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Clauder Arcanjo 

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Herbert Draper (British, 1864-1920), A water baby

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Poussin, Rinaldo e Armida

 

 

 

 

 

Clauder Arcanjo



Bio-Bibliografia


Natural de Santana do Acaraú (CE), 41 anos, casado, pai de três filhos. Um cearense que tem Mossoró como sua terra por adoção. Engenheiro, escritor, poeta, cronista. Mas, gosta mesmo de ser apresentado, e saudado, como professor. Ensina na UERN – Universidade do Estado do Rio Grande do Norte e da UnP – Universidade Potiguar. Segundo ele, é nesse exercício que se realiza plenamente. Um dos idealizadores do Projeto Pedagogia da Gestão, com várias realizações voltadas para gestão, educação e cultura.
 

Cronista semanal do Jornal Gazeta do Oeste (Mossoró-RN), resenhista literário do Jornal Literário Mensal O Clandestino, Menção honrosa do Prêmio de Poesia Luiz Carlos Guimarães 2003, promovido pela Fundação José Augusto – Natal/RN. No prelo, ainda inéditos, um livro de poesia e outro de contos e crônicas. (2006)


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Poussin, The Empire of Flora

 

 

 

 

 

Clauder Arcanjo



Mestre infenso à glória
Para o mestre Francisco Carvalho


Enquanto os tolos brigam pelas luzes da glória,
O mestre, sereno e contido, cintila na escuridão.
A máquina do mundo tenta devorar seus dedos
Em sua busca do sentido-mãe da dor dos parcos.

O mestre volta-se para a alquimia inconfessa:
Dos ritos, dos risos, das abulias, das quimeras...
Os outros devoram-se na noite crua das feras;
Nem se lhe dão que alguém argüe a cruel esfinge.

No meio das litanias mais tolas, cercado do oco...
Um poeta decifra duras mentiras com palavras.
Palavras lavradas na bateia do Lácio, no suor
Dos fossos, na briga pela vida – por entre os dias...

Enquanto uns se cobrem com vestais de vidro,
Um homem, infenso à glória, zela pelo humano.
Lida com os versos para oferecer uma hóstia-santa
Em forma de poema, mesmo que noss’alma gema.

Mister se faz que se feche a boca louca da mídia
E se volte um dos olhos do mundo para sua cria.
Guardião do humano, garimpando sem pressa...
Colorindo o mundo com o centauro da Poesia.

Não espera aplausos, expurga as ovações,
Reza pagão pelo povo, xinga os mandantes,
Planta entre nós fúlvio diamante no zênite
Que parece (?) com a força de uma criança...
 

 

 

 

A menina afegã, de Steve McCurry

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Renata Palottini

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Poussin, Rebecca at the Well

 

 

 

 

 

Clauder Arcanjo



Cabra de pedra
A João Cabral de Melo Neto


Ser racional, rocha, pedra.
Fitar o consciente, faca afiada.
Correr com o rio do riso, banir o tolo sorriso.
Exorcizar a volúpia, o transbordamento.
Arquitetar, raspar os excessos.
Ouvir o canto primal, verão solar.
Procurar, catar a palavra exata, sonata-miolo.
Nada que falte ou exceda.
Mastigar, ulcerar, triturar o excedente...
Tecer o cerne da pedra, miolo inconsútil da pedra...
.................................................................................
Arquiteto da pureza que choca,
Fostes o maior dos estetas – anti-supérfluo:
Cabra, e cobra, do pensar, e criar, com pedras.
A pedra das pedras. Sem plumas, com unhas.
Poesia severina. Tradução de todas as sinas.
 

 

 

 

Ruth, by Francesco Hayez

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Ana Cristina Souto

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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John William Godward (British, 1861-1922), Belleza Pompeiana, detail

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Um esboço de Leonardo da Vinci

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

As Carnaubeiras de Catuana

 

 

  

 
 

Clauder Arcanjo
 


 

Metal sem Húmus, de Dércio Braúna

PAPANGU - Revista do Rio Grande do Norte, ano 6, nº 62, abril/2009

Autores & Obras [p. 42-43]

 

Mais um livro de poemas do cearense Dércio Braúna, Metal sem húmus, 7Letras, 2008. Lavra de um daqueles vates que fazem da escrita “uma arma grávida de futuro”, como consta na dedicatória do tomo.

“A escrita não pode esquecer a infelicidade de onde vem sua necessidade.” – Michel de Certeau, em A escrita da história. Espécie de vaticínio do que nos espera?

Na apresentação, “Das páginas admiráveis impossivelmente condensadas no poema”, um pouco da (des)razão contida nos versos de Braúna:

Numas suas palavras sobre a origem da poesia, Nietzsche nos diz do aparecimento da poesia como forma de suavização da ferocia animi do homem.

Se assim foi, há contudo que se dizer do haver de tempos em que justo o contrário se dá, tempos em que a ferocidade de ânimo constitui-se no próprio corpo, na própria ossatura da poesia.

Eu vivo num destes tempos.

Tempo de dor, ao passo que de lirismo pungente; de lágrimas e procissão de degredados. Denunciados pela dor e pelos olhares, ocultos por detrás de olhos pálidos e, de vez em quando, brilhantes. E, no oco desse brilho, a luz-palavra clarividente de um aedo a escarafunchar, e decifrar, tais ossadas do cotidiano.

De início, “Oratório ao açougueiro sem câimbra nos braços”. “Poesia, máquina perversa cujo cortar lhe aumenta mais o corte...” – alerta-nos Durval Muniz, em A invenção do Nordeste e outras artes. Dércio, então, nos confidencia o seu modos faciendi: “amolo minha lâmina/ como quem ensaia dizimentos e cantos/ ao som de coros de ambivalentes arcanjos.”

