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Orlando Tejo

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Poesia:

Do Livro Zé Limeira Poeta do Absurdo (em PDF):

 

Outras:

 

 


Fortuna: 


Alguma notícia do autor:

ORLANDO TEJO, (Campina Grande, PB, 1935), é jornalista, ensaísta , boêmio e poeta. Colaborou em inúmeros jornais, destacando-se: Dário da Borborema, Campina Grande, Jornal do Commércio, Recife, Diário de Pernambuco, Recife, Correio Braziliense, Brasília, entre outros. Escreveu vários livros,  dentre os quais: Zé Limeira – Poeta do Absurdo, (ensaio), A hora e a vez do jumento, (teatro), As noites do Alvorada (poesia) e, ainda inédito, Se não foi eu cegue, (memórias). Tem textos, crônicas, poemas, crítica literária, dispersos em vários jornais e revistas no Brasil e no exterior. Alguns poemas seus foram musicados por grandes interpretes da música popular brasileira. Sobre seu livro Zé Limeira – Poeta do Absurdo, afirmou José Américo de Almeida, “o poeta Orlando Tejo expõe uma matéria nova para ser analisada pela crítica moderna”. Orlando Tejo reside atualmente em João Pessoa. (2009)

 


Cláudio Aguiar, Soares Feitosa, o poeta Orlando Tejo e esposa, Josimara, a quem ele chama "Minha Prinspa". Foto de Majela Colares, talvez 1998, no Recife.

 

Zé Limeira - Poeta do Absurdo

2009.05.28

Orlando Tejo

Zé Limeira – Poeta do Absurdo, do poeta e jornalista Orlando Tejo, chega às livrarias brasileiras em sua 11ª edição numa extraordinária roupagem da Editora Calibán – Rio de Janeiro. É livro para se ler, reler e memorizar. Além dos surrealísticos improvisos do poeta do absurdo, vale salientar a imaginosa força da prosa de Orlando Tejo. É realmente leitura imperdível. (2009)

ISBN: 978-85-87025-32-6
Gênero: Ensaios
R$ 40,00;
11ª Edição
264 páginas

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Mary Wollstonecraft, by John Opie, 1797

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Da Vinci, La Scapigliata, detail

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Jean Léon Gérôme (French, 1824-1904)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

John William Godward (British, 1861-1922), Belleza Pompeiana, detail

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  

 

 

 

Orlando Tejo

 

NÃO AGUENTO MAIS

Eu saí da Paraíba,
Minha terra tão brejeira,
Pra fazer publicidade
Na Veneza Brasileira
Onde a comunicação
É toda em língua estrangeira.

É uma ingrizia só
O jeito de se falar,
O que a gente não compreende,
Passa o tempo a perguntar
E assim como é que eu vou
Poder me comunicar?

É bastante abrir-se a boca
O “inglês” fala no centro,
Nessa Torre de Babel
Eu morro e não me concentro…
Até parece que estamos
De Nova Iorque pra dentro!

Lá naquele fim de mundo
Esse negócio tem vez
Porque quem vive por lá
O jeito é falar inglês,
Mas, se estamos no Brasil
O jeito é falar Português!

Por que complicar a guerra
Em vez de se esclarecer?
E se “folder” é um folheto
Por que assim não dizer?…
Pois quem me pedir um “folder”
Eu vou mandar se folder.

Roteiro é “story board”
Nesse vai e vem estrangeiro,
Parece até palavrão
Que se evita o tempo inteiro...
Porque seus filhos das putas,
A gente não diz roteiro?

Estão todos precisando
Dos cuidados do Pinel
Será feia a nossa língua?
É chato nosso papel?
Por que esse tal de “out door”
Substituir painel?

É desrespeito à memória
De Camões que foi purista
E esse massacre ao vernáculo
Não aguenta o repentista
Pois chamam “lay out-man”
O homem que é desenhista!

Matuto da Paraíba,
Aqui juro que não fico,
Onde até se tem vergonha
De um idioma tão rico...
Por que se chamar de “free-lancer”
Um sujeito que faz bico?

Publicidade de rádio
Apelidaram de “spot”
E tem outras besteiradas
Que não cabem num pacote.
Acho que acabou o tempo
De acabar esse fricote!

Por exemplo: “body type”
“Midia”, ”top”, “merchandising”,
“Checking list”, “past up”
(Que se diga de passagem)
“Briffing”, “Top de Marketing”,
Tudo isso é viadagem!

Já é hora de parar
com esse festival grosso
Para que o nosso idioma
Saia do fundo do poço.
Para isso eu faço esse “raff”,
Isto é –perdão ! – esboço!

