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Hilda Hilst

Titian, Venus with Organist and Cupid

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Poesia:


Ensaio, crítica, resenha & comentário: 


Fortuna crítica: 


Alguma notícia da autora:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

William Bouguereau (French, 1825-1905), Reflexion

 

Da Vinci, Cabeça de mulher, estudo

 

 

 

 

 

 

 

 

Jean Léon Gérôme (French, 1824-1904), Consummatum est Jerusalem

 

 

 

 

 

Hilda Hilst


 

Bio-bibliografia


Um trabalho a cargo do Poesia Diária

PERSONALIDADE: HILDA HILST


"...e tudo é tão redondo e completo na hora da morte, pois aí sim é que estás completamente acabado, inteirinho tu mesmo, nítido nítido, preciso, exato como um magnífico teorema..."

HILDA HILST nasceu em Jaú, São Paulo, em 21 de Abril de 1930. O pai, Apolônio de Almeida Prado Hilst, fazendeiro e poeta, era filho de Eduardo Hilst, imigrante que veio da Alsácia-Lorena ao Brasil, e de Maria do Carmo Ferraz de Almeida Prado. A mãe, Bedecilda Vaz Cardoso, era filha de portugueses.
Depois de terminar o curso clássico na Escola Mackenzie, estudou na Faculdade de Direito do Largo São Francisco. Formada em 1952, a jovem bacharel exerceu durante alguns meses a advocacia, profissão que, segundo confessa, a deixou "apavorada".

Poeta, dramaturga e ficcionista, HILDA HILST escreve há quase cinqüenta anos - publicou seu primeiro livro de poesias aos vinte anos (Presságio) - tendo sido agraciada com os mais importantes prêmios literários do país. Participa, desde 1982, do Programa do Artista Residente, da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP.

Em 1957 e 1961 HILDA HILST fez viagens maiores pela Europa, demorando-se na França, Itália e Grécia.
Muito bonita, despertou grandes paixões, inclusive, do poeta Vinicius de Moraes e foi namorada do ator Dean Martin. Casou-se em 1968 com o escultor Dante Casarini.

Seu arquivo pessoal foi comprado pelo Centro de Documentação Alexandre Eulálio, Instituto de Estudos de linguagem, IEL, UNICAMP, em 1995, estando aberto a pesquisadores do mundo inteiro.

Alguns de seus textos foram traduzidos para o francês, inglês, italiano e alemão. Em março de 1997, seus textos Com os meus olhos de cão e A obscena senhora D foram publicados pela Ed. Gallimard, tradução de Maryvonne Lapouge, que também traduziu Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa.

Desde 1966, HILDA HILST mora na Casa do Sol, uma chácara próxima a Campinas-SP. Ali dedica todo seu tempo à criação literária. Quem visitá-la em sua chácara, vai encontrá-la rodeada por pilhas de livros, mas poucos deles tratam de literatura. Em sua maioria, são leituras teóricas, relacionadas à física, à filosofia e à matemática, com as quais ela procura refletir sobre questões como a imortalidade da alma, "do ponto de vista científico, não apenas metafísico", como ela diz. Por isso, Hilda vive mergulhada na obra do físico Stephane Lupasco, que defende a idéia de que a alma é feita de matéria quântica.

Foi a preocupação com a imortalidade da alma, aliás, que a levou, na década de 70, a realizar uma série de experiências com o intuito de gravar vozes de mortos. O estímulo surgiu a partir de pesquisas semelhantes feitas pelo cientista sueco Friederich Yuergenson, cujos resultados foram estudados pelo Instituto Max Planck, da Alemanha. Sob o olhar incrédulo, mas interessado, de físicos respeitados, como César Lattes, Mário Schenberg e Newton Bernardes, Hilda passou a esparramar gravadores de rolo pela sua chácara, deixando-os ligados. Trocou-os depois por gravadores cassetes acoplados a rádios sintonizados entre duas estações. Foi assim que captou e gravou vozes enigmáticas pronunciando palavras e fragmentos de frases, algumas, segundo ela, com até 12 vocábulos. Não foi levada a sério e suas experiências acabaram postas de lado. "Fosse hoje, com os cientistas buscando novos paradigmas, eu não passaria por louca", ironiza.

