VIAGEM DO VENTO
o vento vem voa
em verdejante jardim
nas asas da borboleta vai
veleja o branco jasmim
no bico do colibri
vaga sobre flores
vintém de afago
no sim das cores
quase brisa suave tocar
a fragrância das maravilhas
ser veículo ou traquinar
veleiro vento das trilhas
voltas na janela aberta
volteios dançam cortinas
visita a bela que se veste
de véus e voláteis aromas
revira rodopios e curvas
vertigem de doçuras viaja
perde-se ao se prender
na vela do branco lençol
eternas asas seu querer
move-se feito inspiração |
HAICAIS
primavera:
manhã no parque
refletido na lagoa
um ipê florido
estrada florida
os passos vão devagar
junto com a brisa
no cacho de flores
pétalas em movimento —
uma borboleta
um suave azul
nestes cachos de glicínia
pedaços de céu?
verão:
a tarde se vai —
em um círculo sem fim
formiga no prato
sol de fevereiro
o prateado da tilápia
na ponta da linha
sem poder dormir
com o Carnaval lá fora —
lua na janela
ribombam trovões
minha mãe corre esconder
o velho espelho
outono:
velho casarão
em completo abandono
floresce o crisântemo
viagem de trem
as quaresmeiras floridas
na Serra do Mar
um templo vazio —
no silencioso refúgio
o canto do grilo
noite alongada —
giram recordações
na velha vitrola
inverno:
sinos em silêncio
atravessa o campanário
um vento gelado
domingo no parque
barulho de folhas secas
entre os caminhantes
cafezal geado —
busca um sino ao longe
mudo lavrador
meu velho pai —
tão perto e tão distante
sentado ao sol
Tercetos:
ah, o presente
um dia será passado
o futuro que ele faz
-
névoa da manhã
um gari solitário
varre o outono
-
assumir a perda
o silêncio do aceno
também perdê-lo
-
é sempre verão ---
nas pernas
da mulher amada!
-
levarei seu olhar
mais que seus beijos
levarei sua boca
-
a tarde insinua
sob o belo vestido
você em si nua
-
ficar contigo
igual na barriga
seu umbigo
-
diante de você
meu bem, meu mar
imensidei-me
-
êxtase
quem sabe
leveza
-
quero ser cremado
virar fumaça
arder nos seus olhos
HAIBUN:
Os frutos dourados do cinamomo
A lua cheia dourada por entre as árvores. Sobe devagar.
Esplandece o luar sobre o casario. Nos cinamomos os frutos dourados
se multiplicam em milhares de pequenas luas.
A moça de avental está na porta da padaria vazia. A janela da
casa da velha viúva ainda está aberta. O homem de boné vermelho
passa com seu cão. O cobrador da estação lê seu grosso livro. Será
que desliguei a chaleira quando saí?
latidos ao longe
com as folhas amarelas
a árvore sem nome
A Colona
Quinze quilometros do centro de Curitiba encontram-se
estradinhas rurais que recortam remanescentes pinheirais, entre
matas de bracatingas, os capoeirões.
O carro avança pelas estradas que serpenteiam campos secos.
Aqui e ali alguma lavoura de invernia, fumaça numa chaminé, a
igrejinha, a venda, colonos.
Esfria mais. Caminha ligeiro levando a pressa e o cansaço da
faina, uma colona. Ela carrega a roupa coberta de poeira vermelha do
trabalho na terra. O lenço cobre-lhe a cabeça, mas não esconde o
acanhamento. Nem o sorriso e os olhos azuis. A fala marcada de
sotaque.
A tarde finda. Não soube seu nome nem para onde ia, e menos de
sua pressa. Levo a beleza da imagem da camponesa nos olhos e a
pergunta: qual a lida que a cobriu com tanta poeira?
sopra o vento sul
dança no ar em zigue-zague
a fina garoa
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