Dos sapos e dos livros,
três pequenos enigmas

1. Hoje, no meu escritório, dentre muitas outras, falávamos de livros:

Um deles disse-nos que, de livros de poetas, a maioria livros magros, nem sei por que os poetas se danaram nessa ideia de livros magros, ali, minhas, aquelas estantes, cheias, repletas, 200, 400 – por onde começar? Ele, então, se embasbacara, a mão paralisada ao terror de puxar o primeiro: qual?, e não puxar o melhor. Por minutos, disse, puxou vários, mas não conseguia abrir nenhum.

Eu lhes disse que, um dia, há muito tempo, dirigira-me à feira geral, uma feira imunda como sói acontecer com todas as feiras gerais: jerimuns, batatas, carnes salgadas, montanhas de melancias, queijos e rapaduras. Procurava por milhos. Uma ruma vasta, verde, já cambiando para um amarelo-desterro, mas logo ali, abaixo das primeiras palhas, os grãos estavam sãos, túrgidos e brilhantes, bons de assar, cozinhar, canjicar.

E junto da montanha de milhos, um ônibus transformado em museu. Um museu de História Natural, como também natural, por certo, aquela feira de coisa e gente. Um ingresso bem cômodo, paguei e entrei ligeiro. Onde antes eram cadeiras eram agora redomas. Os outros bichos não me chamaram a atenção, mas estes, sim: uma cobra e um sapo, juntos sob o mesmo vidro, como se fossem velhos companheiros. Não perguntei a que estaria o sapo ali, junto com a cobra. Se à exposta, se à alimentação do réptil. Ou nessa ideia repulsiva de dois coelhos sob cajadada única, embora nos meus quase 60 nunca tenha visto coelho algum ser abatido com cajadada alguma, quanto mais dois. Vi-os abatidos, sim, na granja de gaiolas, com uma firme porém subtil e piedosa porretada na cabeça... Um leve tremido nas pernas, como trememos, presumo, todos nós à última. Em seguida, as atividades de couro, carne e panela – ao coelho, é claro, à caçadora, que com gente é diferente, mas não muito. E vinhos.

Fosse como fosse, me satisfez aquele combinado: serpente e sapo. Ele, um pequeno e distinto cururu, despira-se de qualquer angústia. Não, nenhum parentesco com o sábio peripatético: calmo, talvez sisudo, meramente se aluía, mas só um pouquinho, quando o rabo da cobra passava-lhe por entre as mãos. Mãos? Sim! Muito justo que o sapo tenha mãos! Mas não intentou, pelo menos nas horas e horas em que o respiguei com o olhar, nenhum bofete, caratê ou simples afago ao réptil. Ela, não! Sossego nenhum. Magistral, absoluta, suficiente, pra lá e pra cá, como se cumprisse uma missão de dar sucessivas voltas num universo despido de movimento: aquele ônibus, um carro velho que, no máximo iria de uma feira a outra, mas ali se havia estacionado há meses. Prometo-lhes que amanhã retornarei a verificar se ainda está.

Far-se-iam de si que leitura, sapo e cobra; cobra e sapo? O “condutor”, agora museólogo, disse-me que era de hora de fechar. Procurei pelos atilhos às canjicas, que deixara aos pés, milhos, meus. Quem disse?! Levaram-nos à panela outra que não a lá de casa. Quando me dei conta de indagar se o sapo haveria de morrer, uma súbita espinha de um peixe que eu não havia comido engolfou-me a fala. Olhei se o sapo reparava em mim. Ele estava de costas. Aluía-se vagamente sob mais uma volta do rabo-réptil.

Foi a vez de o terceiro presente dizer que ambas as histórias, a do primeiro e a minha, estavam combinadas. Disse-nos que hoje o Ibama não permite cobra e sapo sob a mesma redoma.


