Sébastien Joachim
Soares
Feitosa,
um poeta à margem das classificações
Os poemas de Soares
Feitosa são eventos que desconstroem a maior parte do ensinamento da
Poesia divulgado em todos os nossos manuais de Teoria da Literatura.
Quem o vê/ouve declamando seus poemas se convence logo de que ele é
uma encarnação poética, que carrega dentro de si e irradia
poeticidade em estado puro. Essa experiência premiou-me, há algum
tempo, um banho de frescor sem igual. Confesso, que no momento,
ignoro de onde jorra a fonte, e em que mar ela vai parar.
O certo é: eu que saí
de lá (Canadá) estou recebendo aqui nos trópicos esse choque
agradável como alguém que foi quase empurrado de Sertão a dentro
pela violência poética de Soares Feitosa. Sua poesia trabalha
entidades maravilhosas: auroras inéditas, esplendor da infância,
fauna e flora da região das Secas, epopéias insuspeitadas de
misteriosos itinerantes, e - em contraste - a petulância do
capitalismo selvagem.
Ressoam em mim as
modulações dessa voz, ou melhor, desse coro, aqui “allegro andante”,
ali “mezzo voce”, cá no “modo menor”, lá no “modo maior”.
É elegia, é epopéia,
é drama, é verso, é versículo, é prosa narrativa, é História, é
fábula, é teatro. Impossível enquadrar Soares Feitosa num gênero de
discurso preestabelecido; daí estar decididamente à margem de
qualquer classificação.
Todavia, emerge uma
propensão à Cantata, uma Cantata-Poema ou um Poema-Cantata, de
múltiplas vozes, regulado por uma alternância rítmica onde se enfiam
de forma espiralada historinhas que puxam historinhas e digressões
que se tornam temas fundamentais do Ser e do Existir.
Um dialogismo que não
acaba, um processo diruptivo no seio de uma profunda continuidade. O
novelo da escrita se desenrola, sempre se desenrola, de par com a
mesma força impulsionadora, isto é, sempre sertenejando, no entanto
sempre diferente pelo tom musical, pelo aprofundamento dos
incidentes regionais, conduzindo-nos vertiginosamente para a
residência da Vida e dos Valores imperecíveis.
Sem dúvida uma
poeticidade forte circula nessas páginas onde consegue fazer a
abertura máxima no acidente mínimo, seja esse acidente de geografia
ou de eventos. Palpita a presença de Dioniso e Apolo, a
sensibilidade de um homem que fala para todos os Homens, todas as
idades, todas as eras.
Atravessar esse
Sertão poético resulta em um estonteante estado de poesia,
prazeroso, galvanizante. Obrigado, Soares Feitosa, por ter nascido e
RENASCIDO. Daqui em diante o caminho a percorrer é a difícil subida
dos Prometeus das Letras que não recuam perante o heroísmo da
Autocrítica, - mais dura batalha da maturidade poética.
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