E este resenhista, ambivalente corista de estrofes alheias, arcanjo de métrica malsã, se embevece com o fulgor do poema “Açougueiro sem câimbra nos braços”. Quando a descrença se apresenta na página, dá-se envolta em beleza, luzeiro indescritível. “Não há para onde correrem/ as crianças/ ou a poesia/ sob suas telas/ de cores sem nascença –// tudo nelas adoeceu de silêncio.” – denuncia Dércio, em “As cores sem nascença”.

Uma voz a serviço de outras vozes, de seres inumanos, paralisados, sem acesso, ou direito?, ao pensar. “Se assim é, pois que a poesia que disparo não podia (como poderia?) não se armar dessas alheias vozes, dessas com quem partilho a contundente desgraça de fazer (ou tentar ao menos) da escrita uma arma grávida de futuro.”

“O braço de meu carrasco é minha fortaleza.” – revela-nos, corajoso, antes de presenciarmos “A matilha de sóis que preparava”, com: “O peso dos ares/ em que me ergo/ verga-me, ao mais/ imo do osso,/ a matilha de sóis/ que preparava.”

 

Dércio Braúna: a metafísica do (des)crente

A mão que nos desvela o poema “Metafísica aos gritos” dispensa comentários: “Solitário,/ o cão espera da noite/ a garganta que lhe alteie/ escuro a dentro.// Soturno,/ um homem se diz/ pela garganta que essa noite prepara/ esmurrando o céu/ escuro a dentro.”

Braúna usa o artifício da intertextualidade, é hábil na inserção de versos de outros poetas em meio aos seus. Numa colcha cingida a capricho, urdida em zelo, de escola. Como em “Ao rés da fala”: “Porque aquilo que escrevo pode ler-se no escuro,/ à luz do bicho/ que urra,/ que grita/ (com as entranhas na garganta)/ dentro da minha cabeça.” Justa homenagem a António Lobo Antunes e ao contista Jorge Pieiro.

Em “Sonoro magma que difícil esplende”, um pouco do método do artífice da palavra de Limoeiro: “Parto para o poema,/ a dentadas,/ com todos os meus caninos,/ molares,/ incisivos –/ gosto de lhe ver a rasgadura,/ o lanho,/ qualquer seiva,/ qualquer coisa/ que escorra,/ que diga ao predador/ que é morta a presa –/ ainda que sabido seja,/ de antemão,/ a ilusão:/ no reino do poema,/ bem se sabe,/ o pobre diabo/ que o é o poeta/ é a presa/ mil vezes vencida.”

O poeta sabe que muitos darão seus “braços a mover/ máquinas e máquinas/ que produzirão,/ mais que coisas,/ signos de coisas/ que nos hão-de fabricar.” E, assim, a poesia (re)surge, túrgida, incauta, teimosa: “como uma pancada, melodia surda e sem trégua dentro da minha cabeça, me chove um verso, infeliz – bailarino insone sem descanso...”.

Braúna desfila sua lírica sem titubeios, asseado pastor de construções inusitadas, entretanto sem afagos a invencionices ocas, apenas atento, e ciente, de que a aflição de hoje requer uma forma nova, mais afeita a esses “pássaros famintos (o mundo que suas asas cansadas não dizem) e essas paredes... – a mais dura: esta, que me cresce dentro.”

 

 

A lição da faca e dos ossos

 

No mais das vezes, Le foge da métrica porque sabe da lição da faca e dos ossos, que exige o verbo ferir em vez do cantar. Acerca “Da memória da casa ruída”: “Se habitei esta casa, hoje me habita sua memória, sua precária memória – forte tanta! –, sua memória-força carregada de vozes latejando contra a escuridão que se lhe vai semetando.// Esta casa hoje sou eu –/ e o que a vida acrescenta:/ um pouco de sonho e não.” Num infausto (?) “Diário de um poeta que jamais viera a ser”. “Nesta casa eu fui deus.” – conclui.

Em seguida, Braúna reconhece, em “Do não-saber que pronuncia”: “Fui sempre esse estrangeiro/ das coisas que me erram.” Para, logo depois, propalar: “Mas sei:/ o homem é nunca essa / pronúncia que lhe chamam. Há/ sempre um outro mais fundo – um/ não saber que é tudo.”

Enquanto a morte se atrasa, “munir-se até os dentes com suas farpas;/ lecerar a couraça em seus gumes,/ espatifar a lira,/ forjar outra matéria (ainda língua) depois de tudo...”. E Dércio Braúna assim procede, carregando os escombros da “própria nascença:/ uma pobre morte particular/ para um dia sem ênfase –// em que talvez um violino/ console um pássaro só.” Esse tipo de surpresa lírica, em meio aos despojos dos dias, traça um arco-íris de encanto, e espanto, na sua fatura poética. Um quê de esperança na terra calcinada, cemitério de cruz? “Carvões enfurecidos/ acendendo/ esse chão (violento) da vida.”

Toda essa poemática – “Pela caridade de suas mãos e dentes” – denuncia, e convence-nos, que o mais certo amor é o que “temos pela rudeza das coisas”, pois o homem é “esse bicho [que] talha sem descanso/ dentro da coisa milagrada”.

E minha carne trêmula (parafraseando Braúna), ao (re)ler Metal sem húmus, mal contém toda a precariedade da minha resenha. No final, resta-me uma certeza (caso me fosse possível uma certeza): “no coração da vida,/ o tecido de seu explosivo músculo é/ isto: gume e brisa, metal e húmus.”

“Este é um livro-legião.” Bem guardai-o.

 

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Andréa Santos

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Edna Menezes