2. Falava comigo de coisas de ler, e leio, dois pontos, mais uma história de cobra e sapo:

Agência Estado – 18h25min – 6/10/2003. Tradutor roubava livros raros das universidades de Minas. A Polícia Federal apresentou hoje, na sede da Superintendência do órgão, em Belo horizonte, 134 livros pertencentes ao acervo de bibliotecas de universidades mineiras, que haviam sido furtados e foram recuperados após a prisão, na última sexta-feira, de S, de 54 anos. De acordo com o delegado da PF, o acusado confessou a autoria dos crimes. No conjunto recuperado haviam obras dos séculos 18 e 19.

Os livros foram encontrados na residência de S e em sebos da capital mineira. “A grande maioria eram obras raras”, disse a diretora do Sistema de Bibliotecas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), citando como exemplo dois livros de uma coleção do cientista dinamarquês Peter Lund (1801-1880), escritos em 1888. Os livros fazem parte do acervo da Biblioteca do Museu de História Natural da UFMG. Lund viveu e realizou estudos na região do município de Lagoa Santa, na área metropolitana de Belo Horizonte. Em seu depoimento, SBJ disse, segundo RAO, que trabalhava como tradutor e revisor de livros e cometia os furtos movido por um “impulso incontrolável”. “Ele fala mais de uma língua, é uma pessoa bastante culta”, observou a diretora da UFMG.


3. Falava comigo de mais coisa de cobra e sapo, e me chega esta mensagem do poeta Adail Sobral, da lista de Litteratura:

“The first duty of a commentator on current literature... is to present a fairly full and veracious report of what is going on. He will have his own convictions regarding the permanent value of various parts of the contemporary spectacle... But his first duty is not to exploit his own predilections; it is rather to understand the entire 'conspiracy' of forces involved in the taste of his day.”

[...]. Mande-nos (ao “Jornal de Poesia”), pois, a foto, sua. Uma simpatia, o Dante Gatto.

Somos todos personagens, todo o tempo, o tempo todo, incluso naquele momento em que comparecemos, livrinho debaixo do braço, a responder algumas perguntas inquietantes. Afinal, para que o livro se o perguntador já nos sabe as respostas? Essa história de “tomar a lição” parece que é bem mais ampla...

Alguém escreveu (eu mesmo):
“[...]
resposta de fogo, se é que existe,
como ousá-la
se o interlocutor é terrível e impaciente
e parece
zombar e sabe balançar
horizontal a cabeça
– e os olhos fixos – à direita e à esquerda,
a cabeça e o sorriso,
enquanto aos lábios trêmulos
as tuas palavras e as respostas
medram medo
e se afogam no soluço.
O que te garante que e(E)le te acreditou?
Recusarias:
     o alicate, a unha,
           o desterro e a tenaz?!”

Não temos outro destino senão a personagem de nós mesmos. E quem se deixa enganar é o touro que acredita naquele pedaço de pano pra lá e pra cá, personagem a atacar. E ataca. Mas ali há apenas o “hipócrita”, o ator, vestindo-se de mera empanada. Vermelha e real. Aos olhos do toiro, só dele, que espiamos mesmo é no toureiro. E no touro. E tome, meu novilho, bem no flanco, as banderillas! Quando, no máximo, uma chifrada na femoral. Bem certeira! [Secretos, cantamos por ti, ó touro real!]

Vai o abraço do Soares, toureiro. Nalgumas vezes, acho que a maior parte, touro; doutras, de mero pano. Ou punhal.

 

 

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Este, o 28º capítulo de Poética, um livro vivo, aberto, gratuito, participado e participativo, cheio de comentários que, a rigor — esta, a proposta —, os comentários, mais importantes que o texto comentado: abrir o debate, uma multivisão.

— Livro vivo, como assim?

— Porque em permanente movimento, espaço aberto a quem chegar, tão amplo como o espaço àqueles que aqui estão desde os séculos, todos em absoluta ordem alfabética. Seja bem-vindo!

POÉTICA: Capa, prefácio e índice poemas e poetas comentaristas

 

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Comentários:

ANDERSON BRAGA HORTA: Meu caro Soares Feitosa. Você, mágico-poeta, tirando da cartola coelhos, livros e, de quebra, um sapo e uma cobra, com esses ingredientes nos deu, mais que um belo espetáculo, uma crônica de primeira. Furtaram-lhe o milho, que fazer? Mas ainda bem que o combustível da poesia é feito também de ausências, da falta, tanto ou mais que de coisas conseguidas. Valeu!