Na literatura, Hilda viveu a situação contrária: foi sempre levada a sério. Até demais. Carregou durante toda a sua carreira literária a fama de escritora difícil e de poucos leitores. Resolveu acabar com a pecha seis anos atrás, ao publicar uma trilogia pornográfica, iniciada com "O Caderno Rosa de Lory Lambi", que deixou os críticos de cabelos em pé. Conseguiu o que queria: chamar a atenção sobre o seu trabalho.
Hoje, de volta à literatura "séria", ela se divide entre o novo livro e a idéia de transformar sua chácara num centro de estudos psíquicos, filosóficos e científicos, que promova a integração entre diversas áreas do conhecimento.

Embora preocupada com a morte e a finitude das coisas, Hilda não perde, na vida e na arte, a sua conhecida irreverência. Talvez seja esta a sua principal marca, que um episódio acontecido anos atrás ilustra bem. Durante uma aula na Unicamp, ao lado de Mário Schenberg, Hilda falava para uma platéia de físicos e estudantes. No meio da exposição, notou que um físico presente caçoava de suas idéias, ao mesmo tempo em que insistia em coçar as virilhas. Lá pelas tantas, ele torpedeou: "Quer dizer que a senhora acredita realmente na imortalidade da alma?" E Hilda, rápida: "Eu acredito na imortalidade da minha alma, porque se o senhor continuar apenas rindo e coçando o saco, sequer constituirá uma alma."

OBRA

POESIA

- Presságio - SP: Revista dos Tribunais, 1950.
- Balada de Alzira - SP: Edições Alarico, 1951.
- Balada do festival - RJ: Jornal de Letras, 1955.
- Roteiro do Silêncio - SP: Anhambi, 1959.
- Trovas de Muito Amor Para um Amado Senhor - SP: Anhambi, 1959. SP: Massao Ohno,
1961.
- Ode Fragmentária - SP: Anhambi, 1961.
- Sete cantos do Poeta Para o Anjo - SP: Massao Ohno, 1962.
- Poesia (1959/1967) - SP: Editora Sal, 1967.
- Júbilo, Memória, Noviciado da Paixão - SP: Massao Ohno, 1974.
- Poesia (1959/1979) - SP: Quíron/INL, 1980.
- Da Morte. Odes Mínimas - SP: Massao Ohno, Roswitha Kempf, 1980.
- Da Morte. Odes Mínimas - SP: Nankin/Montréal: Noroît, 1998. (Edição bilíngüe,
francês-português.)
- Cantares de Perda e Predileção - SP: Massao Ohno/Lídia Pires e Albuquerque Editores,
1980.
- Poemas Malditos, Gozosos e Devotos - SP: Massao Ohno/Ismael Guarnelli Editores,
1984.
- Sobre a Tua Grande Face - SP: Massao Ohno, 1986.
- Alcoólicas - SP: Maison de vins, 1990.
- Amavisse - SP: Massao Ohno, 1989.
- Bufólicas - SP: Massao Ohno, 1992.
- Do Desejo - Campinas, Pontes, 1992.
- Cantares do Sem Nome e de Partidas - SP: Massao Ohno, 1995.
- Do Amor - SP: Massao Ohno, 1999.

PROSA

- Fluxo - Floema - SP: Perspectiva, 1970.
- Qadós - SP: Edart, 1973.
- Ficções - SP: Quíron, 1977.
- Tu Não te Moves de Ti - SP: Cultura, 1980.
- A Obscena Senhora D - SP: Massao Ohno, 1982.
- Com Meus Olhos de Cão e Outras Novelas - SP: Brasiliense, 1986.
- O Caderno Rosa de Lory Lambi - SP: Massao Ohno, 1990.
- Contos D'Escárnio/Textos Grotescos - SP: Siciliano, 1990.
- Cartas de Um Sedutor - SP: Paulicéia, 1991.
- Rútilo Nada - Campinas: Pontes, 1993.
- Estar Sendo Ter Sido - SP: Nankin, 1997.
- Cascos e Carícias - crônicas reunidas (1992-1995) - SP: Nankin, 1998.

TEATRO

- A Possessa - 1967.
- O Rato no Muro - 1967.
- O Visitante - 1968.
- Auto da Barca de Camiri - 1968.
- O Novo Sistema - 1968.
- Aves da Noite - 1968.
- O Verdugo - 1969 (Prêmio Anchieta)
- A Morte de Patriarca - 1969.

