

Não podeia recusar.

 

Foi um sucesso da gota!

Foi um show de Patativa!

O povo, gritando “Viva

O nosso  Poeta Maior!”

E Patativa seguia,

Humilde, como se via,

Sem querer ser o melhor.

 

 

Já no ano oitenta e quatro

As multidões, inquietas

Lutavam pela Diretas

E a História registrou.

Patativa, convidado,

Participou e, aclamado

Ao povo assim falou:

 

“Eu sou home lá da roça

Mais respondo meu presente

E junto com minha gente

Quero  tomém falá.

Ao Governo Brasileiro

Que este povo ordeiro

Só qué as Direta Já”.

 

Não vai ter revolução

Queremos paz, nessa terra.

Somos todos contra a guerra!

A gente só qué votá.

É um direito da gente

Votar para presidente.

Queremos Direta Já!”

 

O seu verso assim ajuda

Ao sucesso da Campanha.

Patativa assim ganha

Mais respeito popular.

Vídeo e filme são lançados

Para os fatos detalhados

De sua vida contar.

 

Mas Patativa, humilde

Nada disso lhe envaidece.

Volta ao Sertão e esquece

Toda essa homenagem.

Como roceiro que é

Só quer viver no Assaré,

Em sua bela paisagem.

 

Mas Jefferson de Albuquerque

E Rosemberg Cariry,

Dois cineastas dali,

Fazem um filme novo.

Para mostrar como é

Patativa do Assaré

Filmam “O Poeta do Povo”.

 

 

Nesse tempo, grande enchente

Se abate sobre o Sertão.

Patativa, com emoção,

Ajuda ao povo carente.

Pra consolar tanta mágoa

Faz a música “Seca Dágua”

E ao povo dá, de presente!

 

Ajudando, dessa forma,

Ao flagelado Nordeste!

Vai socorrendo o Agreste

Com chuva ou sol a pino!

O Sertão lhe agradece.

Por isso ninguém lhe esquece

Nesse solo nordestino.

 

Nesse ano ainda grava

Novo disco, que encerra

Poesia de sua terra

E grande sucesso fará.

O disco é , por sinal

Um projeto cultural

Do Banco do Ceará.

 

Em oitenta e seis apóia

E da campanha faz parte,

Doutor Tasso Jereisati

Ajudando a eleger.

E Patativa, na hora,

Diz: “Dotô, tu agora

Que faça por merecer!”

 

E já no ano seguinte,

Trabalhando, sem parar,

Vem ele a publicar

Mais um poema de amor.

Se revelando romântico

Escreve um belo cântico

Chamado “Espinho e Fulô”.

 

No mesmo ano, porém

Já quase sem poder ver,

É obrigado a fazer

Uma grave cirurgia.

Em São Paulo, em Campinas

Operou-se  das retinas

E a vista quase perdia.

 

 

Chega  a  oitenta e nove

Comemora oitenta anos.

O fato então dá panos

Pras mangas de toda a Imprensa.

São muitas as homenagens

Recebe tantas mensagens

Que refletindo, ele pensa:

 

“Meu Padin Ciço, me diga

Como é que pode, um roceiro

Desse sertão brasileiro

Ser querido, desse jeito?

Eu não sou nada, sou pobre

E esse povo, tão nobre

Dizendo que sou perfeito?...”

 

O Senhor que me perdoe

Se eu tô dizendo besteira.

Mas penso dessa maneira

O bom aqui não sou eu!

O Senhor, que é meu Padin

Foi quem fez isso por mim...

Isso é milagre seu!”

 

E assim, o nosso Poeta,

Com grande simplicidade

Não enxergava a verdade

Sobre o próprio talento.

E tudo o que recebia

Ao Padin Ciço agradecia,

Demonstrando sentimento.

 

E nesse ano, embalado

Pelo reconhecimento

Que tinha, nesse momento

Bonito, do seu destino,

Lança um disco novo

Tira, “da casca do ovo”,

O seu “Canto Nordestino”.

 

E faz apresentações

Em diversas capitais.

Raimundo Fagner jamais

Lhe esqueceu! E cumpriu

O compromisso que um dia

Ele , com muita alegria,

Com Patativa assumiu.