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EDSON ALVES DAMASCENO: Poeta, muito bom o texto, ou, os textos, como só mesmo o Coronel sabe escrevê-los, e transmitir emoções. Quando se lê uma poesia do Coronel, faz-se uma viagem, uma viagem divina, maravilhosa, inesquecível e intrigante, como só a poesia d(E)le, consegue imprimir. A cada novo texto uma surpresa, uma nova surpresa, agradável e deliciosa de se ler. Os milhos novinhos em folha sob um monte de escombros de rebotalhos, na feira, só mesmo o Coronel para descobri-los. O verbo canjicar, divino. Esse Coronel é um traquino. E a leitura se faz num galope, num chouto, célere e veloz, lépido e fagueiro. Como o Dr. Nelson, meu querido pai, que Deus o tenha, lépido e fagueiro, ao atravessar a Praça do Ferreira, numa manhã de sábado, nos idos dos anos 50, numa bela manhã de sol. Poeta Francisco, e a rua Major Facundo, 1338, onde morei quando criança, que era bem próxima da casa (1389) do Jornalista Adaucto Gondim, que tinha um sobrinho (Francisco), que morava com ele mas que não tive o prazer de conhecê-lo, à época?! E o colega trêmulo ao escolher o livro? Qual? Qual escolher? E ainda nem o abriu. Poeta, e a monja? Estaria estilizada na obra do grande pintor francês William Bouguereau? Será ela? Será ela a musa inspiradora dele também? Poeta, sem dúvida elas, a Aurora e o Crepúsculo, são ela, é ela, a monja, a das melancias, são lindas. Lindas, Poeta! Um abraço do amigo e fã número 1. Edson

Em tempo A Monja das Melancias referida pelo amigo Edson é personagem de “Salomão”, um livro em processo. No “Salomão”, o tal Coronel seria um senhor de negreiros e, ao mesmo tempo, libertário.

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FAGUNDES DE OLIVEIRA: Meu caro Soares Feitosa: Acabo de abrir as portas do universo digital e ouço (é verdade que ouvi) a sua determinante inteligência ditando ensaios do pensamento e da palavra. É sempre bom quando, neste mundão de Meus Deus, alcançamos deter a sede de leituras gostosas, escritas no alinhamento da vocação literária, por quem gosta e sabe e pode e quer e realiza. Obrigado pela caminhada amiga do sapo e da cobra, entendimento de que a sociedade somente não comunga do bem porque lhe falta vocação. O abraço da verdade com a imaginação criativa fortalece o sentido do existir. Quer queiram quer não, os imbecis, este caminho tem ida... e volta, sim. No meu canto de vivência literária estou fortalecido pela energia benfazeja da leitura cometida. Valeu muito. Porque entendo que mereço, continuo cobrando a sapiência do mestre. Deste aconchego de Brasília, meu abraço para você, lembrando sempre de que devo genuflectir-me em regozijo ao mestre e amigo. Fraternalmente, Fagundes de Oliveira

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IZACYL GUIMARÃES FERREIRA: Ô amigão! Que bela maneira de começar um chuvoso domingo paulistano! Obrigadíssimo. Assim, inundado de brasileirice, vou atacar aqui mesmo na tela os jornais dominicais. (Mais as crônicas que as notícias. Que essas são menos notícias que ecos, né mesmo?) Grande abraço. Izacyl

