Dante Gatto
A
visita
Sempre
a mesma visita
à
noite, altas horas,
quando
todos dormem...
Há
muito dormem, é verdade.
O
dia foi duro e o que virá também.
Permaneço,
no entanto, insone com meus pensamentos.
Insisto
como
se nada valesse a pena,
como
quem nada tem além de
pensamentos.
Como
se o vasto dia fosse uma ilusão desprezível.
Ela
chega sempre
quando
pressinto que devo dormir.
Só
eu para atendê-la.
Os
outros todos, meus companheiros, dormem...
ou
simulam que dormem?
Quem
sabe, os covardes!
Há
também os que morreram...
Mataram-se
por medo!
Haveria
afinal outra razão?
Mataram-se
sem explicação,
sem
um bilhete sequer.
Há
os que preferiram o álcool, o ópio...
Só
eu para recebê-la...
Ela
chega e repousa seus olhos,
seus
grande olhos de procura e tédio,
nos
meus olhos cansados
e
não fala nada.
Qualquer
palavra bastaria,
qualquer
palavra seria um lenitivo,
traria,
talvez, reminiscências e nostalgia.
Quem
sabe teríamos muito em comum
além
da muda e estéril solidão.
Por
que, então, bate à minha porta,
altas
horas,
quando
todos dormem,
profundamente
e
assenta-se diante de mim
com
seus grande olhos?
E
se eu não a recebesse?
Ou
se, melhor, acordasse todos para vê-la,
os
idiotas que duvidam da sua existência?
E
diante de todos,
todos
os meus companheiros,
eu
a obrigasse a falar,
a
explicar-se por que me procura?
Quando
ela chegar, hoje,
gritarei!
Gritarei
a plenos pulmões
em
direção ao corredor vazio.
Bem
sei, afinal, que será inútil.
Há
muitos quartos e ninguém me ouviria.
As
portas estão fechadas,
bem
fechadas,
para
que não ouçam o ruído das ruas.
Afinal
o dia foi longo e terrível ...
Tomarei
um forte calmante e
dormirei
a ponto de não ouvi-la.
Que
procure outro lugar,
que
durma na rua
se
é que dorme,
a
descarada, a vagabunda...
Todos
dormem.
Há
muito dormem.
Ouço
passos vindos da rua,
do
barulho louco da rua.
Quando
ela chegar
abrirei
a porta como sempre.
Ficaremos
um diante do outro,
terei
seus grandes olhos de procura e tédio,
terei
meus pensamentos e
não
diremos nada.
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