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Odete Miranda


 

Flutuando


Neste universo vazio, repleto de nada
Com o arremesso da dor, sempre presente
Não vai, não vem, não fica parada
Sem rumo, sem direção, não pensa, não sente
Girando sem direção. a esmo
A humanidade não sabe para onde vai
As gerações flutuam no espaço
Não sabe se voa ou se cai
É som, é ruído, é zuada, é zonzeira
Olhando o vazio em qualquer direção
Sonhando com a sombra, dormindo nos ares
Num caldeirão de escuma mergulhado
Sem despertar para a cruel realidade
Pairando sob o sol, para sentir o seu calor
Buscando um sentimento que se chama "Amor".
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Da Vinci, La Scapigliata, detail

Odete Miranda



Susto


Escutei o estouro do canhão
Pensei que era trovão
A fumaça se espalhou
E o mundo chorou
O relâmpago não veio
Eram chamas de fogo devastando o nosso viver
Destruindo o que era nosso sem permissão
Arrancando com mãos de ferro, o nosso coração
Pondo um final em nossa alegria
A tristeza chegou e a fome nos faz companhia
A sede destruiu nossa existência!
Um grito de alarme ecoou no espaço
A vida pede clemência
Acabou nossa liberdade
O medo nos proíbe de caminhar
O pavor envolve a terra
Vou correndo para o sul? Ou devo ir para o norte?
Quero fugir da granada! Quero me livrar da morte
Se eu subir para as nuvens, só vou respirar fumaça
No mar, tem navio de guerra
Na cidade, o tiroteio é intenso
As favelas estão imersas
De lama e poluição
Os sertões estão desmatados
Junto aos animais que ainda restam
Choremos juntos, então!
 

   

 

Maura Barros de Carvalhos, Tentativa de retrato da alma do poeta

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Barros Pinho

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Franz Xaver Winterhalter. Portrait of Mme. Rimsky-Korsakova, detail

Odete Miranda


 

Bem distante


Longe, bem longe da terra
Distante da tirania
Onde não existe guerra
Onde reina alegria


Onde a paz é constante
E a felicidade reina
Do mal vivendo distante
Não tem aranha, nem teia


Onde o lobo não tem vez
A ovelha vive sem medo
Pastando no arvoredo
Dormindo em qualquer lugar
Com direito a liberdade
Da relva tira o sustento
Jorra a água, sopra o vento
Sobe o morro, desce a serra
Olha o sol, vê as estrelas
As nuvens lá no espaço
Vem a garoa, a neblina
E com amor, a mão divina
Nos conduz no Seu regaço.
 

   

 

William Bouguereau (French, 1825-1905), Mignon Pensive

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Lilian Mail

 

 

 

 

 

 

 

 

 

William Bouguereau (French, 1825-1905), Reflexion, detail

Odete Miranda



É noite


Quando a noite cai
O firmamento se transforma
O soprar do vento é diferente


O mundo sonolento adormece
E sonha
Seu corpo repousa sobre a cama
Descansa
Vem a madrugada, inicia o amanhecer
O galo canta
No oriente, lentamente, vem surgindo o sol
É dia


Vamos ao labor, trabalhar é viver
Viver é sentir paz, mesmo na guerra
Viver é vencer os grilhões da ansiedade
Viver é enfrentar a realidade
Viver é não olhar para trás
É o hoje vivido em harmonia
Amanhã será um novo dia


Viver é retirar da lama uma gota de água pura
É externar da alma toda candura
É sorrir mesmo na dor
É cantar aos céus um hino de amor.
 

   

 

Alexander Ivanov. Priam Asking Achilles to Return Hector's Body

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Roberto Pires

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Frederic Leighton (British, 1830-1896), Memories, detail

Odete Miranda



Não acabou


"Temos ainda cinco pães e dois peixes"
A multidão faminta se assenta no chão e espera
O Filho de Deus diz:


Não me deixes
Confias em mim, contigo sempre estarei
Enquanto o sol brilhar, tu brilharás também
Água da vida beberás para o teu bem
Não temas, a tempestade eu acalmarei
Até no deserto, contigo hei de estar
No mais profundo mar, contigo mergulharei
Do pico da mais alta montanha, contigo descerei
Sou teu pastor, o lobo não vai te pegar
Te darei da relva mais verde para teu alimento
Eternamente serei teu sustento
Confias em mim, mais do que confias em ti
E verás que a tua dor passará
Caminhes numa só direção
E tua vida permanentemente brilhará
Com Cristo no teu coração
Teu sorriso perene será.
 

   

 

Ticiano, O amor sagrafo e o profano, detalhe

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Ivo Barroso, 2003

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

John Martin (British, 1789-1854), The Seventh Plague of Egypt

Odete Miranda



"Ô Paiê"


Pai, eu e mamãe te amamos
Porque tu nos assistes e nos valoriza
Nas lutas, nas dores, juntos estamos
Assim, teu valor se eterniza


És bom amigo, és provedor
Sincero, fiel, sempre presente
Meu pai, reconhecemos teu valor
Não só neste dia, mas eternamente


Chamo você de papai
Você não me chama de filho
Me bate, me xinga e se vai
Solidão e fome é meu estribilho


Meu pa-a-ai!! cadê você?
Eu estou lhe esperando
Desejo lhe conhecer
Meu coração "tá chorando"


Sou fruto do seu pecado
Fruto sou do abandono
Não pedi pra ser gerada
Seu crime, me tira o sono


Sou moleque da calçada
Eu sou menino de rua
Meu nome é Ninguém, é nada
"Ô paiê! qual é a sua?"
 

   

 

Culpa

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José Santiago Naud

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Michelangelo, 1475-1564, Teto da Capela Sistina, detalhe

Odete Miranda



Fiz sem saber


Eram alguns anos já passados
Eram pérolas sem brilho, cristais perdidos
Furtando momentos, só para o pecado
Os prazeres do mundo, eu havia conhecido


Nos camarins da orgia e da depravação
Do cigarro mudo que falava tanto
No vício da droga, a vil tentação
Do meu corpo vendido, gozava os encantos


Passava os dias de muitos deleites
Vestidos e jóias me ornamentavam
Tesouro eu tinha, em ouro e enfeites
Tudo eu possuía, nada me faltava


Num dia "feliz" alguém me tocou
Uma voz muito forte eu escutei
Queres me seguir?
Então caminhei


Era estreito o caminho, mas fui caminhando
Era muito espinhoso, mas tinha uma luz
Alguém lá no fim me estava esperando
E me disse seu nome: "Me chamo Jesus".
 

   

 

Um esboço de Da Vinci

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Pedro Salgueiro