NOTA: Todas as peças, à execeção de "O Verdugo", são inéditas.

PRÊMIOS

HILDA HILST recebeu sete prêmios literários. Em 1962, o Prêmio PEN Clube de São Paulo, por "Sete Cantos do Poeta para o Anjo" (Massao Ohno Editor, 1962). Em 1969, a peça "O Verdugo" arrebata o prêmio Anchieta, um dos mais importantes do país na época. A Associação Paulista dos Críticos de Arte (Prêmio APCA) considera "Ficções" (Edições Quíron, 1977) o melhor livro do ano. Em 1981, Hilda Hilst recebe o Grande Prêmio da Crítica para o Conjunto da Obra, pela mesma APCA. Em 1984, a Câmara Brasileira do Livro concede o Prêmio Jabuti a "Cantares de Perda e Predileção" (Massao Ohno - M. Lydia Pires e Albuquerque editores, 1983). No ano seguinte, a mesma obra recebe o Prêmio Cassiano Ricardo (Clube de Poesia de São Paulo). Por último, "Rútilo Nada", publicado em 1993, pela editora Pontes, leva o Prêmio Jabuti como melhor conto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Entardecer, foto de Marcus Prado

 

 

 

 

 

Hilda Hilst


 

Araras versáteis


Araras versáteis. Prato de anêmonas.
O efebo passou entre as meninas trêfegas.
O rombudo bastão luzia na mornura das calças e do dia.
Ela abriu as coxas de esmalte, louça e umedecida laca
E vergastou a cona com minúsculo açoite.
O moço ajoelhou-se esfuçando-lhe os meios
E uma língua de agulha, de fogo, de molusco
Empapou-se de mel nos refolhos robustos.
Ela gritava um êxtase de gosmas e de lírios
Quando no instante alguém
Numa manobra ágil de jovem marinheiro
Arrancou do efebo as luzidias calças
Suspendeu-lhe o traseiro e aaaaaiiiii...
E gozaram os três entre os pios dos pássaros
Das araras versáteis e das meninas trêfegas.
 

 

 

 

Bernini_Apollo_and_Daphne_detail

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Elaine Pauvolid

 

 

 

 

 

 

 

 

Poussin, The Judgment of Solomon

 

 

 

 

 

Hilda Hilst


 

Amavisse


Como se te perdesse, assim te quero.
Como se não te visse (favas douradas
Sob um amarelo) assim te apreendo brusco
Inamovível, e te respiro inteiro

Um arco-íris de ar em águas profundas.

Como se tudo o mais me permitisses,
A mim me fotografo nuns portões de ferro
Ocres, altos, e eu mesma diluída e mínima
No dissoluto de toda despedida.

Como se te perdesse nos trens, nas estações
Ou contornando um círculo de águas
Removente ave, assim te somo a mim:
De redes e de anseios inundada.
(II)

* * *
Descansa.
O Homem já se fez
O escuro cego raivoso animal
Que pretendias.
(Via Vazia - VIII)
 

 

 

 

William Blake (British, 1757-1827), The Ancient of Days

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Foed Castro Chammas

 

 

 

 

 

 

 

 

Poussin, Venus Presenting  Arms to Aeneas

 

 

 

 

 

Hilda Hilst


 

Dez chamamentos ao amigo


Se te pareço noturna e imperfeita
Olha-me de novo. Porque esta noite
Olhei-me a mim, como se tu me olhasses.
E era como se a água
Desejasse

Escapar de sua casa que é o rio
E deslizando apenas, nem tocar a margem.

Te olhei. E há tanto tempo
Entendo que sou terra. Há tanto tempo
Espero
Que o teu corpo de água mais fraterno
Se estenda sobre o meu. Pastor e nauta

Olha-me de novo. Com menos altivez.
E mais atento.
(I)



[Poesia: 1959-1979 - São Paulo: Quíron; (Brasília): INL, 1980.]
 

 

 

Soares Feitosa, dez anos

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Luiz Bello

 

 

 

 

 

 

 

 

Jean Léon Gérôme (French, 1824-1904)

 

 

 

 

 

Hilda Hilst


 

Árias Pequenas. Para Bandolim


Antes que o mundo acabe, Túlio,
Deita-te e prova
Esse milagre do gosto
Que se fez na minha boca
Enquanto o mundo grita
Belicoso. E ao meu lado
Te fazes árabe, me faço israelita
E nos cobrimos de beijos
E de flores

Antes que o mundo se acabe
Antes que acabe em nós
Nosso desejo.


