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Lúcio Cardoso 

John Martin (British, 1789-1854), The Seventh Plague of Egypt

 

 

 

 

 

 

 

 


Poesia :


Fortuna crítica: 


Alguma notícia do autor:

 

 

 

 

 

 

William Bouguereau (French, 1825-1905), L'Innocence

 

William Bouguereau (French, 1825-1905), Admiration Maternelle

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Goya, Antonia Zarate, detalhe

Lúcio Cardoso


 

A uma estrela
 


Meu domínio é o do sonho,
minha alegria é a do céu que a tormenta obscurece,
meu futuro é aquele que amanhece à luz do desespero.
Só tu saberás o segredo da minha predestinação.
Só tu saberás a extensão de tantas caminhadas,
só tu conhecerás a casa humilde em que morei.
Quem saberia romper o sortilégio que me cerca,
ó sol vermelho, aurora dos agonizantes.
 


Mas não reflitas nunca o gesto que condena.
Ai, este país é o da eterna aridez!
Se da altura a estrela não baixar o olhar ao pântano,
maior será a sua impiedade que o seu esplendor.
 


E só tu Vésper, só tu aplacarás o meu desejo,
só tu poderás depositar, nesta carne crispada,
o beijo que nas trevas dá ao sono a serenidade do repouso.


Novas Poesias, 1944
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Alessandro Allori, 1535-1607, Vênus e Cupido

Lúcio Cardoso



Amanhecer
 


A noite está dentro de mim,
girando no meu sangue.
Sinto latejar na minha boca,
as pupilas cegas da lua.
Sinto as estrelas, como dedos
movendo a solidão em que caminho.
Logo o perfume da poesia
sobe aos meus olhos trêmulos, cerrados,
ouço a música das coisas que acordam
sôbre o corpo negro da terra
e a voz do vento distante
e a voz das palmeiras abertas em raios
e a voz dos rios viajantes.
 


E a noite está dentro de mim.
Como um pássaro,
meu sonho ergue as asas no coração da sombra.
Ouço a musica das fiôres que tombam,
o tropel das nuvens que passam
e a minha voz que se eleva
como uma prece na planície solitária.
 


Então sinto a noite fugindo de mim,
sinto a noite fugindo dos homens
e o sol que avança na garupa do mar
e as nuvens curvas que enchem o céu
como grandes corcéis de fogo côr-de-rosa
desaparecendo sugados pela treva.
 


Poesias, 1941
 

   

 

Herbert Draper (British, 1864-1920), A water baby

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Carlos Augusto Viana

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Caravagio, Tentação de São Tomé, detalhe

Lúcio Cardoso


 

Velha fortaleza
 


Vejo-te dormindo no silêncio antigo e forte.
 


Ouço as ondas que roçam tuas ilhargas de granito,
e o vento que desenlaça no espaço frio
a memória guerreira dos teus dias idos.
 


Sinto renovar-se em mim
o desejo desta vida que sonhei.
Ouço a voz das madrugadas sôbre as rochas
e o mar remoto que soluça
junto ao aço morto dos canhões...
 


E vejo, ó fria sentinela,
o teu vulto crescer na linha do horizonte,
como um estranho navio que ancorasse
junto à cidade descuidada,
vazia de heroísmo e mocidade!
 

 

Poesias, 1941

 

   

 

Hélio Rola

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Maria Helena Nery Garcez

 

 

 

 

07.04.2006