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Lourdinha Leite Barbosa

 

arnoldo@secrel.com.br

São Jerônimo, de Caravaggio

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Poesia:


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Alguma notícia da autora:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Carlos Nóbrega

 

Wilson Martins

 

 

 

 

 

 

 

The Gates of Dawn, Herbert Draper, UK, 1863-1920

 

 

 

 

 

 

Lourdinha Leite Barbosa

 


 

 

Sent: Monday, August 28, 2006 10:36 PM

Subject: Salve, Poeta.


 

Soares Feitosa,

nos último dias, dois textos, um em prosa e outro em verso, trouxeram-me ao coração paisagens de minha infância. Ambos utilizaram palavras já quase adormecidas nas páginas do tempo, mas tão presentes na memória afetiva. Um, em tom suave e com bordados coloridos, falou de uma Fazendinha cheia de chita, chuva, chuvisco; o outro (Estudos & Catálogos - Mãos) dos afazeres diários de uma fazenda no sertão do Nordeste, ou melhor, o trabalho do homem e o trabalho da mulher, embora, muitas vezes, os papéis pudessem ser desempenhados pelos dois indiferentemente.

Os textos me transportaram quilômetros-anos para a fazenda Primavera, onde me vi no meio de um grupo de crianças, irmãos e amigos, pés descalços, tirando resinas dos angicos (cada brinco de princesa!) e colocando as restantes numa cuia. Bocas cheias, dentes grudados de resina, riso fácil. Ainda sinto na boca esse sabor antigo que nunca mais experimentei.

Pois é, Feitosa, seu primo Genésio, maior amigo do meu pai, passou boas temporadas ali e pode muito bem lhe falar da marca de ferrar bois do velho Francisco Dias Martins. Parece-me estar vendo a letra "D" com um "F" dentro. E todos na redondeza sabiam que aquela rês tresmalhada pertencia ao Seu Chico Dias.

Cara poeta, seu texto tem cheiro de mata-pasto e marmeleiro.

Um grande abraço da

Lourdinha Leite Barbosa


Link para Fazendinha, de Rodrigo Marques

Link para Estudos & Catálogos - Mãos

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Allan R. Banks (USA) - Hanna

 

 

 

 

 

 

Bia Jucá

 

Diário do Nordeste, Fortaleza, Ceará, Brasil

 


A produção literária de Lourdinha Leite Barbosa dispensa qualquer comentário. Alguns críticos especializados já se encarregaram de destacar seus contos e ensaios, incluindo seus trabalhos em conceituadas publicações. O domínio da linguagem e o apuro da correção permeiam sua obra e denotam a intimidade com que a autora lida com a palavra.

A originalidade de suas criações incita a nossa imaginação e comprova sua qualidade estilística. Entretanto, isso não é tudo. como leitora, considero que escrever bem não é o bastante; é preciso seduzir e enredar o leitor com uma boa história. Essa é a arte que Lourdinha exerce com talento e sensibilidade; tanto que, aqui e ali, somos instigados a mergulhar novamente em seus textos em busca, assim, de novos desdobramentos.

Quando relemos uma história, reencontramos as personagens e, a cada encontro, algo novo se revela, renovam-se as possibilidades de leitura. Esta que se segue é apenas mais uma, dentre tantas, sobre ´Uma paisagem quase perfeita´. As protagonistas desse conto transitam numa atmosfera simbólica, deixando, portanto, silenciosamente vestígios de dor e desesperança.

São cinco mulheres sem brilho, sem cor e sem voz. A casa é sua prisão, o carcereiro, o pai castrador e habilidoso em submetê-las à lei. Como repressor de suas vidas eróticas é aquele que limita o gozo e barra seus impulsos desejantes. O ´casarão antigo´ nos remete ao passado. Lá, afetos e lembranças são guardados ´num porão escuro´, obscuro e enigmático, arquivo de suas fantasias femininas. O ´grande quintal cheio de árvores´ é um lugar proibido, onde elas receiam aventurar-se. A autoridade paterna, introjetada em seus egos, deu origem a um superego ameaçador e exigente.

O território do sonho
A ´paisagem quase perfeita´ emoldura e paralisa as cinco mulheres amordaçadas, caladas à força. Ali, ´Não se ouviam vozes´, embora as vozes interiores não sosseguem e teimem em se manifestar, pois ´todas sonhavam com grandes espaços, vastidões sem fim´. Nos sonhos, seus desejos se realizam de forma disfarçada, dando-lhes a ilusão de que seus espaços se expandem em direção a um objeto que mantém e reaviva constantemente a pulsão erótica. Assim, a ´ausência de sons´ não impede que o discurso de suas almas silenciosas seja melodiosamente embalado ´pelo barulho do vento nas folhas e o gemido das dobradiças no vaivém de portas e janelas´.

