Francisco José SOARES FEITOSA vem
do Ceará, precisamente da região dos Inhamuns, para
revolucionar, com poemas calcados na informática, na eletrônica,
e feitos de criatividade, o mundo estético-literário
de nossos dias.
Sem descer ao poema, protesto que se perdeu na luta
inglória do presente contra o passado, da primeira geração
do Modernismo, Soares Feitosa, poeta de grande formação
humanística e de inegável dimensão de universo - consegue
traduzir, com suporte no ritmo psicológico, o sofrimento dos
irmãos nordestinos pelo flagelo das grandes estiagens, embora
sempre altivos, “resistindo e morrendo, morrendo e
resistindo”, na feliz expressão do imortal Demócrito
Rocha, no poema o “Rio Jaguaribe”.
Além disso, sabe retratar, com fidelidade,
a resistência heróica da sua gente, na mencionada região
dos Inhamuns, em lutas sangrentas entre famílias tradicionais.
Evidencia coisas e fatos ocorridos, por exemplo,
em sesmarias, sem enveredar-se pelo gênero narrativo ficção,
mas dentro da epopéia mesclada do sopro lírico.
Mergulha na antiguidade clássica,
com a divisão em Cantos, à Camões, verdadeiro
escafandrista, para revitalizá-la nos seus poemas, alguns sob
a forma dialogada, à guisa de écloga (ou égloga), dentro
do bucolismo, de sabor arcádico.
Sentimos ao longo da obra, resquícios
de estéticas tradicionais, características formais e
ideológicas de diferentes estilos de época, em versos livres
feitos de modernidade.
Soares Feitosa, nascido em 1944, tem muito
chão que percorrer, para continuar a retirar, com idealismo
e sutileza, das notícias do jornal, do prosaico, das coisas
efêmeras, o fazer poético - os valores eternos.
2 - Talvez outro salmo
Tive a satisfação de receber
Talvez Outro Salmo. Considero simplesmente encantador e surpreendente
esse desfecho do saber eterno:
“— Como podem saber tanto
de nunca escreverem uma única linha em linha reta?
"— Porque é da Tua boca, Senhor,
e para os Teus ouvidos
que a boca deles fala”
Tudo tão paradoxalmente simples e original!
E passei alguns momento embevecido com a
magia estonteante da singularidade dos versos de Uma Canção
Distante e tão dentro da alma da gente!
3 - Artigo no Diário do Nordeste
Para ler e entender Soares Feitosa,
com a idade cronológica de 82 anos, talvez necessite da acuidade
mental de um jovem de 28. Haverá coincidência na inversão
dos algarismos?
Cearense dos Inhamuns, homem de
meia idade, atordoado com os cálculos dosimétricos
impostos pela sua função de Fiscal da Receita Federal
em Salvador, BA, entre outros afazeres no Recife, PE, partiu loucamente,
para o mundo das letras, na ânsia ardente e incontida de passar
para o papel, sem tergiversar, o que lhe vai no imo d'alma. E, agora,
em gozo de licença-prêmio, no recesso do lar, nesta Loira
Desposada do Sol, de Paula Ney, está mesmo muito à vontade,
do jeito que bem quer, com dedicação exclusiva à
poesia.
Soares Feitosa, através de sua veia estético
literária, recua no espaço e no tempo. Verdadeiro
escafandristaa, mergulha em outras eras, na origem das coisas,
no Livro dos livros — a Bíblia — notadamente nos
Salmos, para fisgar os segredos do Cosmos em Psi, a
penúltima. Deixa refletir em cada poema a renovação
da vida, do homem, e da arte, a simplicidade de usos e
costumes antigos revitalizados na modernidade, ao sabor do
Pastoralismo, sem artifícios prosaicos. Quanto à forma,
trata-se em geral de poemas longos. O leitor, por vezes, até
se perde, se não tomar cuidado, no emaranhado de versos
(brancos ou soltos), em estrofes heterométricas, feitas de
ritmo psicológico. Via percorrendo, não raro, a seqüencia
dos versos e tem a impressão de que o poema se desfaz em
prosa. Até parece haver descambado para o gênero ensaístico,
sob a forma de crônica leve, fronteiriça, não da loucura,
mas do gênero lírico. O poeta sabe penetrar, por exemplo,
bem dentro, com sutileza, em Poemetos:
"num silêncio de
limo,
num silêncio de
folhas,
que também de telhas...
as telhas de um céu
insuportavelmente
estrelado
"A chegada de Soares Feitosa, disse Artur
Eduardo Benevides, o Príncipe dos Poetas Cearenses — é um
episódio de significação marcante. E quem o ignorar não
sabe o que é poesia"
E ele chegou para fazer a revolução
estética no mundo das letras, para fazer transbordar o seu
lirismo (entre louco e sublime), às vésperas do terceiro
milênio, ó grande enamorado das musas, na beleza do seu
estro fora do comum, longe dos cálculos dosimétricos de sabor
prosaico. Seja bem-vindo, Soares Feitosa. Deus o proteja. (in Diário
do Nordeste, Fortaleza, CE, 20.08.1997)
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