José Santiago Naud
Na rua solitária
Na rua solitária
com o sol a pino
uma reta de ouro se alastra
ofuscando tudo
e tingindo as coisas.
Réstea de espanto
o grito do louco risca o céu
azul
em linha oposta à sombra da árvore.
No aconchego materno de umbu
partem-se paz e sossego, a doçura
e o ponto justo
são de repente um raio na desmesura do grito do louco
com a sua alma em frangalhos num leito de chamas
a espatifar os olhos do menino
presos no silêncio da praça.
Ficou da sensação
o pavor dominado, aquele preciso instante
da visão de um reboco vermelho
no muro descascado,
os tijolos s à mostra
e a calçada
dura,
asperezas,
fascínio,
destemor,
e o grito do louco
riscando de sangue o céu azul.
Assim também (oculta)
a cadeia da herança espiralava
o explícito das formas, pura aparência
com o espírito dentro desde os espaços abertos,
um ato feito em nós:
Deus
escrevendo a peça que dizemos
com a memória das células,
mandado e medo de cumprir
a hora prescrita,
o tempo certo de sair -
clara mandala.
Como o salmão remonta as nascentes
para deixar à aventura do rio os seus ovos
e ali
fluindo
começar a morrer, assim
o louco grita
ou nós, apoderados da razão, desandamos.
Só um cão é companhia
Que volte os nossos olhos para a luz
Ou na treva compasse os nossos passos.
Dentro da gruta
espessa
os nossos nervos pulsam impacientes
e passa de pai a filho o relâmpago das mães.
De repente
as ruínas circulares dos desabamentos fatais estão ali
e são
como o grito do louco
em reta de ouro
o quadrado da praça - um raio
de saudade
agora
aqui
total lembrança,
fiel presença
para sempre fatal
em sombra iluminada.
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