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Cláudio Portella 

Poussin, Rinaldo e Armida

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Poesia:


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Contos:


Alguma notícia do autor:

 

Cláudio Portella; à direita o poeta Genuino Sales
Cláudio Portella; à direita o poeta Genuino Sales

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Rubens_Peter_Paul_Head_and_right_hand_of_a_woman

 

William Blake (British, 1757-1827), Angels Rolling Away the Stone from the Sepulchre

 

 

 

 

 

 

 

 

Allan R. Banks (USA) - Hanna

 

 

 

 

 

 

Cláudio Portella

 

6.11.2010


 

Fernando Moreira Salles reúne poemas que conduzem o leitor por viagens mar adentro

A chave do mar, de Fernando Moreira Salles. Editora Companhia das Letras, 80 páginas. R$ 35

           O primeiro poema do livro, “Madrugada”, abre dizendo que o viajante parte no pouco mar do amanhecer. O poeta sinaliza que a chave do seu mar é uma brisa leve que bate aos olhos, um vento aracati que cobre a face do leitor. “A chave do mar”, de Fernando Moreira Salles, é uma viagem marítima. Adentra as águas numa jangada e os poemas são o navegar mar à dentro. Fugindo do tempo e de si (quem quer que seja o eu), como diz no poema “Anotações de viagem”: “Só me sei/onde não sou”.

                Muito já se discutiu acerca do minimalismo na poesia. É bom lembrar que ainda no século XIX, Edgar Allan Poe, que também foi poeta, embora tenha ficado famoso por seus contos de terror, dizia que (a despeito do seu longo poema “O Corvo”), necessariamente um poema deve ser breve. O livro de Fernando Moreira Salles suscita essa discussão por ser minimalista em vários aspectos. É tão econômico que até os desenhos de Paulo Monteiro que ilustram os poemas são apenas traços que evocam o mar. Simbiose perfeita.  

O poema “Espelho” (“cada/ verso /retrato /reverso”) que estampa a contracapa é um dos mais fracos do conjunto da obra. Uma escolha inadequada, já que o espaço é um chamariz. Melhor seria a opção por “Abismo” (“Esse nada/ iníquo/ todo meu”); “Assombro” (“No correr / deste dia / trago / o medo / de um fim / que seja / começo”); ou “Contra Rousseau” (“Às vezes / esqueço / dói mais / se não lembro”). Estes, os melhores.

                Tenho a impressão de que na primeira década do século XXI, assim como na década de 1980, a literatura acumulou muitas discussões sobre ela mesma e sobre “invenções” da linguagem. Talvez a economia de palavras que mostra “A chave do mar” aponte, numa outra leitura, mais para esse caminho de discussão do que de fato para o minimalismo poético, simplesmente.

Quem sabe. O importante é que o poeta é despretensioso e que sua obra realmente traz o aroma do mar. E é aí que cativa o leitor de poesia: pela despretensão, pela honestidade da chave.

CLÁUDIO PORTELLA é escritor, poeta, autor de “As vísceras” e de “Cego Aderaldo”, entre outros livros.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Jean Léon Gérôme (French, 1824-1904), Consummatum est Jerusalem

 

 

 

 

Cláudio Portella


 

Biografia:

 

Uma notícia biográfica, por ele mesmo [agosto/2000]: Cláudio Portella, 27 anos. Escritor e Poeta. Legítimo representante da vanguarda contemporâneo na poesia brasileira. Nunca pertenceu a grupos. Acredita que a poesia atual, pois para ele nada é novíssimo, possui como característica o individualismo. Não o individualismo transparente, do qual refere-se Allen Ginsberg, quando interrogado acerca do que seria nudez na poesia, e esse imediatamente tirou a roupa.

O intimismo de Cláudio Portella, não é coeso, não é translúcido, não é emblemático, não é panfletário. Mas falho, caótico e doentio. Sua poesia busca cobrir a falsa moral, desdizer o lengalenga dos intelectuais, dos doutos que apontam os falos alheios comparando-os aos seus.

A poesia de Cláudio Portella é uma velhinha de 4000 anos, que sobe ao palco para declamar seus versos, de botas, gibão e guarda-chuva.

Entre suas publicações significativas, figura a de Choque-de-chuveiro-elétrico (poema onde trabalha o verbo algo) no Suplemento Literário de Minas, Gerais um dos mais respeitado do país.
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Entardecer, foto de Marcus Prado

 

 

 

 

 

Cláudio Portella


 

Colóquio flácido para acalentar bovinos


Agora entendo porquê Arthur Rimbaud parou de escrever aos [dezenove
Não porquê tivesse escrito tudo que tinha para escrever
Mas porquê não podia
Era impossível escrever mais
Poesia e Morte têm os mesmos carrascos
Eu também não consigo mais escrever poemas
Minha pena foi trocada por um microcomputador
Transformei-me num reprodutor premiado
um Aberdeen Angus cuja única possibilidade de existência é procriar
Encher a cozinha de meninas
O país de cidadões
As ruas de trombadinhas
Portanto, meu caro bovídeo
Para que impacientar-se com a ausência do suicídio
Renegue-o
Ele nunca, nunca mesmo, tem razão
Aliás, a razão é a primeira a abandonar o navio
Seja um homicida em potencial
Doe-se no Bridge segundas, terças e quartas
Engaje-se no Xadrez quintas, sextas e sábados
Destabilize-se na Sinuca aos domingos
No final do mês
durma em paz
ao ninar da mãe Portuguesa:
“Poesia, Poesia, Poesia da cara preta
pega esse zebu
que tem medo de ficar nu”
 