 

 

Leva o Poeta a São Paulo,

Recife e Fortaleza.

E um show de muita beleza

Para ele então criou.

O povo não esquece mais

Pois em muitas capitais

Nosso roceiro reinou!

 

O Show, gravado em disco,

Foi sucesso! Genial!

Do simples ao maioral,

Cada um reconheceu

Que ali estava a Poesia

O Brasil inteiro aplaudia

E o poeta mereceu!

 

No ano seguinte, noventa,

Dois fatos muito marcantes:

Violeiros atuantes

Das mais diversas escolas

Com grande contentamento

O levam para o evento

Fortaleza das Violas.

 

“Patativa do Assaré –

Oitenta Anos de Luz ““.

É lançado, e Jesus

Abençoa o lançamento.

E mais um disco termina:

O seu  “Canção Nordestina”

É lançado, no momento.

 

O artista Cleyvan Paiva

Faz música para os poemas

Como pérolas, como gemas

São lançados no mercado.

O povo se admira

Que esse pobre caipira

Seja um  poeta inspirado!

 

Já em noventa e um

Geraldo Gonçalves, um amigo

Dá apoio e dá abrigo

Ao poeta brasileiro.

E, cheio de esperança,

Patativa então lança

Mais um livrinho: O Balseiro!

 

 

Esse livro não contém

Só poemas de Assaré.

Pois o dito cujo é

Uma linda coletânea

De poemas nordestinos

Mostrando “a esses meninos”

Poesia contemporânea.

 

No ano noventa e três

Indo pra boca do lobo

Vai parar na Rede Globo

E ator ele vai ser.

Participa, com talento,

Com arte e sentimento

Da novela “Renascer”.

 

Faz a novela na Globo

Depois, muda de estação

Pois a tal televisão

Tem muito a oferecer.

Querendo mudar de ares

No SBT,  Jô soares

É quem vai lhe receber.

 

Conheço gente que tem

A entrevista gravada.

Jô Soares dá risada

Admirando o progresso

Do poeta brasileiro

Que, sendo um simples roceiro,

Consegue fazer sucesso!

 

E ainda nesse ano

Sua vontade de ferro

Diz: “Trabalho e não erro

Quero estar sempre na ativa”.

Fazendo o que certo acha

Lança, então,  numa caixa,

“Os Cordéis do Patativa”.

 

No ano seguinte o Poeta

Não pára de trabalhar.

Agora vem a lançar

Um livro novo na praça.

“Aqui tem coisa” é o nome

Da obra, e o couro come,

O povo, achando graça!

 

 

Ronaldo Nunes juntou-se

Com o Osvaldo Barroso

E um filme caprichoso

Fizeram, com inventiva.

Trabalho extraordinário

Chamou-se o documentário

“O Vôo da Patativa”.

 

Ainda em noventa e quatro

Mais um disco ele grava.

O poeta não parava

De rimar, com maestria.

Abrem-se, pois, os panos

Para “Oitenta e cinco anos

De Luz e de Poesia”.

 

Nosso poeta, então,

De outro evento faz parte

Mostrando a sua arte.

Do jeito que ele queria.

“Oitente e cinco de idade,

De amor e fidelidade

À sua gente e à Poesia”

 

Esse ano foi o pior

Que tive na minha vida”

Diz ele, voz abatida,

Voz saudosa, bem baixinha:

“Uma grande dor  senti

Pois nesse ano eu perdi

Minha esposa Belinha!”

 

“Pessoa que eu devo muito,

Ela foi a companheira.

Muito trabalhadeira

Igual, assim,  não havia!

Eu quase não exergando

Meus poemas ia ditando...

Era ela quem escrevia!”

 

“Pro resto da minha vida

E nunca vou me cansar

De sempre assim falar

Fazendo verso e Cordel.

Aqui na nossa terrinha

Eu cuido da sorte minha

Belinha já tá no céu!”

 

 

E ssim, no ano seguinte,

Continua trabalhando.

E logo está mostrando

Um novo livro, na mão.

Falando sobre o seu verso.

“Patativa e o Universo

Fascinante do Sertão”.

 

Plácido Cidade escreveu

Essa obra muito altiva.

