Para além e para aquém da
estética, a obra de arte instaura uma transcendência. Que risco
se corre ao se debruçar sobre ela: ou se cai no fechamento da
interpretação, ou se fica na fascinação pura e simples (chapado,
como cupim na lâmpada), impedido da fala, da simbolização. Mas
você nem tchum. Como Lacan dizia que deve ser feito: tomar o seu
exemplo (prende de la greine), tomar sua semente, fazer germinar
outra coisa, você faz isso magistralmente bem com esse texto:
sua própria
leitura, seu laboratório.
Com que segurança amarra o sentido
com a corda da consistência do imaginário! Enquanto o pintor
pinta a tela, você cunha a sua escrita, e assina embaixo. A
partir da pintura, sabidamente uma fábrica de signos, cria
histórias, versões do fato. Busca a verdade, ainda que da ficção
(e existe outra?). Assume a parte perdida e jamais reencontrada,
até porque não é ela e sim o todo que você dá como jamais
reencontrável, pois sabe, desde sempre, da impossibilidade da
completude.