 

 

Bernini, Apollo and Dafne, detail

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Maria da Conceição Paranhos

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Goya, Maja Desnuda

 

 

 

 

Cláudio Portella


 

Fotonovela

 

convidado especial Cassiano Ricardo
(in memoriam)


 

foto 1

está declarada a terceira grande guerra mundial humana
e os inimigos são as extensões das pernas
quantas pessoas morrem diariamente em acidentes automobilísticos?
acidentes?
acidente foi (eu) ter nascido no ocidente!


foto 2

nada sei sobre meu planeta
nada sei acerca dos conflitos orientais
só leio jornais
nada sei acerca dos conflitos orientais
como posso querer ser humano
se só leio jornais sem datas
se não posso me embriagar em Bagdá
se tudo que conheço sobre o Iraque
é o filme que vi na Globo
“ O Ladrão de Bagdá”
a Globo e a Folha de São Paulo são o planeta Terra?


foto 3

Jeremias tem 7 razões pra não chorar
eu (te) daria 70x7 pra abrir o berreiro


foto 4

o sensato seria descrever imagens
aonde todos os rios desembocassem no mar
mas como trilhar os mesmos caminhos
se as imagens me chegam em feedback
denotando o elo do que fujo e do que quero
como me vestir com as cores da bandeira
se tenho pernas e posso ir
e se posso ir devo
e se devo preciso
além mar


foto 5

há em mim uma porta
uma passagem estreita
nos dias de luz fica aberta pro nascente
nos de chuva
fecha como uma ostra guarda uma pérola-negra
mas tudo que quero é uma paisagem sem janela
é poder ser ele ou ela
sem o pão que o Diabo amassou
sem Deus de esmola
pois para mim o que falta sobra
e enquanto eu vou trancando
as portas e janelas da casa
lá fora o ponteiro do tempo roda


foto 6

no meu tempo não hão mensageiros
os carteiros são os portadores do destino
eu digo destino sem o complemento do predicado
concordar com o predicado
porque só a um destino:
a cruz que foi carregada por Jesus


foto 7

quanto tempo há em uma hora?
se tudo que vejo agora
é minha mão direita cheia de saudade
quanto tempo tem essa demora?
por que ninguém aparece e me diz vá embora?
por que toda forma tem que ter forma?
quem ditou essa norma?
quem pôs palavras em minha boca?
o que, por Deus!, fez a louca pra ser louca?
drogas são drogas!
mens are mens!


foto 8

encontrei um livro de Allen Ginsberg na mesa da sala
entrei e saí sem dizer nada
palavra
palavra por palavra
a mala pronta
a alça perdida d´baixo do livro na mesa da sala


foto 9

você lembra aquela noite naquele motel cosmopolita barato
em que eu mixei no seu olho direito
aquele que piscava cada vez que você mentia?


foto 10

agora saindo de todas as casas
e todas as lógicas
vejo que só me resta a puta-que-pariu
o pivô do meu dente caiu
a literatura regional entrou e saiu
e eu fora buscar mel onde não havia flores
colher flores onde não havia jardins
procurar amor onde a rima é dor.
 

 

 

A menina afegã, de Steve McCurry

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Alberto da Costa e Silva

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Poussin, The Judgment of Solomon

 

 

 

 

Cláudio Portella


 

Cabaço

 

a Hilda Hilst



Quando digo olhar
nunca, jamais
penso em
o-l-h-o
Olho para o meu
transformou-se em vidro
cartão telefônico com uma fina camada de plástico


Quando digo mulher
todo o meu saber fazer
fora preparar um peixe e exagerar no sal
Mulher para os devaneios
é um intervalo entre um poema feminino de Vinicius
e um dia de ressaca


Quando digo vou embora
jamais, nunca
pretendi dizer adeus
Adeus para mim é uma oferenda ao criador
é estilhaçar com um tiro na boca
a pedrinha de cânfora debaixo da língua
 

 

 

Franz Xaver Winterhalter. Portrait of Mme. Rimsky-Korsakova. 1864.

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Claudio Willer

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Poussin, Venus Presenting  Arms to Aeneas

 

 

 

 

 

Cláudio Portella


 

Livro Ata: Ocorrência de oito de março


quando senti o banho de cerveja na pele
o descontrole de uma mulher a atirar
a cerveja do copo em meu corpo
vi retroceder o filme
há quatro anos dei, vejam bem, por duas vezes
um banho de cerveja gelada na mulher amada
hoje, como se o destino estivesse previsto por Nostradamus,
oito de março, dia internacional da mulher
uma mulher descontrolada, como eu há quatro anos
encarna a mulher amada de outrora
e em nome, não só dela, mas de todas as outras
que um dia foram agredidas com um copo
de cerveja na cara
banha meu corpo e lava minha alma
 

 

 

Herodias by Paul Delaroche (French, 1797 - 1856)

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Clotilde Tavares