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Lauro Marques

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Caravagio, Tentação de São Tomé, detalhe

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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Lauro Marques

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

William Blake (British, 1757-1827), Christ in the Sepulchre, Guarded by Angels

 

Franz Xaver Winterhalter. Portrait of Mme. Rimsky-Korsakova. 1864.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Thomas Colle,  The Return, 1837

Lauro Marques


Fragmentos
BALADA PARA UM MORTO
(PARTE 1)

“Devemos entrar na morte como
quem entra numa festa”
Jorge Luís Borges

Intro

Para mim basta,
O brilho das coisas vencidas.
O belo não me agrada mais.
Já vi mais palavras “coloridas”,
Do que poderia suportar;
A luz que me alumia,
O sol que me enfastia...
Entrego a ti as tuas fadas.
Deixa-me morrer em paz
Com meus demônios !

I

Escuridão de pasto que volveia os sentidos
Vento crepuscular da aurora da noite
Torvelinho de emoções sentidas;
Encharca tua boca leprosa de vinho
Dize aos nove mundos tua prece:

“Que venha o mar, tenho sede
Sua volúpia não me arrastará
Que venha o sol, tenho frio
Sua chama não vai me queimar
Hoje, dos quatro elementos,
Quero me fartar !”

O olho do mundo
Um gigante descarnado de luz
O céu prepara seu próprio funeral
As nuvens estão vestidas de vermelho
Daqui a pouco, a noite se cobrirá de luto
“ Impressionante cotejo fúnebre
São as nuvens que passam
Carregadas de chuva
E de negrume !”

Alegra-te
Hoje, da carne de teu pescoço,
Faremos um almoço
Das vísceras desse animal morto.

II

Fogo de morteiro.
Pranto que não se afoga:

“A paisagem ocre está mudada.
Vi metáforas coloridas subindo
Um céu sem vida”

Indiferente às estrelas brilha
um descampado de natureza morta.

III

Eu quis o aço,
o gosto áspero dos metais

Não me foi dada a primavera.

“Põe teu fêmur sobre a pilha e incinera!”
– Gritei

(Cega pela luz a faca enterrada
no peito
à noite sangram os girassóis)

Como se fosse a aurora,
a luz que ilumina o bosque
o homem
A G I G A N T O U – S E

E perdeu a forma

O orvalho esquecido das horas tardou
E a cigarra cantou os versos de outrora.

IV

Carne exposta ao vento e ao sol, a secar.
Hirto de pavor, um surto de dor, que me cega o peito
e chamusca a alma.
Peixe fora d’água, dilacera-me as guelras
A ânsia vã de respirar.

V

Convulsão de alma.
O espírito está distorcido e abandonado.
Em águas turvas se banham os condenados.
E sua essência é espuma de um mar salgado.

“Um bando de éguas azuis passam trotando
no meu crânio repleto de pensamentos vazios.
Cego das coisas, eu me avizinho.”

A alma em pânico pede socorro e sai rasgando
as entranhas – na verdade se agarra.
Um fio de sangue lhe aflora à boca pálida.
Apodera-se de si um terror inominável.
Sinapse de neurônios desarticulados,
[suas têmporas latejam

(Segue uma série de movimentos em falso)

O ocaso entregue aos deuses da loucura e do cansaço,
Um grito se estampa na cara

E numa golfada de sangue, escancara:

“Misto de oceano e búfalo o corpo se afoga
[em lágrimas.”

VII-SUS

Dor implacável!
Junte-se a mim os fracos,
os que perderam a razão!
Anda! Levanta os braços! Caminha moirão!
Que sabe de ti, estúpido palhaço, incalculável fiasco,
rosna cachorro, com sofreguidão!
Vai-te! Come teu pão!
Que amanhã lhe falta...

VIII-REVELAÇÕES

...E eis que vejo-me inteiro.
Desprovido de carne.
Feridas entreabertas e o sussurrar das veias e artérias
Pulsando sangue.

Toscos os corpos na luta,
pouco a pouco acham-se cansados.
Os aparelhos incinerados e dão por perdida a batalha:

“Por que os sons que ouvia ’inda agora,
chegam já tão tarde aos meus ouvidos debilitados?
Onde estão as fadas e os sinos,
que cercavam condenados?

