Juscelino Vieira Mendes
Em Busca do Tempo
Perdido
"Mas quando mais nada subsistisse de um passado remoto, após a
morte das criaturas e a destruição das coisas - sozinhos, mais
frágeis porém mais vivos, mais imateriais mais persistentes, mais
fiéis - o odor e o sabor permanecem ainda por muito tempo, como
almas, lembrando, aguardando, esperando, sobre as ruínas de tudo o
mais,e suportando sem ceder, em sua gotícula impalpável, o edifício
imenso da recordação."
Marcel Proust, in No Caminho de Swann
Busco em reentrância,
minha vida em Conquista,
a infância
à semelhança do personagem
de Proust, que, aturdido,
busca a imagem
do tempo perdido
ao comer um pedaço de madalena.
Tem o seu passado presente,
ao tomar uma xícara de chá de tília na
casa de sua mãe: comovente!
Nessa visão em túnel, ouço um som.
Mesmo efeito embriagante do chá de tília.
É Garfunkel: Mr. Robinson;
Cecília!
E a suave música que passa,
de chofre, faz-me reviver o Beco dos Artistas; o Jurema
e o velho pé de Cajá, que virou praça.
Madalena!
Caleidoscópio de minha viagem que doura,
em busca do que sempre fui ali,
prossigo para o Beco da Tesoura
e ingresso no ‘Bar Aracy’:
"Que foi feito de meu arroz doce com canela?"...
Alegre e satisfeito, saio para o Colégio Anísio Teixeira
na doce irresponsabilidade do ser - e pensando nela -,
sem nenhum tostão na algibeira.
Redivivo, assim, meu cérebro emocional em
amálgama perfeito - hipocampo e amígdala - em doce recordação
redolente
de uma vida distante que vem
trazer-me de volta: Clemente!
Campinas, águas de março de 1997.
Notas:
1.Conquista: município baiano de Vitória da Conquista, lugar
de nascimento do autor deste poema.
2. "Em Busca do Tempo Perdido": (parte inicial: "No Caminho
de Swann") - obra máxima de Marcel Proust, tradução de Mário
Quintana - Editor Victor Civita.
3.Logradouros públicos e estabelecimentos citados: permanecem
com seus nomes inalterados.
4.As expressões: "cérebro emocional" e as palavras: "amígdala"
e "hipocampo" são usadas no mesmo sentido na obra "Inteligência
Emocional" de Daniel Goleman, tradução de Marcos Santarrita -
Editora Objetiva Ltda.
5.Clemente: pai do autor deste poema, falecido em acidente de
automóvel aos 37 anos de idade chegando em Vitória da Conquista.
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