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Da Vinci, La Scapigliata

 

Ticiano, Flora

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Iosito Aguiar


 

Habitação de Soares Feitosa
 

Pois é, meu coroné, como se diz lá no Alto Sertão baiano de onde venho: “Quano chega o tempo de fuloramento, o mió mermo é pará, ficá oiano as fulô, sentino os cheiros e deixano aquela beleza toda abarcá o coração da gente, o isprito e os pensamento. Num carece ispricá nada não. É só ficá no senti”.

A habitação do poeta fica num sítio de 5ª dimensão, a que só os deuses e uns poucos eleitos têm acesso.

Então o poeta é uma espécie de Deus?

Home, se desde que Linos inventou as letras a poesia vemAlbrecht Dürer, Germany, Study of praying hands resistindo, por alguma razão é, não é? O poeta é um mago tão porreta que até em mulher pode se transformar. Em verdade, a mulher sempre fez parte da natureza do homem. Sempre esteve dentro dele. A maioria dos homens não sabem disso. Os poetas o sabem. Daí dá prá entender o obnubilamento da dona Maria Alice Vila Fabião. Ela viu-se surpreendida por uma faceta quase desconhecida do poeta, que desnuda o grande segredo da mulher, O segredo da geração.

O poeta gerou. E daí?

O cumpade Roseno tem razão quando diz ter sido muito bom, o poeta ter-se voltado para os versos depois dos 50. O intelectualismo – esse estrupício do “Scholar” – felizmente não teve tempo, nem chance de contaminar a cacimba de 5ª dimensão onde bebe o poeta. Assim, no caldeirão daquela cacimba, vêmo-lo misturar elementos variadíssimos, que resultam numa poesia desconcertante para a pessoa comum.

Como definir aquela poesia?

Antônio Massa tocou o cerne da coisa quando falou de Salomão.

É isso. O infinito não existe na nossa realidade porque ao homem (comum) não foi concedido tempo auficiente para contar a eternidade. Mas aos poetas, aos iluminados e aos JIVAS (homem perfeito após a evolução pelas sete rondas de vida), com acesso à 5ª dimensão foram permitido compreensão e domínio do infinito. Então, se se é poeta não é preciso ficar em silêncio ante o calidoscópio de emoções que o poema HABITAÇÃO desperta. Ocorre-me revelar um tete-a-tete que tive com as musas Erato (da poesia lírica) e Calíope (da poesia heróica). Elas me contaram que da união entre Urano e Gáia nasceram os titãs e as titanides, seres divinos e portadores de forças elementais. E que de todos os titãs, o mais importante para o desenvolvimento do mundo foi Cronos, o mais jovem de todos, o senhor do tempo e que engendrou os Olimpianos que, como você deve saber, são os deuses, os poetas e os Jivas. Por desentendimentos que só a divindade explica, Cronos matou seu pai Urano, encarcerou os irmãos todos nas trevas infernais mas deu prosseguimento às obras paternas. Gáia se indispôs com ele e predisse sua morte por um de seus filhos. O maluco, então, passou a comer a própria prole. Réa, sua mulher, e que estava de novo grávida, procurou a sogra e pediu proteção para salvar o filho que estava por nascer. Gáia escondeu-a na ilha de Creta onde teve Zeus, que cresceu sob a proteção da mãe e da avó. Zeus destronou Cronos, obrigando-o a devolver todos os seus irmãos que ele havia devorado.

Como todo Deus, Zeus cometeu atos imprudentes e impulsivos. Era um insaciável. Casou-se muitas vêzes, inclusive, com sua irmã Demeter, que lhe deu uma filha de nome Perséfone e que possui a lenda mais bela e comovente de todo o panteão helênico.

Mas, eu queria mesmo era falar um pouquinho de Diônisos, outro filho de Zeus com Semele e tão querido do véio Gerardo. Ele personifica os potenciais da videira e do vinho. Sua mãe, Semele, foi a grande amada de Zeus e, por isso mesmo, vítima da perseguição e fofocas das irmãs. É... lá entre os deuses também havia disso. Por causa dessa fofocagem, Zeus teve de aparecer em todo seu esplendor para Semele. Ela não agüentou o impacto e morreu, estando grávida de Diônisos. Para salvar a criança que ainda não havia nascido, Zeus a tomou e costurou na própria coxa até que se desenvolvesse e pudesse nascer.

