Regina
Souza Vieira
Perguntas,
Dúvidas, Inquietações
Há tantos prazeres buscando
um espírito que lhes dê repouso
que eu às vezes busco na escrita
um simples momento de pouso
Mas a escrita é muito ampla
quer prazer e até desconsolo
há tantas flores no campo
que mal lhes vemos o miolo
Meu íntimo é um remo expulsando
de sua frente os empecilhos
talvez eu palmilhe grandes trigais
da ida talvez eu guarde
a ânsia de mil andarilhos
Todos nós somos iguais
Meu espírito clama por sossego
Quero ser feliz, viver em paz
numa roda de amigos, ver minha família
na minha família, só ter amigos
quero palmilhar pelas ruas e travessias
plantar em meu jardim uma simples tília
e esquecer, outras flores até desconheço
Minha pessoa é um enigma indecifrável
e eu tento me entender todos os dias
e a cada dia torno-me mais confusa
a sensibilidade é uma arma poderosa
manipula nossas palavras
perde-se e anda perdida dentro de nós
se nós a usamos, mais ela nos usa
e de tanto nos usar – de nós até abusa!
Um dia, chegarei a me entender
Quem sabe?
Hora da Sabedoria
Meio-dia: Hora de rezar
Meia-noite: As bonecas desencantam
Longe, os pássaros nos encantam
Não é de tristeza o seu cantar.
Meio-dia, meia-noite, horas obscuras
no grande relógio da vida
na atmosfera nebulosa do saber
que sempre buscando saber mais
perde-se na hora, no tempo, que sempre sem tempo
um dia nos fez nascer, para no outro,
nos deixar morrer.
Meio-dia: sol alto, calor a agasalhar
Meia-noite: penumbra, silêncio, sonhar
Dois extremos tem o tempo desde o tempo
em que sem hora se vivia
Meio-dia, meia-noite, que fantasia
Por que saber a hora, se apenas em nós
no interior do eu é que estão a noite ou o dia!
Meio-dia, meia noite: dois ponteiros colados
apontando para o infinito
que também só dentro de nós
se revela ou feio ou bonito.
Continua o mistério, que nunca se elucidou
Pois se é mistério, nada o esclarecerá
Meio-dia, meia-noite, falem filósofos, magos ou deuses
Nós, homens, quem de Vocês ouvirá
Essa verdade que ad aeternum ninguém saberá
e o mais belo é esse não saber e buscar
Na meia-noite, no meio-dia, o tudo ou o nada
que ninguém sabe se ainda vai achar!
Espaço para Sorrir
No silêncio deste dia
que já avança no solaço
ainda não se achou o espaço
para o meu sorriso bonachão
sorriso de bouche à l´oreille
Como é bom sorrir assim
afastando pra longe as dores
alastrando o que há de bom
dentro de mim.
Mas o dia já vai alto, no entanto
Meu riso permanece adormecido
terei deixado lá no fundo vencido
o meu tempo de ser feliz?
Não, não sei se foi a vida que quis
se meu destino de mim se encarregou
hoje, ainda não sorri nem chorei
tampouco meu ego despertou
Estranho dia, estranha manhã
leva-me ao vento, bonachã
deixando-me quieta, tranqüila
sem meu peso, sem minha dor
Emancipação
Ontem, o meu filho se desprendeu do
limbo
Coloquei-o, sozinho, no correio; ele viajou
Alcançará destinatários que nele vão ver
defeitos e qualidades que meu zelo desconhece
Meu livro viajou estados e países afora
Emancipou-se de mim que o fiz nascer
só com carinho
O meu livro se foi, foi sozinho encontrar leitores
como um filho que parte, eu lhe disse adeus
mas eu estava feliz porque, anseios meus
alguém a distância o esperava e folha a folha
quem sabe, me revelará o seu interior
Hoje, o livro que escrevi já não é só meu
e foi para este fim que criei aquele mundo
só que o concebi à minha cara, à minha sensibilidade
dotei-o do que pensava e que julgava ser para mim
o correto de minha mensagem
Meu filho se foi pelos trilhos do correio
Destino certo: encontrará um outro pensar
Quem sabe um leitor afeito a desfolhar
a rir, chorar ou repreender minha forma
de um novo mundo em mim criar.
Uma certa dor de despedida fica na mãe
mas um orgulho também lhe sorri
porque foi com este objetivo que escrevi
de nada adiantaria guardar pra mim a minha cria
Um livro é um filho, amor é criação
Felicidade é ter a quem entregar já criado
o filho que palma a palmo foi elaborado
no ventre fértil de nosso interior
Vai, filho meu, espalha pelos caminhos
teus eflúvios de intenções, mensagens
profícuas, fundadas no amor.
Falta Alguma Coisa
Numa manhã de domingo, ensolarada
A alegria invade a minha janela
Por que será que, em mim, a manhã não é bela
Por que, para mim, esta manhã não é aquela
que eu gostaria que fosse, toda ela alegria?
A cada dia, quero o dia seguinte
a noite superada depois de um bom sono
A cada manhã eu busco da festa em mim
o retorno, e quase sempre minha festa
tem uma alegria menor do que a sonhada
A manhã, anuncia um dia feliz, ensolarado
Eu, me aquieto lendo tranqüila o jornal
Mal ouço o assobio matinal, que luminoso
me diz que o dia é todo de sol!
Talvez porque nas manhãs de domingo eu sofra
depois de uma semana, o grande cansaço
Talvez não me anime a ver o oposto do mormaço
Porque, pra mim, o domingo é uma tarde
que exige uma transação para o dia seguinte
mas a manhã traz frescor, vontade de viver
um dia de descontração se anuncia pra vida
parece do contra esta espécie de emoção
que, em mim, apaga o que seria festa e se abre
em vontade de dormir por mais duas horas.
Quem sabe, olhando melhor este sol, ao longe
Vendo azul o horizonte, ergo minha fronte
desfaço em mim este desânimo tristonho
e, alegre, disposta ao sol, feliz me ponho
e começo, porque é domingo, a rir e a cantar!
Esquecendo este lento quase chorar
que precisa de incentivo para ser feliz!
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