 

 

 

LIVRO 7, a mais famosa livraria que o Recife já teve. Fechou. Majela Colares lê. Da esquerda para a direita, a esposa do Tejo, Josimara, o Tejo e Soares Feitosa. 1996

          

 

   

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Riviere Briton, 1840-1920, UK, Una e o leão

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

The Gates of Dawn, Herbert Draper, UK, 1863-1920

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  

 

 

 

Társio Pinheiro

e

Majela Colares

 

ROMANCE LIMEIRIANO DA RIBEIRA DO RIO DAS ONÇAS

 

 

 

Homenagem a Orlando Tejo por ocasião do lançamento de Zé Limeira – Poeta do Absurdo, em 3 de janeiro de 1998, em Limoeiro do Norte, Ceará.

 

Quando a última onça suçuarana

esturrou por aqui no sec’lo três

cada índio virou um japonês

que fundou um Japão na Ingarana

e viviam de arroz, de fumo e cana,

e a comer macarrão e macaxeira;

a quentura era tanta que a fogueira

se acendia com o cheiro do mormaço.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira.

 

Quando a Itália perdeu pra nós a copa

nós ganhamos metade de Veneza

foi assim que viramos a princesa

deste vale sem armas e sem tropa.

Assim sendo, nos veio da Europa

João Bracim, gondoleiro de primeira,

e o segredo do pão pelos Nogueira

e a buchada de Adélia (igual não acho).

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira.

 

O papoco estourou no mei’ do mundo

e Corisco, Dadá e Lampião

se arrancharam no Cor’go do Feijão

numa tarde de abril em São Raimundo.

Foi o tiro mais raso e mais profundo,

bacamarte, garroncha ou socadeira;

só Zé Maia é que tem a verdadeira

arma velha que alçou tal estilhaço.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira.

 

Leonardo da Vinci e Isaac Newton

deram cursos de invento e de pintura

pelas eras do quinze, de fartura,

bem em frente à cantina de Seu Nilton;

ensinaram Zé Mende’ a fazer filtro,

Mestre Sombra a esculpir pedra e madeira,

Seu Chiquim a mexer com geladeira,

Valdivino a soldar papel e aço.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira.

 

No trigésimo quinto carnaval

Thomas Edson ficou no Hotel Maia,

jogou pife, caipira e pegou braia

e aprendeu tudo em rádio com Vidal.

De relógio estudou com Parsifal,

na Coluna da Hora fez zoeira,

desposou no mercado a cafezeira

que servia café para o cangaço.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira.

 

De Roma saiu Cícero a viajar

sem destino, calado, liso e só,

aportou no camin’ de Mossoró

sob as asas de um misto a navegar.

Veio aqui uma escola inaugurar,

expandiu o latim nesta ribeira,

ensinou oratória a Pitombeira

que até hoje inda segue o mesmo traço.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira.

 

Eram quatro da tarde, ou eram cinco,

de um começo de junho ou de setembro,

do algarismo do dia eu nem me lembro,

sei que em Dallas morria o velho Lincoln.

E dizia Zé Jairo: “Agora o zinco

do foguete de flandre’ e de madeira

se levanta veloz e faz poeira

de Pedro Fogueteiro para o espaço.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira.

 

Vinham Madre Teresa e Chico Tufa,

que seu táxi era bom e tinha áudio,

mas pifou no Triang’lo de João Cláudio,

tão cansado que o carro disse “Ufa...”.

Ladainha, que o tempo não malufa,

esperava sentada pela freira,

que aqui vinha comprar feijão na feira

pra levar para a Índia, que era escasso.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira.

 

Quando Homero escrevia a Odisséia,

numa viagem que fez para o Sapé,

se travou no repente com José,

o Amâncio, inventor da epopéia.

Apanhou que saiu com diarréia

e daí resultou sua cegueira,

concluiu sua estrofe derradeira

com Amâncio puxando pelo braço.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira. 

 

Foi no tempo em que não havia mapas,

e se houvesse a cidade era maldita.

Seu Afonso ensinava a Carne Frita

e a Rui do Chapéu, enfim aos papas

da sinuca o mistério das caçapas

e o silêncio infinito das taqueiras;

no bilhar encantava a jogadeira

e matava Fantoche no cansaço.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira. 

 

Quando aqui se escondeu, temendo a raia

do fuzil que enfrentou em Mossoró,

Lampião quis comer um mocotó,

uma torta e um caldo em Tito Maia.

Tinha lá na gaiola uma jandaia

que ele achara há três séculos na beira

do Riacho do Sangue, e a atiradeira

Lampião quis sacar, mas não foi macho.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira.

 

Num mergulho que deu no oceano,

não se sabe em qual deles se passou,

deu de cara Jean Jacques Cousteau

com a cara sem masc’ra de Zé Mano.