O equilíbrio é mantido pelas interdições: ´não rir muito, conversar pouco´. Elas se defendem da desconfortante e inesgotável atividade de Eros, sublimando seus desejos nas contas do ´rosário que eram obrigadas a rezar todas as noites´. A ordem era ´rezar sempre´, buscando compensar suas frustrações, deslocando o prazer para a transcendência.

Esgotadas pelo isolamento e incompletas pela ausência do outro, que as constituiria como sujeito, as cinco mulheres são surpreendidas por um ´acontecimento inesperado´: ´O pai permitiu que uma figura masculina, penetrasse no mundo feminino´. A autora lança mão da ambigüidade da palavra ´penetrar´ e, através da sugestão, oferece indícios das conseqüências dessa intromissão.

Se, como afirma George Bataille, o desejo prepara uma fusão na qual se misturam dois seres em busca de continuidade e completude, vemos então que o outro é essencial para que um sujeito entre na dialética lacaniana, ou seja, tenha como objeto do seu desejo ser o objeto do desejo do outro. Além do mais, com a suspensão da lei paterna, instala-se a transgressão, elemento da atividade erótica.

A partir daí, o silêncio é quebrado e o desejo violentamente exposto; regras e limites são violados em busca do prazer disfarçadamente resignado ao confinamento. Convém lembrar que, para Freud, o que é reprimido sempre retorna e o retorno do recalcado cobra um preço: a angústia que advém do conflito entre o princípio do prazer e um outro: o princípio da realidade. A narrativa ganha uma vivacidade própria e, uma a uma, as cinco mulheres são envolvidas por ´uma onda de calor que se propaga pela propriedade´. Ligam-se os corpos, os seres e as coisas; a quantidade de calor é excessiva para quem sente, desse modo, sua vida reduzida a cinzas.

O outro
Assim, ´Clara foi a primeira a escurecer´, assustada com o fascínio que exercia no outro. Ao negar oferecer-se como objeto brilhante, ´terminou retinta, negra como a escuridão´, que insistia em não abandonar. ´Margarida amarelou´, desvirginada ´se desnudou´. Criou vida própria, espalhou sementes onde antes a terra era estéril. ´Nesse dia o pai teve que abrir as portas´ e permitir a vazão da paixão que rompia regras impetuosamente.

Magnólia ´desmanchava-se em água´. Fervia. Não houve como retê-la, ´escorria pelo piso e ganhava as ruas´. O grande reservatório libidinal rompeu-se sob o jugo do princípio do prazer. Magnólia dissolveu-se no desejo do outro. Já Aurora, ´tão solar, emudeceu´. Voltou à obscuridade, angustiada pelo medo de ser punida. ´A voz calou´ e optou por repetir o fracasso e conviver com a dor já conhecida. Por precaução, cerrou os lábios que ´desapareceram para sempre´. Eugênia, ´enlouquecida, explodiu em chamas´. Ateado o fogo transformador, que ardia como brasa sob o silêncio, o efeito foi devastador. Não suportou a embriaguez de tanto oxigênio. Iluminou a ´paisagem quase perfeita´ como fogos de artifício.

Não é por acaso que, mais uma vez, Loudinha Leite Barbosa, traduz em cenas de rara beleza as inquietações e expectativas do universo feminino. Afinal, o centro das atenções da autora é a grandeza trágica da condição de ser mulher, conforme ensaio de Vicência Jaguaribe (2001)

A nosso ver, o conto, ´Um paisagem quase perfeita´, pode ser interpretado como uma metáfora do desejo. As cinco personagens revivem, através do pai, a atualização constante da castração, criadora da falta. Como seres faltosos, vivem em busca de algo que foi perdido para sempre, e se foi perdido, jamais será reencontrado. A princípio, a insatisfação é sublimada e a angústia canalizada para a oração, porém a entrada em cena do outro modifica o quadro.

A intromissão se dá pelo relaxamento da lei paterna e, como conseqüência, elas são tomadas, incondicionalmente, pelo princípio do prazer. O excesso de energia recalcado por anos a fio, investe libidinalmente este outro que passa a ser visto como objeto de seus desejos. Deixam-se, então, levar pelas exigências da pulsão erótica que anseia, assim, à liberação total.

BIA JUCÁ*
Colaboradora
*Psicóloga e licenciada em Letras
 



SAIBA MAIS

FREUD, S. O Ego e o Id. In: Edição Standart Brasileiradas Obras Completas de Sigmund Freud. v. XIX. Rio de Janeiro: Imago, 1979.
MEZAN, Renato. Freud pensador da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1990.
NASIO, J. David. Os 7conceitos cruciais da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.
BATAILLE, Georges. O erotismo. Porto Alegre: LP&M, 1987.
LEITE BARBOSA, Lourdinha. A arte de engolir palavras. Recife: Bagaço, 2001.

 

 

Manoel de Barros

 

Augusto dos Anjos

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

29.03.2006