(Júbilo Memória Noviciado da Paixão(1974) - Árias Pequenas. Para Bandolim - XI)
(Poesia: 1959-1979 - São Paulo: Quíron; [Brasília]: INL, 1980.)
 

 

 

Michelangelo, Pietá

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J. Romero Antonialli

 

 

 

 

 

 

 

 

Delaroche, Hemiciclo da Escola de Belas Artes

 

 

 

 

 

Hilda Hilst


 


Poemas aos Homens do nosso tempo


Amada vida, minha morte demora.
Dizer que coisa ao homem,
Propor que viagem? Reis, ministros
E todos vós, políticos,
Que palavra além de ouro e treva
Fica em vossos ouvidos?
Além de vossa RAPACIDADE
O que sabeis
Da alma dos homens?
Ouro, conquista, lucro, logro
E os nossos ossos
E o sangue das gentes
E a vida dos homens
Entre os vossos dentes.


***********

Ao teu encontro, Homem do meu tempo,
E à espera de que tu prevaleças
À rosácea de fogo, ao ódio, às guerras,
Te cantarei infinitamente à espera de que um dia te conheças
E convides o poeta e a todos esses amantes da palavra, e os outros,
Alquimistas, a se sentarem contigo à tua mesa.
As coisas serão simples e redondas, justas. Te cantarei
Minha própria rudeza e o difícil de antes,
Aparências, o amor dilacerado dos homens
Meu próprio amor que é o teu
O mistério dos rios, da terra, da semente.
Te cantarei Aquele que me fez poeta e que me prometeu

Compaixão e ternura e paz na Terra
Se ainda encontrasse em ti, o que te deu.



(Júbilo Memória Noviciado da Paixão(1974) - Poemas aos Homens do nosso Tempo - IX)
[in Poesia: 1959-1979/ Hilda hilst. - São Paulo: Quíron; (Brasília): INL, 1980.]
 

 

 

William Bouguereau (French, 1825-1905), Admiration Maternelle

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José Alcides Pinto

 

 

 

 

 

 

 

 

Poussin, Rinaldo e Armida

 

 

 

 

 

Hilda Hilst


 

Prelúdios-intensos para os desmemoriados do amor


I

Toma-me. A tua boca de linho sobre a minha boca
Austera. Toma-me AGORA, ANTES
Antes que a carnadura se desfaça em sangue, antes
Da morte, amor, da minha morte, toma-me
Crava a tua mão, respira meu sopro, deglute
Em cadência minha escura agonia.

Tempo do corpo este tempo, da fome
Do de dentro. Corpo se conhecendo, lento,
Um sol de diamante alimentando o ventre,
O leite da tua carne, a minha
Fugidia.
E sobre nós este tempo futuro urdindo
Urdindo a grande teia. Sobre nós a vida
A vida se derramando. Cíclica. Escorrendo.

Te descobres vivo sob um jogo novo.
Te ordenas. E eu deliquescida: amor, amor,
Antes do muro, antes da terra, devo
Devo gritar a minha palavra, uma encantada
Ilharga
Na cálida textura de um rochedo. Devo gritar
Digo para mim mesma. Mas ao teu lado me estendo
Imensa. De púrpura. De prata. De delicadeza.

II

Tateio. A fronte. O braço. O ombro.
O fundo sortilégio da omoplata.
Matéria-menina a tua fronte e eu
Madurez, ausência nos teus claros
Guardados.

Ai, ai de mim. Enquanto caminhas
Em lúcida altivez, eu já sou o passado.
Esta fronte que é minha, prodigiosa
De núpcias e caminho
É tão diversa da tua fronte descuidada.

Tateio. E a um só tempo vivo
E vou morrendo. Entre terra e água
Meu existir anfíbio. Passeia
Sobre mim, amor, e colhe o que me resta:
Noturno girassol. Rama secreta.
(...)



[Júbilo memória noviciado da paixão (1974)]
[in Poesia: 1959-1979/ Hilda hilst. - São Paulo: Quíron; (Brasília): INL, 1980.]
 

 

 

Leonardo da Vinci, Embrião

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Miguel Sanches Neto, 2002

 

 

09/08/2006