Abismado, pensou que fosse engano

ou um sonho provindo da canseira.

Quando viu a imagem na viseira

jogou fora sua régua e seu compasso.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira. 

 

Quando foi construir a torre Eiffel,

Bonaparte, que tinha muito verme,

contratou o arquiteto Zé Guilherme,

projetista da torre de Babel.

Rabiscou num pedaço de papel,

deu-lhe forma e feição de baladeira,

viu Paris lá de cima, beira a beira,

passeou pelo Louvre, passo a passo.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira. 

 

Quando Santos Dumont cruzou o céu

e Antõe Preto inventou o cabeçote,

Cacheado ensinava a Pavarotti,

que era primo de Preto Maciel,

e aprendeu o Bolero de Ravel

com Sofia Cambão, velha rameira

lá em Chico Dedé, carnaubeira,

carnaubal, Carnaubinha, carnaubaço.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira.

 

Todo couro que rola num gramado,

vou dizer e confesso que não minto,

foi um dia refeito por Felinto,

ponto a ponto por ele desenhado.

Veio a Adidas saber do seu traçado,

pra fazer propaganda de chuteira,

mas estava Felinto na banheira

sem apito, sem bola, sem cadarço.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira.

 

Executivos de São Paulo ou Rio,

Nova Iorque, Paris e Amsterdã,

nesses ternos de Yves Saint Laurent

Givanchy, Hugo Boss ou Clodovil,

nem de longe imitais o que se viu

nos recortes de Lírio – a verdadeira

modelagem da grife brasileira, 

Nelso’ Forte ou João Sales no compasso.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira.  

 

Certa vez foi até Jerusalém

nosso bom centenário Seu Cazuza,

que ali foi visitar o véi Matusa,

mais conhecido por Matusalém.

E lhe disse: “Você tem mais de cem,

mas inveja não faz, isso é besteira:

vivi mais, porque eu cresci à beira

de um Jordão ora seco, ora escasso...”

Eu querendo cantar eu também faço

de repente igualzinho a Zé limeira. 

 

Uma pesquisa atual na internet

pra saber o maior no futebol,

publicada nas páginas da uol,

para o mundo causou grande manchete.

Em São Paulo, Paris e Budapeste,

só deu Zé Limoeiro de primeira,

desbancando no bico da chuteira

Maradona e Pelé, em um só passo.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira. 

 

Foi no tempo do Império Bizantino,

sob a luz do farol de Alexandria:

seus compêndios Heródoto escrevia

com a ajuda do Velho Pergentino.

Sem as aulas do mestre nordestino,

não seria a História verdadeira:

se calaria a humanidade inteira...

não havia Canudos nem cangaço.

Eu querendo cantar eu também faço

de repente igualzinho a Zé limeira. 

 

Veio o Circo Garcia à nossa casa

com o elenco debaixo de uma tolda

procurando Dedé de Tia Polda

só pra ver se ele “centralisarava”.

Mal chegaram já viram Mestre Crasa

discursando empolgado em plena feira,

Zé de Nega plantando bananeira

e Dengoso, o maior - velho palhaço.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira. 

 

Navegantes de mundos – do universo,

visitantes das margens deste rio,

nos deixaram legados, desafios

contados até hoje em prosa e verso.

É o lado contrário do reverso

que ensinou a Zé Barro a brincadeira

de fazer cataventos de madeira...

Dona Rola a curar todo embaraço.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira. 

 

Numa feira que houve em Jericó,

nos tempos do cigano Josué,

tinha grude, buchada, busca-pé

e bonecos de barro e água em pó.

Vitalino bradava: “Sou maior

do que todos os mestres desta feira.

Rodan... Michelangelo faz besteira...

Zé Pequeno... pra esse eu baixo o facho.”

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira. 

 

Num xaveco a vapor, uma geringonça,

Giotto, Rafael e Aleijadinho

vieram a Limoeiro e no caminho

viram de tudo: guaxinim e onça.

O seu mestre maior, Márcio Mendonça,

esperava os alunos, na Faceira,

que aqui vinham aprender, sem brincadeira,

a pintar e a esculpir anjos no espaço.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira. 

 

Numa tarde de sol e esquecimentos

de um janeiro inda em flor, pomposo e régio,

Majela trouxe a nós Orlando Tejo,

Dom Quixote a lutar com os cataventos.

No cachimbo ardiam pensamentos

e nos olhos a pedra mais certeira,

cada ruga era um cor’go, uma ribeira

onde um rio sangrava um mês de março.

Eu querendo cantar, eu também faço

de repente igualzinho a Zé Limeira. 

 

 

   

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

03/09/2009