Diônisos nasceu e foi criado escondido, embora sempre perseguido por sua tia Hera, que o enlouqueceu quando adulto. O coitado girou, girou e foi bater com os costados na Frígia onde foi acolhido por Cibele (a mãe dos deuses) que o curou e purificou, para que ele pudesse viver sua glória divina.

Diônisos andava sempre com o “Kantharos” na mão e esse era o seu emblema. Era um mulherengo arretado e até dizem que, é pela ligação com Diônisos que os poetas tanto apreciam um copo, música de corda e sôpro e, sobretudo, um rabo de saia.

O segredo dos dentes que rasgam e esmagam para alimentar-nos, a maciez da penugem dos pássaros, a perfeição da curva do dorso do gato; a capacidade de ver e escutar e, fundamentalmente, de saber. Saber!!! É isso, meu coroné! Ponto, oras...
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Iosito Aguiar


 

AS CARNAUBEIRAS DE CATUANA / EL AUSENTE

 

Tresmudando, queria dizer que tem coisas de que só um cearense é capaz. Pra viver naquela sequidão amando aquela terra acima de todas as outras, só mesmo sendo cearense ou árabe. Nunca poderia imaginar que o poeta cearense, meu querido capitão do mato, Soares Feitosa, tivesse o despautério de colocar-se, literalmente: por cima e por baixo, do grande mexicano Octávio Paz!

Que todo cearense é meio doido, tô cansado de saber. Não sóOctavio Paz, Nobel Soares Feitosa se colocou num poema “repleto de enigmas e tentativas de decifração”, no dizer de minha conterrânea e, provavelmente, parente, Regina Sousa Vieira, que pertence à ilustre casa dos Sousas, descendentes diretos do Barão Henrique Antunes de Sousa Neves – que na Bahia era dono das águas – e dos Vieiras (donos das terras) aos quais pertenço que, além de heróis de Alcacer-Quibir, à pedidos de D.João VI, introduziram o cultivo da cana-de-açúcar na Bahia, adoçando assim o Brasil.

Continuando a falar do capitão Soares Feitosa, no seu Jornal de Poesia, o homem nos apresenta uma ANTÍFONA tonitroante, esbanjando uma absurda riqueza de recursos. Com toda a nonchalance de que só um cearense da molesta é capaz, o capitão apossa-se da Midraxe – ciência dos escribas árabes – que é um modo de contar, escrever ou declamar, acrescentando aos fatos a experiência pessoal e, como se isso não fosse o bastante até porque é um leitor contumaz das escrituras sagradas, nosso estimado capitão usa e abusa do Halacá e do Hagadá, recursos privativos de santos e sábios rabinos para explicar, comentar, enfeitar e ampliar os efeitos de seus versos, ao lado dos versos do venerável Octávio Paz.
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Iosito Aguiar


 

Para um grande amor


Ailina me dá um tema
Quero fazer um poema
Um poema que fale de amor
Dos teus lábios quero um beijo
Da tua voz a doçura
              Pra rimar com amargura
              Que trago dentro de mim
Quero sair pela noite
Sentir do vento o açoite
              Açoitar o rosto meu
              E passear no jardim
E perguntar pro jasmin
Por que o cravo morreu?
              Ailina me dá beleza
Que é pra dar a qualquer
Tereza
Dona dos sonhos meus
Em troca te dou perfume
              Puro do muito imune
Cravo que não morreu
Esquece não do meu tema,
viu!
Que é pra fazer um poema
Um poema que fale de amor
Que seja bem bonitinho
Tendo de tudo um pouquinho
Sempre rimando com flor.