“Havia campos, havia mares,
de tão fulgurosa existência...
Que há agora que se compare,
senão desertos, demônios insulares?”

IX

Prisão de incontáveis desígnios,
a alma, encharcada de tédio,
sofre muito para chegar
num ponto qualquer.

Eqüidistante das estrelas.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Jornal de Filosofia

Lauro Marques


Mas não podemos


Mas não podemos
evitar
o sereno
quando a tarde cai ---
o pensamento é como um pouso.
De novo e sempre
no mesmo ponto,
sendo diferente.
O que mudou nesse meio-
tempo entre um verso &
outro, que posso Eu
dizer de seus
olhos?
 

 

 

Tiziano, Mulher ao espelho

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Cláudio Feldman

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Jean Léon Gérôme (French, 1824-1904), Morte de César, detalhe

Lauro Marques


Comentários de Affonso Romano de Sant'Anna(*)


Sobre Balada Para um Morto & Outros Poemas


"Lauro, chegando do Irã, dei uma lida transversal nos seus textos (pois estou saindo de novo de viagem: feira do livro no Piauí, e depois centenário de Neruda no Chile). Fui lendo e me impressionou muito. Você sabe das coisas, tem garra, está fazendo algo bem pessoal. Tem uma rara força verbal entre o profético e o estilo Nietzschiano de Zaratrusta."

[...]

"Siga em frente, meu caro Zaratrusta de Mossoró (desculpe a brincadeira **): é que no Irã subi a montanha do Templo do Silêncio onde seguidores de Zoroastro celebravam há 2.500 seu culto."


Sobre o poema Fábula

Torre do Silêncio, Irã

Torre do Silêncio, Irã


"A coincidência, Lauro, está em que no topo do Templo, havia realmente um iraniano com uma pomba branca nas mãos, assustadíssimos, os dois.
Affonso."


(*) Affonso Romano de Sant'Anna. Na apresentação de Márcia Denser, escritora e pesquisadora.


[...] poeta, crítico e professor Affonso Romano de Sant'Anna, um dos principais teóricos brasileiros e analista da cultura (Barroco: do quadrado à elipse, O Que Fazer de Ezra Pound?, Desconstruir Duchamp).
Presidente da Biblioteca Nacional de 90 a 96 criou o Sistema Nacional de Bibliotecas e o PROLER; como diretor do Departamento de Letras e Artes da PUC/RJ organizou, nos anos 70, a pós-graduação em literatura brasileira. Professor em várias universidades brasileiras (UFMG, UFRJ, PUCRJ), deu cursos no exterior nas Universidades de Los Angeles e Texas (USA), Köln (Alemanha), Aix-em-Provence (França); lançou a revista Poesia Sempre de circulação internacional, é autor de cerca de 30 livros de ensaios, poesia e crônicas.

Affonso Romano de Sant'Anna é colunista do caderno Prosa e Verso do Jornal o Globo.

(**) A brincadeira é porque o poeta, nascido em Campina Grande, na Paraíba, passou 11 anos de sua vida em Mossoró, Afeganistão.


posted by LAURO MARQUES | 01:17

A Mácula, blog de Lauro Marques
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"O verdadeiro pecado é escrever para o público." (Paul Valéry)
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Lauro Marques


UMA CANÇÃO (GARRAFAS DE CERVEJA)
* apelidada "Ameaçando a escuridão"


Lauro Marques


Muita coisa mudou
Os planos são outros
Ecos sem sentido
Você voltando p’ra casa
No domingo
E ninguém mais sorrindo
Faz o mundo girar
No chão da sala
Quando pego na sua mão
Com luvas de plástico
Não de pelica
Esqueci todo o resto
Abra a geladeira
Eu abro meu peito
E as garrafas de cerveja
No piso sujo da sala
Ameaçando a escuridão.



O e-mail de contato para divulgação e para receber o CD inteiro é:

contatomacacco@yahoo.com.br

 

 

 

Franz Xavier Winterhalter, retrato de Roza Potocka

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Teresa Schiappa

 

 

 

02/05/2005