Falando de Patativa

E tudo que ele criou.

Patativa lhe ajudando,

Conferindo e revisando,

Da obra muito gostou.

 

Chegando noventa e sete

Já temos mais novidade.

Oitenta e oito de idade,

O primeiro cd é lançado.

Com humor que ninguém paga

Pega o cd e indaga:

O que tem, do outro lado?

 

E o nome do CD

Já presta justa homenagem

Ao poeta de coragem

Que a força nunca perdia.

Idoso, porém afoito,

Patativa, oitenta e oito

Anos de Poesia!

 

A sua cidade querida

Numa homenagem pura

Nesse ano ingura

Uma Rádio Comunitária.

E o Nome da Rádio é

Patativa do Assaré,

O que a torna lendária.

 

No ano noventa e oito

José Lourenço Gonzaga

Ao nosso poeta afaga

Com respeito e com doçura.

Lança um album bonito

E analtece o mito

Usando a xilogravura.

 

Contém dezesseis matrizes

Feitas em Umburana

Sua beleza empana

As outras obras que havia.

E intitula belamente

A obra resplandecente

“Patativa – Amor,  Poesia”.

 

No Estado de São Paulo

A Câmara Legislativa

Recebe então Patativa

Com uma grande homenagem.

Com lavratura em Ata,

Marcam pra sempre a data

Da importante passagem.

 

Patativa – Noventa anos

Discursa até o Prefeito.

E poetas de respeito

Louvam o Menestrel.

E cada um, em seu canto

Declara: “Ninguém fez tanto

Assim, por nosso Cordel”.

 

Em Fortaleza inauguram

Uma grande exposição

Para louvar, com emoção

O Mestre das Obras Primas.

E cantam, sem dor nem mágoa

Nasce, “De um pingo d’água

Um oceano de rimas”.

 

A Universidade Federal

Do Estado do Ceará

Promove o que será

Um pleito extraordinário.

Usando xilogravura

O Poeta ela figura

Em um lindo calendário!

 

O autor desse projeto

Foi o artista Evandro Abreu.

A Xilogravura, quem deu?

O artista José Lourenço.

Patativa, bem contente,

Só dizia: “Minha gente...

Assunta só o que eu penso:”

 

 

“Já tenho noventa anos

E ainda não fiz nada.

Minha obra ser louvada?

Eu ser louvado por isso?

É só  por muita bondade

Dos amigos, dos cumpade

Ou milagre do Padim Ciço!”

 

Já quase no fim da vida

Já poeta consagrado

Sendo homenageado

Ele nunca se envaidece.

E falando com humildade

Agradece “a bondade

De louvar quem não merece”.

 

Chega então noventa e nove.

A festa de Aniversário

O feito mais legendário

Um evento magistral

Na cidade de Assaré

Inauguram, pois, com fé

O Grande Memorial.

 

Trata-se de um museu

Com toda sua grande obra

Poesia lá tem de sobra

Pois o poeta escreveu.

O povo reverencia

O Poeta e sua poesia

Que os noventa já venceu!

 

E pede a Deus saúde

E vida mais longa ainda

Ao que tanta coisa linda

Ao todos proporcionou.

Parece que Deus, ouvindo,

Diz ao poeta: “Vá indo

Dois anos mais Eu lhe dou”.

 

Já velho e bem cansado

Cego, o nosso bardo

Carrega ainda o fardo

Da fama, como  poeta.

Sentado em sua cadeira

De balanço, a tarde inteira,

Sua alma se aquieta.

 

 

Não pode mais escrever

Mesmo assim não se entristece.

O coração não esquece

Toda a vida que viveu.

Se alguém lhe diz “-Obrigado”,

Ele diz: “Cê tá errado.

Quem agradece sou eu!”

 

Filhos, netos, parenates

E fãs, em todo país,

Querendo lhe ver feliz,

Nunca o deixam sozinho.

Ele, inverno ou primavera

Cisma, recorda e espera

Sua hora, seu caminho.

 

E fala um dia, a um neto

“Poeta é só quem diz

Escrevendo fui feliz,

Pois escrevi para o povo.

Se morrer, eu morro em paz.