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LUIZ PAULO SANTANA: Labirintos. Querido Vate: Adentrei o labirinto com entusiasmo. Tanto, que fui parar às folhas outras, perdido. E ainda não saí. Taí o resultado: Lector in fabula (Eco) É uma vez um homem que, diante dos livros nas estantes, horroriza-se em puxar um deles, e quando o faz, nega-se a abri-lo. É uma vez outro homem que, muito os abria e, se por mais não for, passa a furtá-los. É uma vez um homem que colecionava bichos sob redomas, num velho ônibus tornado em museu. Debaixo de uma redoma, juntos, a cobra e o sapo. O sapo, quem “sape”, quieto; a cobra em estardalhaço. É uma vez outro homem que tinha olhos de lince. A tudo olhava por dentro, por fora dava outras cores. Arrematou milho verde na feira por onde olhava. Viu por debaixo da palha. Aos bichos sob as redomas foi perscrutar-lhes a alma. Contentou-lhes sapo e cobra, antítese contraditória. Juntos, sob a redoma. É uma vez um homem quem vagasse por ali, procurasse ao pé do então, os esquecidos atilhos. Olhos de lince não viram. Achados num outro chão. E agora, como se explica? (“......resposta de fogo, se é que existe como ousá-la....?”) (Soares) Toureando-se a pergunta, que a resposta, outro touro em sucessão? Predileção pessoal ou conspiração de forças? (Adail) “Que é a verdade?” (Pilatos) “Há respostas que talvez jamais nos sejam dadas. E isso, para nossa proteção.” (J. Romero Antonialli, 2º comentário sobre o poema “Penúltimo Canto, variação nº. 1, a dúvida”) Enigmas. LPSantana

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MARIA HELENA NERI GARCEZ: Livros magros, sapo cururu e cobra absoluta. Meu caro Soares Feitosa, só agora, fim de domingo, abri esta maquineta e encontrei o seu mundo! Primeira coisa: livros de poesia presentemente são magros porque os preços são gordos. Poeta que não tem estrela – mesmo que seja estrela – financia seu livro. Se o engorda, está perdido. Sapo cururu em redoma? E ainda mais com cobra? E não houve quem quebrasse a redoma e livrasse o cururuzinho daquele horror? Não teria sido uma boa pegar o tal do homem do ônibus velho e colocar a ele lá dentro, junto com a cobra? Já pensou na alegria do cururu, ali, de fora da redoma, vendo o cara a tourear a cobra e ele ali a rir, a rir às gargalhadas, deixando à mostra o encarnado da goela? Sou do dia da caça sem dia do caçador!!! Sou do dia do touro! Sempre! Quem manda aqueles basofeiros precisarem provar para si e para o mundo que podem ganhar de um touro? Chifrada neles, touros! Enviem-nos ao espaço sideral! O universo ficará mais bonito com todo aquele brocado girando feito satélites nas suas barroquices!... Alguém que me lê, por favor, envie a sugestão para a Nasa! Estou certa de que os lançamentos sairão mais baratos e o Bush conseguirá reerguer a economia do país. Maria Helena Nery Garcez

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MARIZA PENCHEL D'APARECIDA: Soares, o que você escreve é maravilhoso e sutil! Caminhando, faz-nos também caminhar pela vida. A sua, autor, que nos transmite tanta beleza e pureza. Também a nossa. Das palhas, extrai-se a simplicidade, onde está guardado o segredo e a preciosidade da vida. E isto não se rouba. Aprende-se. Por isto, talvez, não se importou, você, Soares Feitosa, com o milho em outra panela. No frigir dos ovos, ou da canjicada, ou dos coelhos, ou dos livros, da aurora ao crepúsculo, a beleza da vida é divina, tão bem retratada pela obra de William Bouguereau, apesar da redoma, dos véus e dos panos que encobrem ou desnudam nossos personagens, assumidos no decorrer de nossas vidas, tão inerentes à vida na liberdade do arbítrio, mas de cuja essência divina não nos afastamos: o da criação. A feira geral, que descreveu com tanta realidade, transportou-me à feira de São Cristóvão no Rio de Janeiro, efervescente, onde, quando vou, compro queijo coalho. Feira geral, que vira o dia, vira a noite e amanhece. Encontro de nordestinos. Só termina dia seguinte, dia já alto, mesmo assim, só se não mais tiver fôlego, ou melhor pé, pro arrasta forró. Contagia. Como contagia o que você escreve, e que me inspirou a escrever:

