Dellano Rios
22.6.2008
Para além dos gêneros
Uma das principais autoras cearenses das
últimas décadas, Tércia Montenegro lança novo livro
e discorre sobre a escrita literária
Tércia Montenegro é daquelas autoras que mergulham
na literatura. Não a encara como hobby e fez dela
sua profissão - leciona literatura e fez nesta área
seus estudos acadêmicos. A escritora não se mostra
muito interessada nos debates que insistem em
colocar homens e mulheres como que em lados opostos
em um campo - no caso, literário. O que não quer
dizer que ela desdenhe da
discussão ou deixe de ter um posicionamento a
respeito.
Uma das principais vozes das novas gerações da
literatura cearense, Tércia Montenegro acredita que
os preconceitos existentes são de outra ordem. “Não
acho que tenha sofrido preconceito por ser mulher.
Acredito até que isso tenha me dado um destaque, já
que era a única mulher desta geração, a mesma do
Pedro Salgueiro”, avalia. “O preconceito que sinto é
por ser nordestina, da dificuldade de achar uma boa
editora, que distribua nossos livros”, crítica,
fazendo eco a uma reclamação recorrente.
A expressão literatura feminina é olhada com certa
desconfiança, “se você estiver falando em ‘feminina’
no sentido de existir um conjunto de características
fixas, como se toda mulher escrevesse dessa
maneira”. Tércia questiona considerações do senso
comum, que veria na escrita das mulheres uma
tendência maior ao psicologia e ao intimismo. “O que
quero dizer é que as características não são
permanentes. Por acaso, uma pessoa negra faria uma
literatura diferente dos demais escritores apenas
por ser negra?”, questiona.
“Existem estudos estilísticos, estatísticos até que
pretendem fazer um levantamento sobre as escritoras.
Eles podem chegar a alguns dados, como, por exemplo,
que as mulheres adjetivam mais que os homens. É algo
interessante, mas pense no leitor comum. Ele sente
isto quando está lendo? Acho que não”, comenta. Tércia Montenegro deixa entrever que sua preocupação
é outra, com o texto e o leitor.
E foi em sua condição de leitora em contato com o
texto que se aconteceu seu despertar literário.
“Quando comecei a ler, lia mais autores que autoras
por uma questão de quantidade, pois o universo de
homens publicando era maior. Com isso, fui criando
uma idéia de que a literatura era meio que um
território masculino. Eu tinha essa vontade de
contar histórias, mas era como se meu sexo me
impedisse de ter uma carreira futura. A epifania
aconteceu quando li, aos 12 anos, ‘Antes do baile
verde’, da Lygia Fagundes Telles. Eu via o nome
feminino, a foto da Lygia e os contos fenomenais.
Foi como, se a partir dai, houvesse uma permissão:
as mulheres podem escrever. Foi o que me livrou do
fantasma que tinha criado”, relembra a escritora.
Seguindo os passos:
E foi com autoras como Cecília Meireles e Clarice
Lispector que Tércia Montenegro herdou seu gosto
pela literatura infantil. Às 17 horas, ela lança seu
terceiro livro para crianças, no auditório do Centro
Cultural Banco do Nordeste. “Vítor cabeça-de-vento”
foi ilustrada pelo artista plástico Glauco Sobreira.
Tércia apresenta um conto, mais “leve” que sua
literatura adulta, protagonizado pelo imaginativo
Vitor.
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