Quem sabe bem o que faz

Faria tudo de novo!...”

 

Até que chegou o dia.

Foi pouco tempo depois.

No ano dois mil e dois

No dia oito de julho.

A figura se aquieta

Acharam morto o poeta

Motivo do nosso orgulho.

 

Morreu em sua cadeira

Na varanda, que gostava.

A ninguém incomodava

Como dissera, um dia.

“Quando eu seguir caminho

Eu quero é ir sozinho,

Sem alarde ou arrelia”.

 

O Brasil, naquele dia

Perdia um maioral

Pobre, até o final

Da carreira, mas contente.

Por ter cantado a beleza

Da terra e da Natureza

E o sofrer de sua gente.

 

O Brasil, naquele dia,

De sul a norte chorou.

Muita gente lamentou

O Mestre, que ia embora.

Mas ele, tranquilamente

Só dizia: “Calma gente,

É que chegou minha hora”.

 

“Essa hora é Deus que marca

Com a Sua Onipotência

Não há recurso ou ciência

Pra se  mudar um destino.

Vou-me embora, é verdade,

Mas levo muita saudade

Desse povo nordestino”.

 

“Saudade da minha serra

Que eu cantei, parcamente.

Saudade da minha gente,

Saudade do meu Sertão.

Mas vou-me embora contente

Pois a chuva, docemente,

Já molha o meu caixão”.

 

“E peço a todo poeta

Que vai ficar nesse chão

Que abra o coração

Quando for versar de novo.

Para cantar  nossa terra,

Pra castigar a quem erra,

Pra defender nosso povo”.

 

“Nunca  perca a fé em Deus

Nen no maior sofrimento.

De Jesus, o ensinamento

Guarde no coração.

E tenha sempre na mente

O que ensinou lindamente

O Padin Ciço Romão!”

 

“Eu não quero ser lembrado!

Lembre só da Poesia!

E cantem com alegria,

Para o povo se animar.

No Brasil, de sul a norte,

O povo tem que ser forte

Pra dureza suportar.”

 

 

“Tenha pena dos pequenos,

Dos fracos, dos que não podem.

Enquanto bombas explodem

Causando tristeza e dor...

Tenha dó do povo inteiro

E, no solo brasileiro,

Espalhe um pouco de amor”.

 

“Pra ver um mundo melhor,

Tenha fé, tenha esperança!

Eduque toda criança

E lhe dedique atenção.

Pois em meio a tanta guerra

Felicidade, na terra,

Só vem pela Educação”.

 

Assim diria Patativa

Se morto, pudesse falar.

Sua gente aconselhar

Arrebatado de amor.

Resumindo: a esperança

É ver, um dia, a bonança

Chegar ao trabalhador!.

 

Terminando, meu amigo,

Agradeço, emocionado.

O meu recado foi dado

Cumprida, a minha missão.

Com o meu verso rasteiro

Quem falou, sempre primeiro,

Foi a voz do coração.

 

Agradeço a Deus do Céu

A graça de escrever

Podendo, assim dizer

O que foi e o que é

Para o Povo Brasileiro

O Poeta Verdadeiro

Patativa do Assaré!...

 

Pergunte, leitor amigo

Aonde foi Patativa?

Terminando a narrativa,

Atentamente eu lhe digo:

Teve ele o seu abrigo

Imediato, no Céu.

Velando pelo incréu,

Além de todo perigo.

 

 

Dizendo, sempre consigo:

O Pai proteja o Cordel!

 

Assim, fique eternamente

Seu verso, sempre presente,

Seu exemplo mais profundo!

Ao reviver Patativa

Repito: sua chama viva

É uma lição para o mundo!

 

Antônio Goçalves da Silva

Neste Nordeste nasceu.

Para a Poesia viveu!

Estará morto?... Sei não!...

Ainda o vejo entre nós!

Pois Patativa é “A Voz

Que Ainda Canta o Sertão”!

 

 

 

Juiz de Fora – Minas Gerais – maio de 2006

 

Luiz Carlos Lemos.

 

 

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Link para a página do Cordel

 

 

Manoel de Barros

 

Augusto dos Anjos

 

 

 

 

10.6.2007