Feira da vida

O ferver efervescente,
Mercado de opções
Mercados gerais que não param,
Sempre girando, girando,
Fervendo de coisa e gente.
Circunstâncias do oportuno,
Conveniência, mutável,
Experiência e essência,
Retrato do negativo
Que retrata o positivo,
Dualidade do ser,
Do provável improvável,
Congruência, incongruência
Que tangencia o ser.
Feira, arena,
Bem ou mal,
Consciência inconsciente
Perfeita imperfeição,
Fragilidade, vigor,
Medo, coragem, incerteza,
Conhecido, desconhecido
Colorido, incolor,
Hidrogênio, oxigênio
Da água que arde o fogo,
Antídoto e do veneno,
Aurora, pudor, pureza.
Beleza da criação,
Crepúsculo que a desnuda,
No arbítrio aprisiona
Personagens de nós mesmos,
Ora sapo, ora cobra,
Antítese da criação.
Que mancha o véu da beleza
Substrato abstrato
Que toureia e devaneia,
Que meio às palhas encontra
O precioso de ser.

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NEI DUCLÓS: Tesouros. Poeta Francisco: Teu texto procura numa feira imunda e acha o ouro exposto (portanto oculto, talvez pela mistura, por se confundir com tantas outras coisas, que, conforme o poeta, também transmutam-se). Entre tantas maravilhas, você resgata a glória da mesóclise (“Far-se-iam”) e nos brinda com frases como um “muito justo que sapo tenha mãos”. Pois meu caro poeta, este espaço agora inaugurado no teu grande universo do “Jornal de Poesia” torna-se, pela beleza do teu texto e a riqueza da tua correspondência, totalmente obrigatório. Quero saber (portanto exijo) quando teremos mais. Teu Nordeste agora me impacta novamente, depois de tantos joão cabrais, por meio do “Concerto para Paixão e desatino”, do Moacir Japiassu, da Paraíba. Veja o que escrevi no Comunique-se. Um abraço do amigo Nei

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PAULO ROSENBAUM: Amigo Feitosa, como sempre competência e precisão, sem mácula da consistência poética. Não adianta comparar: é estilo muito seu, singularidade expressa. Denota independência e arrojo. Parabéns, Paulo Rosenbaum

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RICARDO ALFAYA: Caro Soares, li o texto, um revezamento mágico de coelho, com sapo, obra com cobra, num jogo de tangências, de aproximação e afastamento. Há ainda um exercício de colagem de cenas da memória com textos que lhe chegaram, com o qual constrói o tríptico sobre os três enigmas narrados. Em minha interpretação, os enigmas caminham na direção de um outro de maior gravidade e universalidade, que diz respeito à questão do relacionamento verdade/ficção, talvez a questão maior que tenha motivado todo o texto. Como sempre, uma arquitetura deveras singular, com a qual vai cada vez mais caracterizando seu estilo. Desses museus naturais ambulantes de que você fala, recordo-me de ter visto um ainda criança, numa praça em Belo Horizonte, quando passava as férias por lá. Nunca pensei que aquela visita ao bizarro ambiente alguma vez me pudesse vir a ser útil, mas acho que o foi agora, muitas e muitas décadas depois, para ajudar-me a visualizar melhor o ambiente em que transcorre parte de sua crônica. Um grande abraço, Ricardo Alfaya

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SANDRA REGINA SANCHEZ BALDESSIN: Oi Poeta, saudade de você!, como você está? Acabei de ler o seu “juízo quentim”; é como já lhe disse outras vezes: você tem um jeito penetrante de dizer as coisas, talvez porque você se diz naquilo que escreve. Autor e personagem de si mesmo, você segue escrevivendo a sua e a nossa história. A história do que fazemos para “tourear” os nossos medos, para encantar a serpente, para responder ao juízo do fogo; ou, como diria Deus a Jó: “Cinge agora os teus lombos como homem, eu te perguntarei e tu me responderás”. Enquanto sapo, já andei bailando com muita serpente; enquanto touro, já li minha sentença na dança do pano vermelho; enquanto poeta, sigo cheia de incertezas, prefiro continuar contraindo dúvidas.... Um beijo e todo meu carinho para você. Sandra

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