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Iosito Aguiar


 

Noites de Alhambra


Da cama onde estou tudo se vai partindo
Vagarosamente, abandono a mulher ao lado
Vagarosamente, recolho seu último beijo
seu último olhar
seu último orgasmo
Ailina agora é uma presença enorme
a ocupar todo o meu ser
A mulher ao lado me olha despossuída
Minha ausência a deixa atônita, assustada
Rígido e impessoal abandono tudo
Embarco na imaginação esquecido de tudo
O desejo quebrado provoca incisões
O instante é mensageiro do que se opera
naquele leito
O pensamento vai e volta trazendo músicas de
alaúdes
tocadas por Ailina na casa de Peter Gast
instantes antes da loucura Nietszcheana
prevista pela primeira vez numa noite em
Alhambra
Noite vermelha
quando a pitonisa moura
debochou abertamente do seu super-homem
Reconheço-me pensando cenas divertidas
Nietszche enlouquecido de amor
por uma pitonisa que nem alemão sabia
Eu a navegar a noite
entoando "cantes hondos" para uma
mulher-serpente
cujos olhos refletem estrelas, esmeraldas
e um sol doirado
O gênio de Nietzsche se esvaindo
num tesão que ele nunca poderia entender
Na irresponsabilidade dos sonhos
cantei canções falando de um homem
que na ânsia de crescer
enterrou suas raízes tão profundamente
que teve de reinventar o próprio canto
Aquelas canções levaram Nietzsche à dissolução
por não poder suportar dor assim tão límpida.
Nietzsche conhecia a vigilância do espírito
mas nada sabia do êxtase
por isso, deixou-se consumir no próprio fogo
Ailina é o fogo que me consome!
Flutuo na sua lembrança
Seu perfume me atravessa
qual som de uma campânula de cristal
arremetendo-me para o intangível
Sempre que o sofrimento me toca
escapo para a sua lembrança
Num átimo, desencadeia-se o mistério!
Sem ela não sei pensar
Contido, sem transmitir o que me assalta
esqueci-me até dos versos
sou o verso e pronto;
Mas sempre desafiei os registros!
Agora, penso de modo tão simples
que sua ausência me tritura o coração
À sua espera ouço o pulsar da vida
o passar dos mistérios.

 

 

 

 

 

 

 

Alessandro Allori, 1535-1607, Vênus e Cupido

 

 

 

 

 

Iosito Aguiar


 

Encarcerados


Quando nossos avoengos
Eram ainda crianças
Já vivíamos encarcerados
Olhando os acesos lustres
De uma noite sem festa
Quando tu eras princesa da salomônica corte
E eu um humilde plebeu
Pela vez primeira percebi
O milenar instinto a guiar-nos
Por alamedas de repetidos espelhos
Então escrevi aqueles versos
Estruturados em paralelismo quiásmico
E que levaram o doce rei
A receber-me em sua corte
Lembras-te? Tos cantarei para que te recordes
Daqueles dias de esplendor:
"Como és formosa, minha amada!
Teus lábios são fitas de púrpura,
De fala maviosa.
Tuas faces são metades de romãs.)
Teus seios são como duas crias,
Gêmeas de gazela,
Pastando entre lírios."
Em tua imagem reconheço-me.

 

 

 

 

 

 

 

Caravagio, Tentação de São Tomé, detalhe

 

 

 

 

 

Iosito Aguiar


 

S a u d a ç ã o

 

Para Tõe de seu Herculano

 

                        Ave saudade
                     Suave saudade
     Vislumbrada pela memória
Transfigurada pelo coração
Seu sabor
Sua intimidade
São mistérios de meu existir
                    e inserem deleites
                  ao meu jeito de ser
Agora plural
Na evocação
No olhar
No toque
Na doce palavra.
O passado, aquece-me peito e lágrimas
embora os signos mais queridos
                     tenham desaparecidos
Os amigos de infância partidos
e com eles
o encanto de nossa rua
                                  Ainda assim
a criança em mim insiste em vê-los
Ah, como seria bom ao dobrar a esquina
Deparar com Maria e Luíza
                    Dandá e Taviano Fiscal!
Sá Isaura debruçada à janela
                                   a prescrutar
Queria tanto ser um artista
desses que pintam quadros!
                                  para retratar
As imagens pressentidas
nas alamedas dos sonhos
Esse poema reconduz-me
                          por aquelas vielas
                            onde tento tecer
O sentido de minha existência
No emaranhado desse texto
A lembrança dos antigamente
Transportam-me ao imponderável
                         Finjo naturalidade
                        para não libertar
              as reprimidas emoções
Flutuantes
         acima da razão e da lógica
A ilusão da segurança ainda me prende
Surpreendentemente lúcido
Congelo o momento nestes versos
                    e jogo fora meus medos
Serei eu mesmo
É melhor assim.

 

 

 

 

 

 

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SB 08.12.2022